Sintomas de Ansiedade e Depressão em Pacientes no Pré-Operatório Cardíaco

Symptoms of Anxiety and Depression in Preoperative Cardiac Patients

Síntomas de Ansiedad y Depresión en Pacientes en lo Preoperatorio Cardíaco

Lívia Maria de Oliveira Silva1

Laís de Meneses Carvalho Arilo

Lilian Ferreira do Nascimento

Maria Aurelina Machado de Oliveira

Universidade Federal do Piauí (UFPI)

Welyton Paraíba da Silva Sousa

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Resumo

A cirurgia cardíaca possibilitou o fortalecimento do elo entre Psicologia e Cardiologia, visto que há uma importante interação entre aspectos físicos e psicológicos e pacientes cardíacos. A pesquisa objetivou avaliar a ocorrência de sintomas de ansiedade e depressão em pacientes no pré-cirúrgico cardíaco em um hospital universitário. Trata-se de um estudo de campo, quantitativo e transversal, com amostra de 32 pacientes em pré-operatório cardíaco. Aplicaram-se dois instrumentos: um questionário sociodemográfico e clínico e a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HADS). Os dados foram analisados por meio do software R versão 3.5.1 e discutidos com base em estudos da literatura. Percebeu-se uma frequência maior dos sintomas de ansiedade do que os sintomas de depressão, havendo uma associação estatisticamente significativa entre os sintomas ansiosos e o sexo feminino. Mostram-se importantes as pesquisas que buscam avaliar os aspectos psicológicos nesse período, visando fornecer meios de auxílio à equipe médica e multidisciplinar nos cuidados aos pacientes cardíacos.

Palavras-chave: procedimentos cirúrgicos cardíacos, ansiedade, depressão, hospital

Abstract

Heart surgery has made it possible to strengthen the link between Psychology and Cardiology, since there is an important interaction between physical and psychological aspects and heart patients. The research aimed to evaluate the occurrence of anxiety and depression symptoms in patients in pre-surgery heart in a university hospital. It is a field study, quantitative and cross-sectional, with a sample of 32 patients in preoperative cardiac. Two instruments were applied: a sociodemographic and clinical questionnaire and the Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS). The data were analyzed using R version 3.5.1 software and discussed based on literature studies. A higher frequency of anxiety symptoms than depression symptoms was noted, with a statistically significant association between anxiety symptoms and female gender. The researches that seek to evaluate the psychological aspects in this period are shown to be important in order to provide means of assistance to the medical and multidisciplinary team in the care of cardiac patients.

Keywords: cardiac surgical procedures, anxiety, depression, university hospital, HADS

Resumen

La cirugía cardíaca permitió reforzar el vínculo entre Psicología y Cardiología, ya que existe una importante interacción entre los aspectos físicos y psicológicos y los pacientes cardíacos. La investigación objetivó evaluar la ocurrencia de síntomas de ansiedad y depresión en pacientes en el preoperatorio cardíaco en un hospital universitario. Consistió en un estudio de campo, cuantitativo y transversal, con una muestra de 32 pacientes en preoperatorio cardíaco. Se aplicaron dos instrumentos: un cuestionario sociodemográfico y clínico y la Escala Hospitalaria de Ansiedad y Depresión (HADS). Los datos fueron analizados con la versión 3.5.1 del software R y discutidos según estudios de la literatura. Se observó una mayor frecuencia de los síntomas de ansiedad que de los síntomas de depresión, con una asociación estadísticamente significativa entre los síntomas de ansiedad y el sexo femenino. Son importantes las investigaciones que tratan de evaluar los aspectos psicológicos en este período, con el fin de proporcionar medios de asistencia al equipo médico y multidisciplinar en el cuidado de los pacientes cardíacos.

Palabras clave: procedimientos quirúrgicos cardíacos, ansiedad, depresión, hospital universitario, HADS

Introdução

As doenças do coração ou doenças cardíacas são qualquer agravo que dificulte ou impeça a boa circulação sanguínea no organismo. Entre as principais afecções cardíacas, estão o infarto agudo do miocárdio, a arritmia cardíaca, a doença arterial coronária e a insuficiência cardíaca. Esta é caracterizada por impedir o fluxo normal do sangue bombeado através das válvulas cardíacas e subdivide-se em quatro tipos: assintomática, leve, moderada e grave; neste último caso, realiza-se uma intervenção cirúrgica visando à correção da anomalia (Ministério da Saúde, 2018).

De acordo com a Sociedade Brasileira de Cardiologia (2021) vem observando-se o crescimento dos casos de doenças cardiovasculares, uma vez que, nas últimas décadas, as doenças cardiovasculares foram responsáveis por 30% do número de mortes, o equivalente a 17 milhões de indivíduos de pessoas acometidas por essa patologia.

Foi somente há pouco mais de quadro décadas que a cirurgia cardíaca começou a se delinear na forma como a conhecemos atualmente; a partir de então, tem se obtido um progresso vertiginoso. Para Henriques (2016, p. 21), “A cirurgia cardíaca pode ser definida como um processo de restauração das capacidades vitais, compatíveis com a capacidade funcional do coração dos pacientes que já apresentavam previamente doenças cardíacas”. Ela é um meio pelo qual o indivíduo com doença cardíaca busca melhores condições de saúde, um bem-estar em nível físico, mental e social.

A cirurgia cardíaca é a subespecialidade médica que se ocupa do tratamento cirúrgico das doenças que acometem o coração. No Brasil, essa tecnologia permitiu o fortalecimento da atuação e elo entre Psicologia e Cardiologia, visto que há uma importante interação entre os aspectos físicos e psicológicos dos pacientes cardíacos. Isso torna de suma importância a atuação do psicólogo com pacientes cardíacos no pré-cirúrgico (Romano, 2001).

De acordo com os autores Quintana e Kalil (2012), no Brasil, são realizadas aproximadamente 350 cirurgias por mil habitantes ao ano, incluindo implantes de marca-passos e desfibriladores − isso equivale a um terço do que é feito no Reino Unido e na Europa. Quanto à condição psicológica, o paciente cardíaco apresenta frequentemente sintomas de ansiedade, depressão e medo, a forma de enfrentamento da situação de adoecimento fundamenta-se na busca por respostas adaptativas e no manejo das experiências, das emoções e dos comportamentos movidos pelo estresse.

Em relação ao clima emocional que circunda a cirurgia cardíaca, Romano (2001) aponta que a decisão pela operação resulta de numerosas consultas especializadas e visa à restauração de um órgão mitificado. A cirurgia é vista como o último recurso, o enfermo se vê rodeado por um período repleto de incertezas, limitações, ruptura com o meio familiar, social e do trabalho. Esse clima emocional pode conduzir a vivência da ambivalência, da negação, do medo, da angústia e de todos os demais sintomas e manifestações de uma doença crônica. Por outro lado, o enfermo pode ser surpreendido de forma aguda pela doença, o que ­encurta o tempo de vivências das manifestações emocionais citadas e após as quais, por vezes, emerge um “outro” paciente, que se renova do ponto de vista psíquico.

A cirurgia é vivenciada de modo ambivalente, é vista como algo que poderá aliviar os sintomas ou que causará danos irreversíveis. Um dos mais comuns diagnósticos psicológicos feitos no período pré-operatório cardíaco é o de ansiedade. A ansiedade, por sua vez, pode influenciar a forma de o paciente lidar com o procedimento cirúrgico e acarretar efeitos negativos sobre a recuperação pós-operatória (Quintana & Kalil, 2012).

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais − DSM-V, American Psychiatric Association (2014), indica que as principais doenças ou condições médicas listadas em associação aos quadros de ansiedades orgânicas foram: hiper e hipotireoidismo, esclerose múltipla, câncer, doença pulmonar obstrutiva crônica, acidente vascular cerebral, síndrome do ovário policístico, doença coronariana, insuficiência cardíaca congestiva, doenças cardiovasculares e diabetes.

Observa-se que os acometimentos por doenças cardíacas aparecem de forma bem presente e relacionados aos quadros de ansiedade de base orgânica. No contexto hospitalar, reconhecer essa associação e saber manejar situações nas quais o paciente apresenta essa condição médica é de suma importância para seu prognóstico e qualidade de vida.

Segundo Quintana e Kalil (2012), existe uma faixa de ansiedade que deve ser considerada como desejável e que ajudará o paciente para um preparo pré-cirúrgico, no entanto os níveis consideravelmente aumentados ou diminuídos da ansiedade causam barreiras e dificultam a forma como o paciente lida com a situação cirúrgica e com o adoecimento. De acordo com Gonçalves et al. (2016), há vários fatores que contribuem para os elevados níveis de ansiedade em pacientes que esperam por cirurgia no coração, no ambiente hospitalar, sejam eles ameaças concretas ou imaginárias, até a despersonalização, que, por vezes, decorre de práticas desumanizadas pela equipe de saúde.

Alguns exemplos de causadores de estresse nesse período pré-operatório são: a incerteza de sua evolução, separação do ambiente familiar, fantasias quanto ao procedimento e medo da morte. Acerca de tal fato, destaca-se que, desde a década de 1960, há estudos relatando a associação entre ansiedade e depressão e a morbidade após a cirurgia de revascularização; dessa forma, é percebível que essas condições tendem a agravar o prognóstico dos pacientes (Quintana & Kalil, 2012).

Por sua vez, o Transtorno Depressivo Devido a Outra Condição Médica, de acordo com o DSM-V, precisa contemplar critérios diagnósticos, destacando-se entre eles: “. . . um período proeminente e persistente de humor deprimido ou de diminuição acentuada de interesse ou prazer em todas ou quase todas as atividades que predomina no quadro clínico” (American Psychiatric Association, 2014, pp. 180-181). Existem ainda evidências, que podem ser levantadas a partir da história de vida do sujeito, do exame físico ou de achados laboratoriais, de que esse acometimento citado decorre no indivíduo como uma consequência fisiopatológica direta de outro acometimento médico.

Estima-se a prevalência de depressão em pacientes que aguardam cirurgia cardíaca em 27% a 47%; em pacientes submetidos à revascularização coronária, os sintomas depressivos no período pré-cirúrgico têm sido associados à depressão pós-cirúrgica, pois eles apresentam dor e incapacidade em retornar às atividades de vida diária seis meses após a cirurgia (Quintana & Kalil, 2012).

Ficar doente, ser confrontado com a vulnerabilidade do corpo e com a temporalidade da vida é algo para o qual geralmente não se está preparado. Essa é uma questão que chama para ação o profissional psicólogo, que realiza intervenções nas unidades hospitalares, nos centros de saúde e ambulatórios; em sua atuação, ele deve procurar compreender qual a dimensão da doença e as implicações dela na vida do doente e de sua família (Romano, 2001).

Ao considerar as indicações feitas, este estudo partiu do seguinte questionamento: pacientes em pré-cirurgia cardíaca apresentam altos níveis de sintomas de ansiedade e depressão? Quais fatores estariam relacionados aos sintomas? Assim, por meio dessa indagação, estabeleceu-se como objetivo geral avaliar a ocorrência de sintomas de ansiedade e depressão em pacientes à espera de cirurgia cardíaca em um hospital universitário. De forma específica, os objetivos foram caracterizar o perfil sociodemográfico e clínico de pacientes em pré-cirurgia cardíaca; identificar a frequência de sintomas de ansiedade e depressão no pré-cirúrgico para cirurgias cardíacas; relacionar as variáveis sociodemográficas e clínicas aos escores de ansiedade e depressão em pacientes no pré-cirúrgico cardíaco. Desse modo, poucas pesquisas afins realizadas no Brasil foram catalogadas que aferiram os construtos propostos usando a HADS, que focaram sujeitos em pré-operatório cardíaco ou o contexto hospitalar.

Metodologia

Trata-se de uma pesquisa de campo, quantitativa e transversal, com amostra de 32 participantes e período de coleta de três meses. Esta pesquisa teve como participantes uma amostra com pacientes hospitalizados em pré-cirúrgico cardíaco, de ambos os sexos, com média de idade de 56,6 anos (± 18,03) variando de 20 a 82 anos, sendo que metade (50%) da amostra tinha até 59 anos. Em sua maioria, eram pacientes do sexo feminino (n=18; 56,3%), predominaram pessoas de cor parda (n=17; 53,1%) e casadas (n=18; 56,3%), grande parte residia com o(a) companheiro(a) (n=18; 56,3%) e possuía renda familiar de até um salário mínimo (n=19; 59,4%), os demais pacientes tinham renda de mais de 2 salários mínimos (n=13; 40,6%). Os participantes, em sua maioria, eram adeptos a uma religião (n=31; 96,9%), não eram alfabetizados ou apenas haviam cursado até o ensino fundamental (n=27; 84,4%), eram provenientes de outras cidades do interior do Estado do Piauí e de outros estados (n= 24; 75%) e exerciam papel de provedores em sua família (n=22; 68,8%).

A participação se deu mediante consentimento e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE); posteriormente, foi feita a aplicação de dois instrumentos: um questionário elaborado para levantamento de dados sociodemográficos e clínicos e a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (Hospital Anxiety and Depression Scale HADS). Não foram elegíveis para a pesquisa os pacientes internados em pós-cirúrgico cardíaco, os que aguardavam por cirurgia cardíaca, porém faziam tratamento psiquiátrico para ansiedade e/ou depressão, e os pacientes oncológicos.

A pesquisa foi realizada no Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí (HU-UFPI), pelo fato de ser o local de campo de atuação dos pesquisadores pelo programa de residência e por ter entre seus serviços de referência o de cirurgias cardíacas (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, 2018). Os dados foram coletados nos meses de abril a junho de 2019. O número da amostra equivaleu à quantidade de pacientes − que estavam internados nesse período − elegíveis para participar do estudo, ou seja, consistiu em uma amostra por conveniência.

O questionário sociodemográfico e clínico abordou questões em nível social, econômico, espiritual, clínico, histórico familiar e de adoecimento que poderiam apontar possíveis variáveis associadas aos causadores de sintomas ansiosos e depressivos em pacientes, no período de internação que antecede a cirurgia cardíaca. Por sua vez, a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão foi utilizada tendo em vista que já era um instrumento de aplicação e uso em ambientes hospitalares de internação, com facilidade de manuseio e com validade e confiabilidade demonstradas em estudos (Carneiro et al., 2009).

A HADS tem 14 itens, 7 deles avaliam a ansiedade e os outros 7 a depressão; cada item pode ser pontuado de 0 a 3, somando-se o total máximo de 21 pontos por escala. Adotou-se o ponto de corte usado por Zigmond e Snaith: HAD-A sem ansiedade, escore de 0 a 8, e com ansiedade, escore de 9 ou mais; HAD-D sem depressão, escore de 0 a 8, e com depressão, escore de 9 ou mais (Marcolino et al., 2007).

Acerca dos dados psicométricos da HADS, no que tange à confiabilidade para sua aplicação em paciente no pré-operatório cardíaco, ela foi considerada alta tanto para subescala de ansiedade (alfa de Cronbach = 0,815) quanto para a de depressão (alfa de Cronbach = 0,845). A validade do construto apresentou correlações moderadas ou fracas entre os itens dentro da própria subescala e demonstrou que os itens avaliam um conteúdo independente do outro, sem haver sobreposição; e, quanto à validade concorrente, os estudos não informaram tais achados (Gomes & Bezerra, 2018).

No estudo realizado por Castro et al. (2006), foram apresentados os indicadores de validade da HADS em pacientes com dor crônica, apontando alta sensibilidade para ansiedade (91,7%) e depressão (73,3%), além de especificidade de 41,8% para ansiedade e 67,2% para depressão. Esses últimos autores perceberam ainda boa sensibilidade (em torno de 90%) e menor especificidade (50%) do instrumento em três outros estudos da literatura.

Os dados obtidos com a aplicação dos instrumentos da pesquisa foram submetidos ao processo de digitação, utilizando planilhas do aplicativo Microsoft Excel, e posteriormente exportados e analisados no software R versão 3.5.1, de forma que os dados do perfil sociodemográfico, clínico, sintomas de ansiedade e depressão foram caracterizados por meio de frequências absolutas e relativas percentuais, assim como por meio das seguintes estatísticas descritivas: média, desvio-padrão, mínima, máxima e mediana. A verificação do pressuposto de normalidade foi realizada pelo teste de Shapiro-Wilk.

Na análise bivariada, as associações entre as variáveis do perfil psicossocial e clínico com a presença de depressão e de ansiedade foram verificadas por meio do teste Exato de Fisher ou do teste da razão de verossimilhanças. As comparações entre o fator idade e tempo de internação, segundo a presença de ansiedade e de depressão, foram feitas por meio do teste não paramétrico de Mann-Whitney. Para todas as análises, foi adotado o nível de significância de 5% e as hipóteses testadas foram todas bilaterais.

Em seguida, os resultados das frequências absolutas e relativas, bem como das associações e comparações entre as variáveis dos instrumentos usados, foram relacionados aos resultados obtidos por autores que discutem e estudam a temática.

O estudo passou pela autorização da Comissão de Avaliação de Projeto de Pesquisa (CAPP) e pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário do Piauí (CEP/HUPI), com o parecer n. 3.314.885, CAAE 0717 6219 0 0000 8050, seguindo os princípios éticos e legais determinados pelas resoluções 466/2012, 510/2016 e 580/2018, estabelecidas pelo Conselho Nacional de Saúde.

Resultados

Caracterização sociodemográfica e clínica dos pacientes internados no pré-cirúrgico cardíaco

Neste item, são apresentados os dados referentes à caracterização em nível social, escolar, econômico, espiritual e clínico dos pacientes em pré-cirúrgico cardíaco. As características sociodemográficas são apresentadas na Tabela 1 a seguir.

Tabela 1

Relação entre Variáveis Sociodemográficas e Sintomas de Ansiedade ou Depressão em Pacientes no Pré-Operatório Cirúrgico Cardíaco em um Hospital de Ensino, Teresina, PI, 2019

Variável

Depressão

Valor-P

Ansiedade

Valor-P

Sim

Não

Sim

Não

Sexo

 

 

 

 

 

 

Masculino

0

14

0,1131

0

14

0,0041

Feminino

4

14

8

10

Cor

 

 

 

 

Branco(a)

1

7

0,9862

1

6

0,7212

Negro(a)

1

6

2

6

Pardo(a)

3

14

5

12

Tem religião

 

 

 

 

Sim

4

27

11

8

23

11

Não

0

1

0

1

Renda

 

 

 

 

 

 

Até 1 salário mínimo

4

15

0,1281

6

13

0,4201

Acima de 1 salário mínimo

0

13

2

11

Escolaridade

 

 

 

 

 

Analfabeto

1

10

0,2842

3

8

0,7882

Ensino fundamental incompleto

1

11

2

10

Ensino fundamental completo

0

4

1

3

Ensino médio completo

2

3

2

3

Moradia

 

 

 

 

 

 

Capital/Teresina

2

6

0,2541

3

5

0,3791

Interior do Piauí ou outra cidade

2

22

5

19

Com quem reside

 

 

 

 

Esposo/companheiro

1

17

0,2951

3

15

0,2521

Outros familiares (filhos, netos, genros etc.)

3

11

5

9

Papel na família/provedor

 

 

 

 

 

 

Sim

1

21

0,0791

5

17

0,6811

Não

3

7

3

7

Nota. 1 Teste exato de Fisher; 2 Teste da razão de verossimilhanças.

Acerca das características clínicas do paciente em pré-cirúrgico cardíaco, constam o tempo de internação, a informação quanto ao procedimento cirúrgico, a relação com a equipe, o histórico de cirurgias, as expectativas e os hábitos de vida. Observou-se que a média de internação foi de 16 dias (± 12,81), variando de 2 a 64 dias, sendo que 50% dos pacientes ficaram internados até 13 dias. Grande parte dos pacientes já havia passado por algum tipo de procedimento cirúrgico durante a vida (n=23; 71,9%), porém poucos deles já haviam passado por um procedimento cirúrgico do tipo cardíaco (n=6; 26,1%).

Alguns participantes não souberam responder por qual procedimento cirúrgico seriam submetidos (n=12; 37,5%). Entre os nomes populares para a cirurgia cardíaca, observou-se que o mais citado, pelos que sabiam por qual cirurgia passariam, foi o da “válvula de sopro”, cirurgia de implante ou troca de válvula mitral, e “ponte safena”, cirurgia de revascularização do miocárdio. Na Tabela 2, a seguir, são exibidos os resultados referentes às análises das variáveis clínicas citadas, segundo a presença de sintomas de ansiedade e de depressão. Observou-se que não houve associações significativas.

Tabela 2

Relação entre Variáveis Clínicas e Sintomas de Ansiedade ou Depressão em Pacientes no ­Pré-Operatório Cirúrgico Cardíaco em um Hospital de Ensino, Teresina, PI, 2019

Variável

Depressão

P-Valor

Ansiedade

P-Valor

Sim

Não

Sim

Não

Sabe qual a cirurgia

 

 

 

 

 

 

Sim

3

17

11

6

14

0,6761

Não

1

11

2

10

Procedimento cirúrgico anteriormente

 

 

 

 

 

 

Sim

4

19

0,3061

7

16

0,3861

Não

0

9

1

8

Qual tipo de cirurgia anterior

 

 

 

 

 

 

Cardíaca

1

5

11

1

5

0,6211

Outras

3

14

6

11

Quantas vezes

 

 

 

 

 

 

Uma vez

1

4

11

1

4

11

Duas vezes

0

1

0

1

Conhece pessoas que já passaram por esta cirurgia

 

 

 

 

 

 

Sim

1

18

0,1321

5

14

11

Não

3

10

3

10

Recebeu informações suficientes sobre o procedimento

 

 

 

 

 

 

Sim

2

17

11

4

15

0,6841

Não

2

11

4

9

Relação com a equipe médica e profissional

 

 

 

 

 

 

Boa

4

28

8

24

Nota. 1 Teste exato de Fisher.

Os pacientes relataram ter boas expectativas diante do procedimento cirúrgico, a maioria referindo almejar ficar bem e ter sentimentos de esperança (n=27; 84,3%), e, de forma bem expressiva, a totalidade da amostra de pacientes referiu ainda ter uma boa ou ótima relação com a equipe médica e multiprofissional do hospital (n=32; 100%).

É possível perceber que cerca da metade dos pacientes tinha alguma doença crônica (n=17; 53,1%), ninguém estava atualmente fumando, somando-se os ex-tabagistas e aqueles que nunca fumaram (n=32; 100%), a maioria não bebia, somando-se os ex-etilistas sociais e os que nunca beberam (n=29; 90,6%), e cerca da metade da amostra não praticava atividade física (n=17; 53,1%). A seguir, na Tabela 3, há os dados de análises dessas variáveis clínicas com a presença de sintomas de ansiedade e de depressão, cujo valor de p não foi significativo.

Tabela 3

Relação entre Variáveis Clínicas e Sintomas de Ansiedade ou Depressão em Pacientes no ­Pré-Operatório Cirúrgico Cardíaco em um Hospital de Ensino, Teresina, PI, 2019

Variável

Depressão

Valor-P

Ansiedade

Valor-P

Sim

Não

Sim

Não

Expectativas para cirurgia

 

 

 

 

 

 

Ficar bem, possibilidade de retornar sua rotina

3

24

0,5121

6

21

0,5781

Temor/medo/opõe-se

1

4

2

3

Tem alguma doença crônica

 

 

 

 

 

 

Sim

2

15

11

5

12

0,6911

Não

2

13

3

12

Etilista

 

 

 

 

 

 

Sim

0

3

11

0

3

0,5551

Não

4

25

8

21

Prática de atividade física

 

 

 

 

 

 

Sim

2

13

11

2

13

0,2291

Não

2

15

6

11

Nota. 1Teste exato de Fisher

Dados sobre Ansiedade e Depressão no Pré-Cirúrgico Cardíaco, Segundo a HADS

Neste item, são expostos os valores obtidos das frequências dos sintomas de ansiedade e depressão dos pacientes em pré-cirúrgico cardíaco com a aplicação da HADS, além dos resultados das associações possíveis entre os fatores sociodemográficos e clínicos e os sintomas de ansiedade e depressão. Na amostra, não houve exclusão de qualquer um dos 32 participantes entrevistados. A ansiedade obtida por meio da HADS-A apresentou média igual a 6,31 e desvio-padrão de 3,55. A depressão HADS-D apresentou média de 5,5 e desvio-padrão de 2,72. As frequências absolutas e relativas de pacientes com sintomas de ansiedade e sintomas de depressão podem ser observadas na Tabela 4.

Tabela 4

Frequência de Sintomas de Ansiedade e Depressão dos Pacientes no Pré--Operatório Cirúrgico entre o Período de Abril a Junho em um Hospital de Ensino, Teresina, PI, 2019

Variável

Frequência

Absoluta

Relativa (%)

Ansiedade

8

25

Depressão

4

12

Os resultados obtidos com as associações entre as variáveis sociodemográficas e clínicas e a presença de sintomas de ansiedade ou depressão nos pacientes do estudo são apresentados nas Tabelas 1, 2 e 3. Conforme os dados expostos na Tabela 1, observou-se que houve associação entre o sexo feminino e a presença de ansiedade (p-valor = 0,004).

Na Tabela 5, a seguir, apesar do teste utilizado não ter evidenciado uma associação significativa entre tempo de internação e sintomas de ansiedade e depressão, percebe-se que os pacientes que apresentaram sintomas ansiosos e depressivos estavam há mais tempo internados em relação aos que não apresentaram os sintomas.

Tabela 5

Presença de Ansiedade e de Depressão de Acordo com Idade e Tempo de Internação em Pacientes No Pré-Operatório Cardíaco em um Hospital de Ensino, Teresina, PI, 2019

Variável

Ansiedade

Valor-P

Depressão

Valor-P

Sim

Não

Sim

Não

Idade

56,1 ± 18,264

56,8 ± 18,354

0,9483

42,3 ± 23,464

58,6 ± 16,654

0,1803

57,5 ± 30,55

59 ± 18,255

36,5 ± 21,755

61,0 ± 17,55

Tempo de Internação

22,0 ± 20,614

14 ± 8,674

0,6323

22 ± 16,574

15,1 ± 12,324

0,4243

15 ± 20,55

13 ± 11,755

21 ± 255

13 ± 13,755

Nota. 3 Teste de Mann-Whitney; 4 Média ± desvio-padrão; 5 Mediana ± Intervalo interquartílico.

A seguir, na Tabela 6, é possível observar a associação estatisticamente significativa entre a presença de ansiedade e a presença de depressão (valor-p = 0,039). A chance de um paciente com ansiedade ser depressivo é 13,8 vezes maior se comparada com a chance de um paciente não ansioso, conforme dados dispostos na tabela a seguir.

Tabela 6

Presença de Depressão Segundo Presença de Ansiedade em Pacientes no Pré-Operatório Cardíaco em um Hospital de Ensino, Teresina, PI, 2019

Ansiedade

Depressão

Total

Valor-P

OR

IC95%

Sim

Não

Sim

3

5

8

0,0391

13,8

(1,18; 161,71)

Não

1

23

24

Nota. 1Teste exato de Fisher.

Discussão

Apenas as variáveis que apresentaram dados expressivos ou suficientes para observação de alguma associação entre si ou semelhanças com pesquisas já realizadas foram aqui discutidas.

Comparado aos estudos já elaborados sobre a temática, observa-se que a média para a idade dos pacientes submetidos à cirurgia cardíaca desta pesquisa teve valores aproximados aos da literatura, uma vez que a amostra desta pesquisa apresentou uma média de 56,6 anos, assemelhando-se ao estudo de Assis et al. (2014), no qual a idade frequente para indivíduos que passaram por cirurgias cardíacas estava entre 55 e 60 anos.

Em média, a idade apresentada pelos pacientes com sintomas de ansiedade foi de 56,1 anos e mediana de 57,5. Tais dados foram bem próximos aos encontrados no estudo de Rodrigues et al. (2016), que demonstraram que a idade com maiores médias para sintomas de ansiedade estava entre 55 e 64,9 anos. Gonçalves et al. (2016) também observaram que há maior incidência de sintomas de ansiedade e depressão em pessoas com idades próximas a 60 anos.

A partir dos dados obtidos nesta pesquisa, percebeu-se que a maioria dos participantes que apresentaram sintomas de ansiedade foram mulheres, com p-valor= 0,004, disposto na Tabela 1. Esse fato também foi observado por Rodrigues et al. (2016) em sua pesquisa, na qual as mulheres apresentam médias maiores que os homens para sintomas de ansiedade e depressão, sendo essa diferença estatisticamente significante. Os autores explicam que fatores biológicos, como a influência dos hormônios sexuais femininos, e fatores psicossociais, como a sobrecarga de papéis sociais das mulheres, poderiam contribuir para essa diferença observada.

Kinrys e Wigant (2005) corroboram o fato de que mulheres apresentam um risco maior, comparado aos homens, de desenvolverem transtornos de ansiedade ao longo da vida. Além disso, há uma maior gravidade dos sintomas de ansiedade, cronicidade e prejuízo funcional nesse grupo. Da mesma forma, Gonçalves et al. (2016) ratificaram em seu estudo a associação entre o gênero feminino e a ansiedade, apresentando valor significativo de p=0,003. Os referidos autores perceberam também que os sintomas de ansiedade na amostra total de sua pesquisa prevalecem sobre os sintomas de depressão (34,4% para 28,1%, respectivamente).

Acerca da escolaridade, apresentada na Tabela 1, a maioria dos participantes não foi alfabetizada ou tinha cursado até o ensino fundamental, fator este que também foi corroborado pela literatura, apontando que grande parte dos pacientes cirúrgicos cardíacos cursou até o primeiro grau (Assis et al., 2014).

O baixo grau de escolaridade apresentado por boa parte dos pacientes pode ter sido um fator que tenha dificultado a compreensão das informações e linguagem prestadas pela equipe do hospital universitário. Wottrich et al. (2013) trouxeram em sua pesquisa que as fantasias são frequentes nos pacientes quando há a falta de compreensão sobre seu tratamento e quando se tem pouca informação sobre o procedimento cirúrgico, podendo contribuir para o aumento dos sintomas de ansiedade e angústia voltados para a cirurgia cardíaca. A não compreensão das informações prestadas é, dessa forma, um dos fatores causadores da baixa adesão ao tratamento, uma vez que as fantasias e preocupações voltadas para o procedimento acarretam o aumento dos sintomas de ansiedade, que, por sua vez, comprometem a ocorrência do procedimento.

Observou-se que, apesar de a maioria dos pacientes ter uma boa relação com a equipe (Tabela 2), uma parte deles não sabia qual procedimento cirúrgico faria, mesmo tendo sido referido anteriormente que foram prestadas informações sobre o procedimento. Tal fato, por sua vez, não só pode estar relacionado a uma dificuldade de compreensão dos pacientes, como também a uma falha na comunicação assertiva da equipe.

Wottrick et al. (2013) abordam que é fundamental a preparação psicológica para lidar com processo cirúrgico cardíaco e incluem, ainda, a busca por informações sobre o tratamento, e que estas devem ser oferecidas à medida que o paciente demande recebê-las. As informações podem ser, por outro lado, causadoras de ansiedade, quando detalhadas demasiadamente ou quando não solicitadas, desrespeitando as capacidades de elaboração psíquica do paciente, ou seja, seu processo próprio de controlar suas reações e excitações que lhe são apresentadas diante de uma determinada situação.

Haveria quatro fases, segundo Romano (2001), que, após serem percorridas pelo paciente durante o pré-operatório, facilitariam o processo de aprendizagem das informações apresentadas pela equipe. Essas fases são confronto com a realidade, autorreflexão, resolução e ação. Dessa forma, aquele sujeito com abertura para elaboração de seus conteúdos, ou seja, perceber-se e se autoconhecer, teria maior chance de conseguir lidar melhor emocionalmente com o processo cirúrgico do ponto de vista psicológico social.

Em um estudo feito por Kazitani et al. (2018), observa-se que pacientes submetidos pela primeira vez à cirurgia cardíaca apresentaram maiores pontuações para os sintomas de ansiedade e depressão em relação aos pacientes que já haviam passado por cirurgias cardíacas, apesar das diferenças não terem sido estatisticamente significantes. Neste estudo, identificou-se que a maioria dos pacientes não havia passado por qualquer procedimento cirúrgico antes (Tabela 2), e isso pode ser um fator contribuidor para elevar os níveis de ansiedade naqueles pacientes que estariam sendo expostos ao procedimento primariamente, tal como os autores anteriores destacaram.

Os resultados do estudo, no que se refere aos fatores de riscos presentes nos pacientes cardíacos, que dizem respeito aos hábitos de vida e às comorbidades desse público, expostos na Tabela 3, mostraram-se semelhantes aos encontrados por Pereira (2015). Pouco mais da metade da amostra desse autor era tabagista (55,8%), e 20,5%, etilista; a maioria tinha hipertensão arterial, enquanto alguns tinham diabetes mellitus. No presente estudo realizado, é relevante lembrar que os valores apresentados para o tabagismo e etilismo dizem respeito ao consumo no momento presente ao que se deu a pesquisa, sendo a maioria dos participantes ex-fumante e ex-etilista.

Os autores Vargas et al. (2006) apontam que sintomas de ansiedade e depressão em pacientes e seus familiares estão alterados no período pré-operatório cardíaco, e os níveis para tais acometimentos nesse período são mais acentuados do que a média da população geral. Após a realização da cirurgia, os níveis tendem a retornar aos padrões de sua comunidade.

Nesta pesquisa, verificou-se que houve uma baixa frequência de pacientes que apresentaram sintomas de ansiedade e depressão (Tabela 4) quando comparado com estudos já realizados utilizando amostras maiores, como o estudo de Gomes e Bezerra (2017), que trouxe um levantamento da presença de ansiedade em pacientes em pré-cirúrgico cardíaco. No estudo desses autores, prevaleceram, quanto à intensidade dos sintomas, casos de ansiedade considerados moderados, enquanto os sintomas de depressão apareceram predominantemente como leves, com prevalências, respectivamente, de até 41,5% e 28,3%. Ainda, observaram que as comorbidades apresentadas pelos pacientes aumentavam o nível de ansiedade e estavam associadas à dor e ao consumo de analgésico no pós-operatório.

Apesar da divergência nos achados quanto à frequência dos sintomas, objetos deste estudo, os resultados corroboram com a literatura no que diz respeito ao fato de sintomas de ansiedade prevalecerem no pré-operatório cardíaco em relação aos sintomas de depressão. Por sua vez, altos níveis de ansiedade e depressão no pré-cirúrgico estão relacionados da mesma forma a níveis altos desses acometimentos no pós-cirúrgico, em até seis meses após o procedimento para os pacientes avaliados, segundo Wottrich (2011).

Ao buscar conhecer os possíveis fatores que estariam relacionados às alterações de humor em pacientes cardiovasculares, Pereira (2015) retrata que existe um consenso na literatura quanto à causa dos transtornos de humor, apontando para a condição de sua multifatoriedade, em que fatores genéticos, sociais e psicológicos estariam envolvidos em seu surgimento. Os fatores encontrados em pacientes que seriam submetidos à cirurgia cardíaca e que mais impactam de forma negativa na ansiedade foram os fatores extrapessoais, tais como a doença, a cirurgia em si e as possíveis complicações pós-operatórias (Gomes & Bezerra, 2017).

Como pode ser visualizado nas Tabelas 1, 2, 3 e 5, não ocorreram, para essa amostra, resultados estatisticamente significativos entre as variáveis apresentadas no questionário sociodemográfico e clínico e os sintomas de ansiedade e depressão, com exceção apenas da associação do gênero feminino, que prevaleceu no quesito sintomas de ansiedade (Tabela 1). Apesar disso, mostra-se importante a interpretação e discussão dos dados levantados neste estudo e na literatura sobre essa temática.

A boa interação com a equipe médica e multiprofissional relatada pelos pacientes talvez tenha sido um dos fatores que influenciou de modo protetivo para a baixa frequência dos sintomas de ansiedade e depressão de modo geral, uma vez que esses sintomas não prevaleceram expressivamente na amostra. Wottrick (2011) considera, a partir de um estudo feito sobre essa temática, que pacientes, quando satisfeitos com o curso de seu tratamento, têm mais chances de apresentar otimismo nele e maior perspectiva de serem curados.

Outro fator que pode ter contribuído para a baixa frequência de sintomas de ansiedade e depressão nesta pesquisa, em relação à literatura, foram as expectativas positivas apresentadas por grande parte dos pacientes (Tabela 4). Para Wottrich (2011), sentimentos positivos e de esperança também estão presentes nos casos dos que esperam por cirurgias cardíacas, são os que apresentam a crença em um futuro melhor após o procedimento.

Em um estudo realizado por Vargas et al. (2006), constatou-se que, embora sentimentos de apreensão (medos, ansiedade e preocupação) e sentimentos positivos e de esperança sejam comuns no período anterior à cirurgia, no período de internação pré-operatório, os pacientes passam a citar menos os sentimentos de apreensão em relação ao período no qual receberam a notícia sobre a necessidade da cirurgia, ou seja, antes de ser hospitalizado para passar pelo procedimento. Constatou-se que, no período de internação pré-operatório, os pacientes de seu estudo passaram a relatar mais sentimentos positivos e de esperança.

Outro aspecto que pode ter colaborado com os resultados encontrados para os sintomas ansiosos e depressivos na amostra, e que foi observado na quase totalidade dos participantes, trata-se da presença expressiva da religiosidade como estratégia de enfrentamento usada pelos pacientes (Tabela 1). A religiosidade teria uma habilidade de aliviar os sentimentos de ameaça diante da doença através de um sentimento de proteção contra a incerteza da adversidade da condição que os pacientes se encontram (Wottrich, 2011).

Entre os sentimentos positivos e de esperança que se destacam no estudo de Vargas et al. (2006), os pacientes buscam essa força por meio da religiosidade; isso, por sua vez, pode expressar, ao mesmo tempo, a preocupação com a cirurgia, ao buscar um ser supremo para lidar com o problema. Segundo o autor, a melhor forma para lidar com a cirurgia também estava relacionada à busca de adquirir forças por meio dos colegas que já haviam passado pelo procedimento cirúrgico, dado também encontrado nesta pesquisa (Tabela 3).

Segundo Gomes e Bezerra (2017), a cirurgia cardíaca tem sido relacionada a altos índices de ansiedade no pré-operatório e, entre as repercussões fisiológicas, que podem ocorrer devido aos elevados índices desse sintoma no momento da cirurgia, estão o aumento da frequência cardíaca e os picos hipertensivos, fazendo com que muitas operações sejam canceladas. A fim de buscar reconhecer possíveis fatores prejudiciais para ocorrências das cirurgias cardíacas e suas implicações no paciente, este estudo buscou identificar o nível de sintomas ansiosos nos sujeitos da realidade estudada, para alertar as possíveis intervenções.

O reconhecimento da ansiedade e depressão em pacientes no pré-operatório possibilita o planejamento de intervenções necessárias para tratar os sintomas de acordo com as necessidades específicas de cada paciente ou até mesmo intervenções em grupos de educação em saúde (Gomes & Bezerra, 2017).

Apesar dos resultados desta pesquisa terem apontado para um baixo número de pacientes que apresentaram sintomas ansiosos e depressivos, é importante salientar a necessidade de avaliação e intervenção para esse público, visando prevenir o surgimento de novos casos e minimizar os efeitos adversos sobre o prognóstico dos afetados. Uma das formas de trabalhar essa problemática, segundo Kazitani et al. (2018), seria por meio do fornecimento de informações prestadas pela equipe sobre o procedimento para trabalhar o medo e as preocupações advindas nesse período. O profissional de enfermagem seria um importante aliado para desempenhar essa função, elaborando e implantando ações para minimizar a tensão psicológica.

O psicólogo, por sua vez, tem importante papel, pois contribui ao acompanhar os pacientes com sintomas ansiosos e depressivos em pré-cirúrgico cardíaco. É um profissional que está inserido no hospital para realizar a avaliação psicológica e demais intervenções que se fizerem necessárias aos pacientes. Ele busca minimizar o sofrimento provocado pela hospitalização e as reações emocionais decorrentes desse processo, facilita na recuperação, bem como promove e trabalha junto aos pacientes formas para lidar com a adaptação ao período de internação, além de atuar junto aos familiares desses (Angerami-Camon, 2018).

O psicólogo pode ainda intervir junto à equipe visando conscientizá-la sobre os aspectos psíquicos e emocionais do paciente, buscando facilitar a relação e comunicação entre eles, além de buscar promover atividades de educação em saúde, contribuindo com os profissionais de enfermagem, visto que há evidências em estudos internacionais em que as intervenções educativas estão associadas a menores índices de ansiedade, como foi destacado por Gomes e Bezerra (2017).

Considerações Finais

Este estudo mostrou-se com êxito quanto aos objetivos pretendidos, pois verificou-se a ocorrência de sintomas de ansiedade e depressão em pacientes à espera de cirurgia cardíaca no hospital universitário proposto. Quando o paciente vai ser submetido a procedimento desse tipo, as reações emocionais devem ser trabalhadas desde o início, no pré-cirúrgico, visando contribuir na forma de elaboração do adoecimento e do procedimento cirúrgico para sua vida, evitando possíveis reações não adaptativas desse sujeito.

A pesquisa evidenciou que os sintomas de ansiedade na amostra foram mais frequentes do que os sintomas de depressão, havendo ainda uma associação significativa entre esses dois sintomas, no qual a chance de um paciente com ansiedade ser depressivo é maior se comparada à chance de um paciente não ansioso. Verificou-se ainda que alguns fatores poderiam estar contribuindo para a baixa frequência geral de pacientes que apresentaram sintomas de ansiedade e depressão na amostra estudada, tais como a boa relação com a equipe, as expectativas positivas voltadas para cirurgia e a religiosidade como estratégia de enfrentamento. Esses achados indicam a necessidade de avaliar os pacientes nesse período, visando identificar se há aspectos emocionais que ajudam no enfrentamento ao ­processo ­cirúrgico ou se, não estando os fatores facilitadores presentes, o psicólogo prestará de ­forma mais assertiva um suporte psicológico ao paciente e buscará identificar e trabalhar meios que facilitarão nesse processo.

Mostram-se necessárias pesquisas com um maior número de sujeitos a ser estudado por um período também maior, visando avaliar os aspectos psicológicos envolvidos no pré-operatório cardíaco e poder oferecer meios de vigilância que auxiliem a equipe médica e multidisciplinar nos cuidados aos pacientes cardíacos, seja para amenizar os fatores geradores ou intensificadores de sintomas de ansiedade ou depressão, seja para poder rastrear outras possíveis alterações psicopatológicas que podem influenciar negativamente processos cirúrgicos cardíacos, na adesão ao tratamento, no prognóstico ou na taxa de êxito hospitalar.

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Recebido em: 11/02/2020

Última revisão: 06/01/2021

Aceite final: 20/01/2021

Sobre os autores:

Lívia Maria de Oliveira Silva: Pós-Graduada (Lato Sensu) em Psicanálise com Crianças e Adolescentes pelo Instituto de Graduação e Pós-Graduação (IPOG). Pós-Graduada (Lato Sensu) em Saúde – Alta Complexidade pelo Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Universidade Federal do Piauí. Psicóloga pela Universidade Estadual do Piauí. E-mail: liviamosilva@outlook.com, Orcid: https://orcid.org/0000-0002-4386-7662

Laís de Meneses Carvalho Arilo: Especialista em Gestalt-Terapia com ênfase em psicoterapia pelo Centro de Formação e Aperfeiçoamento Profissional do Piauí (CFAPI). Graduada em Psicologia pela Faculdade Santo Agostinho. Psicóloga hospitalar no Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí (UFPI), no setor de Oncologia. Preceptora da Residência Multiprofissional em Saúde − alta complexidade da UFPI. Tutora do curso de Especialização em Saúde e Comunidade, na UFPI. Docente do curso de Psicologia da Faculdade de Ensino Superior do Piauí (FAESPI) e do Centro Universitário Maurício de Nassau (UNINASSAU), Teresina. E-mail: lais.arilo@hotmail.com, Orcid: http://orcid.org/0000-0002-1625-5601

Lilian Ferreira do Nascimento: Pós-Graduada em Gestalt-Terapia com Ênfase em Psicoterapia pela Faculdade Inspirar. Pós-Graduada (Lato Sensu) em Saúde – Alta Complexidade pelo Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Universidade Federal do Piauí. Pós-Graduada em Tanatologia pelo Centro Sul-Brasileiro de Pesquisa, Extensão e Pós-Graduação (Censupeg). Graduada em Psicologia pela Faculdade Santo Agostinho. E-mail: liliannascimentopsi@gmail.com, Orcid: http://orcid.org/0000-0003-3725-3872

Maria Aurelina Machado de Oliveira: Doutora e Mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Graduada em Psicologia pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI). Pesquisadora voluntária do Grupo de Estudo Psicologia e Saúde (GEPS/UFRN). E-mail: ma.aurelina@ufpi.edu.br, Orcid: https://orcid.org/0000-0002-1832-5490

Welyton Paraíba da Silva Sousa: Doutor e Mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Graduado em Psicologia pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI). Professor no Centro de Educação à Distância da Universidade Federal do Piauí (CEAD/UFPI). E-mail: welytonpa@yahoo.com.br, Orcid: https://orcid.org/0000-0002-0245-1003


1 Endereço de contato: Rua José Santana, n. 1821, Bairro Nova Brasília, Teresina, Piauí. CEP: 64004-540. Telefone: (86) 99481-2665. E-mail: liviamosilva@outlook.com

doi: http://dx.doi.org/10.20435/pssa.v14i1.1245