Escuta Psicanalítica Diante da Morte: Uma Construção de Caso Clínico
Psychoanalytic Listening in Face of Death: A Clinical Case Construction
La Escucha Psicoanalítica Ante la Muerte: La Construcción de un Caso Clínico
Vanessa de Jesus Santos1
Suely Aires
Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Rosana dos Santos Silva
Hospital Universitário Prof. Edgard Santos (HUPES)
Resumo
O artigo consiste em um relato de experiência, fruto de Trabalho de Conclusão de Pós-Graduação Lato Sensu na modalidade de Residência Integrada Multiprofissional em Saúde do Adulto. O estudo de abordagem qualitativa objetivou discutir as possibilidades de intervenção da psicanálise na escuta ao paciente em cuidados paliativos no hospital, utilizando como método a construção do caso clínico em articulação com a teoria psicanalítica de orientação lacaniana. Na construção do caso, foi localizado que o sujeito, diante da proximidade da morte, encontra-se com o impossível de ser simbolizado desse acontecimento, o que produziu urgência subjetiva e levou à necessidade de um tempo para compreender, de modo a oportunizar o manejo do sofrimento subjetivo. O estudo, em sua conclusão, destaca que o trabalho psicanalítico se direcionou para a oferta de cuidado ao paciente, singularizando a vivência do morrer, opondo-se à assistência centrada na padronização de uma boa morte.
Palavras-chave: Construção de Caso, Morte, Cuidados Paliativos, Psicanálise, Hospital
Abstract
The article is an experience report, result of the Lato Sensu Postgraduate Completion Work of the Multiprofessional Integrated Residency in Adult Health. The qualitative approach study aimed to discuss the possibilities of psychoanalysis intervention in listening to the patient in palliative care in the hospital, using, as a method, the construction of clinical case in conjunction with the Lacanian Psychoanalytic theory. In this construction, it was found that the patient, faced with the proximity of death, finds himself with the impossible to be symbolized of this event, the real of death which produces a subjective urgency. Time was necessary to understand and manage the subjective suffering that this experience provides. The study, in its conclusion, emphasizes that the psychoanalytic work was directed towards the offer of care to the patient, singularizing the experience of dying. Therefore, it’s opposed to assistance centered on the standardization of a good death.
Keywords: Case Construction, Death, Palliative Care, Psychoanalysis, Hospital
Resumen
El artículo consiste en un relato de experiencia, resultado del Trabajo de Finalización del Posgrado Lato Sensu en la Residencia Integrada Multiprofesional en Salud del Adulto. El estudio de enfoque cualitativo tuvo como objetivo discutir las posibilidades de intervención del psicoanálisis en la escucha del paciente en cuidados paliativos en el hospital, utilizando como método la construcción del caso clínico en conjunto con la teoría psicoanalítica de orientación lacaniana. En la construcción del caso se constató que el sujeto, frente a la proximidad de la muerte, se encuentra con lo imposible de simbolizar de este acontecimiento, lo que ha producido una urgencia subjetiva e que necesita de un tiempo de comprensión que le permita gestión del sufrimiento subjetivo. El estudio, en su conclusión, destaca que el trabajo psicoanalítico se orientó hacia la oferta de cuidado al paciente, singularizando la experiencia de morir, contraponiéndose al cuidado enfocado en la estandarización de una buena muerte.
Palabras clave: Construcción de Casos, Muerte, Cuidados Paliativos, Psicoanálisis, Hospitales
Introdução
A concretude da morte, da qual nenhum indivíduo quer se dar conta, pode se tornar um acontecimento de intenso sofrimento tanto para aquele que está próximo de morrer como para quem o assiste e cuida, enquanto família e/ou profissional de saúde. Nesse contexto, é comum escutar dos profissionais que não há o que fazer com o paciente que está morrendo. Todavia, Moretto (2008/2019) argumenta que esse não há o que fazer está correlacionado a uma dificuldade em escutar sobre a morte, esse evento que aponta para a real concretização da falta, em função da impossibilidade de representação inconsciente da morte (Freud, 1915/1996b).
O advento de uma doença e a internação hospitalar impactam o sujeito, proporcionando o aparecimento de diversos afetos e revelando o sofrimento psíquico provocado pelo diagnóstico de uma doença potencialmente ameaçadora. Nesse cenário, ao contrário da concepção biomédica, a prática psicanalítica não opera a partir da exclusão dos sintomas e das enfermidades. Como destaca Moretto (2019, p. 33), "o tratamento psicanalítico não se ocupa das doenças, mas sim dos sujeitos”. Ao considerar esse aspecto, encontra-se um ponto de diálogo entre a psicanálise e a prática dos cuidados paliativos, tendo em vista que essa prática propicia o deslocamento de um olhar biológico sobre a doença para o cuidado ao paciente.
O Cuidado Paliativo (CP) “é uma abordagem que promove a qualidade de vida de pacientes e seus familiares, que enfrentam doenças que ameacem a continuidade da vida, através da prevenção e do alívio do sofrimento” (Matsumoto, 2012, p. 26). Em sua prática, busca modificar o foco da intervenção, que passa da doença e da cura, para o cuidar e o paciente, tendo como um dos princípios2 para a efetivação desse trabalho a atuação multidisciplinar, que viabiliza a circulação de diferentes saberes na condução do cuidado ao paciente e aos seus familiares. Sob essa lógica, o trabalho do profissional de psicologia orientado pela psicanálise pode colaborar para o acolhimento do sofrimento psíquico ocasionado pela vivência do adoecimento e da finitude, abrindo um caminho para que algo da subjetividade do sujeito apareça e, assim, o discurso analítico pode ressoar com as práticas de cuidado no hospital.
Este artigo consiste em um relato de experiência, fruto da construção de caso clínico, elaborado como Trabalho de Conclusão da residência multiprofissional em saúde, sustentado por meio da escuta psicanalítica a um paciente em cuidados paliativos. Durante o acompanhamento psicológico ao sujeito em fase final de vida, sob cuidados paliativos, foram suscitadas diferentes inquietações na praticante da psicanálise, em função das limitações e impossibilidades que a enfermidade e a proximidade da morte ocasionaram. Nesse contexto, surgiu como questão-problema para o presente estudo: quais intervenções podem ser realizadas pela praticante da psicanálise no cuidado ao paciente que está morrendo? Como forma de responder a essa problemática, o estudo objetiva discutir as possibilidades de intervenção na escuta ao paciente em cuidados paliativos, a partir da construção de um caso clínico em articulação com a teoria psicanalítica.
Método
O presente estudo qualitativo e exploratório consiste em um relato de experiência da prática profissional, por meio da construção de caso clínico, tendo como referencial teórico a psicanálise lacaniana.
Dias e Moretto (2017) conceituam a construção do caso como um método de sistematização dos significantes extraídos do discurso que a pessoa faz acerca de si, buscando encontrar o sujeito e a interpretação particular que ele constrói para seu mal-estar. Em direção semelhante, Viganò (2010) situa a construção do caso clínico por meio da presença dos atores sociais envolvidos na cena – paciente, família, profissionais, instituições –, buscando encontrar, nas narrativas desses atores, o seu ponto cego, o que aponta para a falta de saber, a partir de onde se constitui o lugar do sujeito e da sua doença.
Nesse cenário de análise, o método de construção do caso tem sido apontado como um potente instrumento de pesquisa em psicanálise na atuação em instituições de saúde (Dias & Moretto, 2017). Ao considerar a prática em hospital, a construção do caso propicia um diálogo com a equipe e possibilita a transmissão de um saber sobre o sujeito que adoece, um saber que não é todo, que aponta para a falta. E, ao discutir com membros da equipe a dimensão singular do caso, abre-se um caminho para que algo da inserção e transmissão do discurso psicanalítico possa repercutir nas reuniões e promover novas intervenções no tratamento.
Local do Estudo e Participante
A pesquisa foi desenvolvida em um hospital geral do SUS vinculado a uma universidade pública. O paciente escolhido para construção do caso foi acompanhado durante dois meses em sua internação nas enfermarias de especialidades clínicas3, e sua escolha foi motivada pela possibilidade de reflexão sobre as intervenções psicanalíticas ao sujeito que está morrendo e em cuidados paliativos no ambiente hospitalar, bem como sobre as repercussões desse cuidado.
Coleta de Dados
Os dados clínicos foram obtidos no prontuário eletrônico do paciente, o qual contém informações ligadas ao atendimento da profissional de psicologia e demais colegas da equipe multiprofissional da enfermaria. Além desses dados, utilizou-se os registros de campo produzidos pela residente de psicologia durante o acompanhamento ao sujeito no período de maio a julho, obedecendo à Resolução CFP nº 001/2009, que orienta a elaboração de registros documentados resultantes da prestação de serviços psicológicos.
Aspectos Éticos
O presente estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do hospital (protocolo 46797221.2.0000.0049 e parecer 4.726.818), tendo seguido os preceitos do código de ética profissional do psicólogo, em seu artigo 9º, de forma a zelar pelo sigilo por meio da confidencialidade do participante envolvido, sendo utilizado um nome fictício para a identificação do paciente.
Resultados e Discussões
O Câncer Como um Intruso: Um Outro que Precisa Morrer
O paciente escolhido para a discussão foi nomeado como Heitor4. Este nome, de origem grega, significa aquele que guarda o inimigo, e sua escolha se deu durante a construção do caso, ao perceber os significantes que o paciente utilizava para falar da sua experiência de adoecimento, quando se colocava numa posição de rivalidade com o câncer. O paciente de sexo masculino, 66 anos de idade, foi admitido em uma enfermaria de clínica médica do hospital, tendo sido sinalizada a possibilidade de diagnóstico de neoplasia pulmonar e, após a realização de exames, foram identificados dois tumores: um na região do pulmão e outro no cérebro, com indicação cirúrgica como via de tratamento.
No primeiro encontro, Heitor narrou seu processo de adoecimento, as passagens anteriores por serviços de saúde, por conta do problema cardíaco, e falou da “surpresa” que sentiu ao saber do diagnóstico atual. “Descobri que tenho um tumor no pulmão e outro no cérebro, imaginei que fosse problema do coração, cardíaco, não esperava por isso”. Heitor silenciou por alguns segundos e, em seguida, disse que estava no aguardo do procedimento cirúrgico para retirada dos tumores. Na escuta ao sujeito, foi observado que, diante do que ouviu sobre o seu adoecimento e tratamento, supôs que “seria curado” por meio da cirurgia. Essa fantasia possibilitava que Heitor se distanciasse daquilo que lhe causava sofrimento, bem como permitia não pensar sobre os possíveis desfechos da doença. O risco de morte era, portanto, retirado de cena. Diante do diagnóstico, o sujeito necessitava de um tempo de elaboração psíquica para dar conta dessa experiência de adoecimento. Não um tempo cronológico, mas um tempo lógico – entre o instante de ver, o tempo para compreender e o momento de concluir – que inclui o sujeito do inconsciente (Lacan, 1945/1998). Para reintroduzir a dimensão subjetiva na urgência temporal, é necessário elaborar os pontos em que se produziu a ruptura, pondo o sujeito a trabalho (Almeida & Aires, 2023).
A oferta de escuta possibilitou a construção, por parte de Heitor, de uma narrativa sobre o seu sofrimento, permitindo que se instaurasse um tempo para compreender o que está experienciando, entre o instante de ver e um período para que alguma elaboração dessa vivência fosse concluída. A urgência subjetiva pode, nesse contexto, ser compreendida como o trabalho psíquico necessário para que, diante do excesso que irrompe e provoca uma quebra discursiva, efetive-se uma tomada de posição subjetiva no tempo. No primeiro momento, ao receber o diagnóstico, o sujeito buscou racionalizar sua experiência de adoecimento, como um recurso de defesa diante daquilo que o mobilizava: “O médico falou, tenho dois tumores, estou aguardando a cirurgia, vou sair daqui curado”. Ao interrogar o sujeito com relação ao seu adoecimento, ele reproduziu a fala da equipe clínica em relação ao tumor e à intervenção cirúrgica; contudo, evitou entrar em contato com aquilo que era da ordem da angústia. Foi necessário ofertar um tempo para que ele pudesse falar do sofrimento que a experiência do adoecimento lhe causava. Nessa lógica, com a instauração de um segundo tempo, o sujeito, ao associar livremente, passou a falar sobre o tema que tem se apresentado como elemento principal da sua internação: a intervenção cirúrgica. E, assim, foi possível, para Heitor, ultrapassar a reprodução do discurso da equipe médica e situar-se subjetivamente nesse processo.
Nos encontros iniciais, Heitor dizia se sentir “ansioso, não aguentava mais esperar”, queria fazer logo o procedimento. Ele manifestava a vontade de realizar as duas cirurgias no mesmo momento: “uma preocupação a menos, me livraria do intruso de vez, ele quase me matou”. O significante intruso era utilizado pelo paciente ao se referir aos dois tumores, tornando-se frequente essa nomeação durante o acompanhamento psicológico. Heitor expressava raiva ao falar desse intruso e da vontade de tirá-lo de dentro do seu corpo. O intruso era um outro que precisava ser destruído; ele o invadiu, e a intervenção cirúrgica era a única via para retirá-lo.
Com a continuidade da oferta de escuta, foi possível ao sujeito falar sobre esse intruso que poderia lhe tirar a vida. Era preciso permitir um espaço para que algo do inconsciente pudesse aparecer, ser escutado e manejado sob transferência. O paciente sinalizava o sofrimento que estava vivenciando com a espera pela cirurgia. Em um momento durante o atendimento, Heitor me perguntou se poderia gravar o procedimento. Neste momento, devolvo o significante gravar, buscando favorecer seus ditos em torno do adoecimento e apostando que ele pudesse formular algo em face dessa pergunta. A partir dessa intervenção, Heitor passou a falar da raiva que lhe atravessava ao se referir a esse intruso. Ao dizer o que iria fazer, caso tivesse a oportunidade de ver sua imagem, afirmou: “queria dar um tiro, matar ele”.
Nesse contexto, revelou-se uma disputa, uma concorrência imaginária, em que Heitor rivalizou com o intruso/câncer. Em sua fantasia, apenas um dos dois sairia vivo: para que o paciente sobrevivesse, o intruso teria que morrer. Moretto (2019) discute que o adoecimento é uma experiência que situa a morte no campo do possível para o sujeito e, nessa perspectiva, Heitor se colocou na posição de lutar pela vida, experienciando uma batalha pela sobrevivência, na disputa com seu inimigo, o intruso.
Considerando o tempo de espera para a realização do procedimento, a analista convidou Heitor a falar sobre o que sabia da cirurgia, e sua resposta aponta para o não querer saber, para algo insuportável de lidar. Ele manifestava, em sua fala, uma suposição de saber em relação aos profissionais da unidade, em especial à equipe médica: “Eles sabem como me curar”. Moretto (2008/2019) afirma que a transferência do paciente com a equipe médica se manifesta pela confiança e obediência às ordens que lhe são impostas, visto que o sujeito deposita, na figura do médico, a expectativa de que, por meio do seu saber e dos dispositivos clínicos, seja possível examinar, diagnosticar e tratar o problema (Moretto, 2008/2019).
Lacan (1964/2008) define a transferência como um fenômeno que requer a existência do sujeito suposto saber para efetivação da relação transferencial. Nessa perspectiva, há um processo transferencial entre paciente e equipe médica, na função do médico de referência, que possibilita a Heitor apostar nas condutas indicadas como forma de “tirar o intruso do seu corpo” e restabelecer sua saúde. O trabalho transferencial entre o sujeito e a praticante da psicanálise funciona de modo diferente. No encontro com a psicanalista, o paciente se depara com uma profissional que não se coloca no lugar do saber, mas que coloca o sujeito na cena e que pede que ele fale (Moretto, 2008/2019). Cabe destacar que só há um sujeito nesta cena, o paciente, visto que a analista faz semblante de objeto. Em uma das sessões, Heitor solicitou que lhe explicasse os cuidados após o procedimento cirúrgico: “Doutora, como vai ser no pós-operatório, o que vou poder fazer?” Ao escutar a ambiguidade presente na questão, devolvi a ele o questionamento, a fim de que ele viesse a produzir alguma elaboração em torno de um saber que ele supõe na praticante.
No atendimento seguinte, Heitor, ao falar da assistência oferecida pela equipe, indicou seu incômodo com algumas comunicações médicas. “Há coisas que os médicos falam que não entendo”. O que não entende? Ele respondeu: “É muita coisa, doutora, muita informação”. E, na continuidade de sua fala, pediu minha presença no momento em que a equipe médica estivesse em seu quarto. Questiono o porquê da minha presença nessa situação e o sujeito responde: “Para explicar as coisas que os médicos me falam e eu não entendo”.
A partir dos atendimentos iniciais, perguntei-me qual seria o lugar que Heitor estaria me atribuindo na transferência? Seria uma tradutora diante de uma fala técnica dos médicos? Com base nesses questionamentos, ponderei que essa tradução poderia ser uma forma de secretariar o paciente e mediar suas relações com o mundo. Refleti em supervisão que, nesse caso, meu trabalho poderia funcionar como um espaço para contornar o sofrimento psíquico diante do mal-estar que se encontrava presente em função da experiência de adoecimento. Dessa forma, considero que uma psicanalista ou praticante da psicanálise, nesse espaço, tem como função permitir que as vivências subjetivas, promovidas por uma doença, sejam escutadas e trabalhadas no espaço hospitalar.
O trabalho da psicanálise no hospital é refletido com base em sua inserção e transmissão. Moretto e Priszkulnik (2014) destacam que a entrada da psicanalista não corresponde, necessariamente, à sua inserção na equipe, mas sim a um lugar que precisa ser construído de modo que ela, a psicanalista, possa operar. Darriba (2019) discute que, na transmissão psicanalítica neste espaço, a analista não se coloca como questionadora de um saber, sequer como portadora de um saber a mais, entretanto, possibilita a aposta de uma nova relação com o saber. Essa discussão também é promovida por Aires (2014) ao refletir que a posição da analista não deve se centrar em uma busca de sentido a partir do discurso do sujeito, mas de sustentar uma posição de escuta dos significantes em sua singularidade e equivocidade.
Na escuta singular, foi oportunizado a Heitor falar sobre a vivência de adoecimento pela qual passava e identificar e elaborar o lugar que a cirurgia ocupava imaginariamente. Em sua fala, a ideia de cura da doença pela via do procedimento cirúrgico era algo recorrente, manifestando a confiança na equipe da unidade para o restabelecimento da sua saúde. No entanto, essa certeza foi abalada em função de um evento: o paciente sofreu um Acidente Vascular Cerebral Isquêmico (AVCi), inicialmente apresentando uma hemiparesia esquerda que afetou suas funções motoras, passando a ficar mais tempo deitado no leito. Falou do medo que tinha de cair e sofrer novamente o AVCi e, nesse contexto, o silêncio do sujeito começou a se manifestar, principalmente nos momentos em que algo apontava para a angústia.
Como destaca Lacan (1962-1963/2005), a angústia pode ser entendida como um afeto/sinal de uma experiência irredutível do real. O encontro com uma doença orgânica pode, portanto, produzir o advento da angústia. Nessa perspectiva, o acontecimento do AVCi pode ser compreendido como uma experiência do real que irrompe no corpo e que indica algo que não estava planejado, mobilizando afetos em Heitor. Moretto (2019), ao refletir sobre o adoecimento do sujeito, entende esse evento como “um acontecimento de corpo5 (e não apenas do organismo) que, por ser disruptivo, exige um esforço psíquico extraordinário por parte do paciente” (p. 58). Moretto (2006) diferencia acontecimento e experiência, sendo o acontecimento aquilo que se refere ao fato, ao adoecimento, enquanto que a experiência se relaciona com a dimensão subjetiva do fato. A clínica psicanalítica enfatiza a experiência, a singularidade de cada sujeito; desse modo, não é o AVCi como fato, acontecimento, que se torna o eixo do nosso tratamento, mas como o sujeito o experiencia, em sua dimensão singular.
Heitor, sob transferência, começou a enunciar seus afetos mais mobilizadores, estimulados em grande parte pela percepção de seu corpo enquanto um corpo doente; narrou seu cotidiano antes das enfermidades, o convívio com a família, o gosto por dirigir e a época em que trabalhava. Com o agravamento do quadro clínico se presentificando no corpo fragilizado, foi possível para o paciente dizer sobre as dores, os amores, as frustrações e as alegrias, viabilizando elaborar subjetivamente aspectos de sua vida e inventar ou, pelo menos, tentar construir modos de lidar com o real do câncer e o sofrimento vivenciado.
O contato do paciente com a instituição de saúde pode propiciar o encontro do sujeito com o real6, o intolerável de dizer. E, nesse ponto de vista, a experiência do real do corpo que o câncer provoca possibilita o aparecimento de diversos afetos, quando, de início, as palavras não são passíveis de serem ditas. Ao relatar e elaborar sua experiência, foi possível escutar sobre a saudade de Heitor ao referir-se à relação conjugal com a esposa e ao convívio com o neto, quando me perguntou: “O que vai ser deles quando eu morrer?”. Nesse momento, a praticante pontuou o significante morrer, e o sujeito se permitiu falar sobre o medo de morrer e o medo de deixar seus familiares. Em seu dizer, foi possível identificar um trabalho de luto, entendido como reação à perda de um objeto amado, que pode ser um ente querido ou alguma abstração que ocupou o lugar desse objeto (Freud (1917/1996a). Na continuidade do atendimento, foi possível para Heitor trabalhar a dimensão da falta, a sua falta para o outro, instaurando um tempo de elaboração para um luto antecipatório em torno dessas perdas, daqueles com quem convive, bem como de sua vida.
Diante da identificação pela equipe médica da condição de metástase do tumor na região do cérebro, constatando a proximidade da morte de Heitor, o médico responsável pelo caso conversou sobre a situação com o paciente e seus familiares. A cirurgia, antes vista como a responsável por retirar o intruso de seu corpo, mostrou-se inviável, causando angústia ao sujeito. Presentifica-se, mais uma vez, o encontro com o irrepresentável da morte e o intolerável de dizer, o que demanda tempo para que alguma elaboração psíquica se faça em torno da experiência de finitude. Nessa direção, Baroni e Kahhale (2011) argumentam que o sujeito que está morrendo se encontra diante do insuportável de elaborar subjetivamente, e isto precisa ser escutado.
E Quando não há Fala? Um Caminho Encontrado em Meio às Adversidades da Terminalidade
Devido ao estágio avançado do câncer, o paciente encontrava-se, durante alguns momentos, em uso da bomba de oxigênio e, em outros, sem o equipamento, mas com dificuldade para verbalizar. Muitas vezes, ficava sem emitir palavra alguma, tornando-se um grande desafio para a praticante a condução dos atendimentos, visto que a psicanálise opera pela via da associação livre, tomando como ponto de partida a condição do ser falante, com seu jogo de palavras, de equívocos entre os significantes. Ressalta-se como aspecto importante ponderar que, de um lado, se a condição clínica dificultava a fala de Heitor, de outro, a ausência da palavra também era provocada pela angústia diante daquilo que era impossível de ser dito.
A clínica psicanalítica trata o sofrimento psíquico do sujeito pela palavra. O que fazer diante daquele paciente que, no momento, não pode verbalizar ou não consegue colocar em palavras o sofrimento que está sentindo? O que fazer para favorecer a subjetividade daquele que está morrendo? Foram necessários períodos de estudo, discussão, supervisão clínica da preceptoria e tutoria, registro solitário dos atendimentos e análise pessoal para lidar com essas questões que mobilizaram a profissional. O que foi realizado partiu da perspectiva de um acolhimento das demandas do sujeito, estruturado com base em uma escuta sensível dos seus conteúdos subjetivos. A palavra da praticante foi essencial para o reconhecimento da posição de sujeito na cena hospitalar; bem como a aposta na presença, em fazer presença por meio da voz e do olhar, como ato analítico fundamental nesse trabalho, presentificando-se ali, com ele, no momento de finalização da vida.
Nos momentos em que o sujeito estava impedido de falar, a praticante começou a narrar os conteúdos ditos por ele em sessões anteriores. Em alguns desses momentos, as lágrimas caíram em seu rosto, quando a praticante apresentava os relatos da convivência com seu neto, sua esposa e da época em que trabalhava. Na continuidade da escuta, foi observado que, mesmo com as dificuldades na condução clínica, há possibilidade de um trabalho psicanalítico ao paciente que está morrendo e, por circunstâncias diversas, que esteja sem condições de fala. Moretto (2008/2019) argumenta que a demanda desses pacientes “não é propriamente de análise, mas sim de um apaziguamento da angústia de morte” (p. 103). É possível acolher os ditos e não ditos, os silêncios do sujeito, disponibilizado a partir da palavra e presença da analista, de modo a constituir uma borda para o sofrimento psíquico.
No último atendimento, três dias antes de morrer, Heitor olhou para a praticante e falou que ela deveria ter feito a pergunta mais importante. Questiono que pergunta seria essa, e ele disse: “Você deveria me perguntar qual comida eu gostaria de comer pela última vez”. Ela fez a pergunta e ele respondeu: “Uma feijoada, eu gosto muito de feijoada, doutora”. Esse questionamento mostrou-se importante ao favorecer o reconhecimento da finitude na cena, assim como a dimensão da singularidade, que torna cada sujeito único. Mesmo diante da morte, ele mantém os aspectos subjetivos que o constituem e que dizem da sua história.
O trabalho psicanalítico se realizou em torno do que foi possível fazer no momento. Mesmo diante da pressa e da urgência, a escuta psicanalítica possibilita uma pausa para que o singular de cada sujeito possa advir e, pela palavra, possa construir narrativas sobre si. E quando a própria palavra do sujeito não é possível de ser dita, apostamos que o acolhimento em seus momentos finais de vida seja disponibilizado a partir da palavra e presença da analista, bordejando o sofrimento que esse momento implica.
Boa morte para quem?
A partir da impossibilidade de tratamento curativo da doença e iminência de morte, a equipe de cuidados paliativos do hospital passou a acompanhar o paciente. Em conjunto com os profissionais de referência da unidade, o paciente e a família, foram definidas como condutas prioritárias para Heitor: o conforto, a melhora da qualidade de vida, o controle dos sintomas e o alívio do sofrimento, princípios estes que norteiam a prática dos cuidados paliativos.
A presença da família foi um fator de discussão em equipe desde a entrada do paciente na unidade. Segundo a Lei nº 10.741 de 1º de outubro de 2003, que dispõe sobre o Estatuto do Idoso, todo paciente hospitalizado com 60 anos ou mais tem direito a acompanhante. No entanto, Heitor dizia nos atendimentos que não gostaria que seus familiares o acompanhassem na unidade. Ele apontava um sofrimento psíquico ao falar sobre sua condição de doente: “Estou fraco, não quero que me vejam assim; eu era bem forte, saudável”.
A proximidade de morte de Heitor sem a presença dos familiares mobilizava os profissionais da enfermaria, situação que possibilitava reconhecer, no imaginário dessa equipe, o que poderia ser um modelo ideal de morte no hospital, associado à imagem da família reunida em torno do leito do paciente, passando a impressão de tranquilidade e amenização do sofrimento. Aqui, há o apoio na discussão promovida por Menezes (2004) sobre o modelo da “boa morte”7, movimento presente no cenário dos cuidados paliativos, em que o paciente resolveria seus conflitos, situações mal-acabadas, e os familiares, em volta do leito ou especialmente em casa, selariam as discordâncias para que o sujeito pudesse “partir de uma forma tranquila”. Essa concepção se apresenta como uma visão romântica e reducionista da morte, em que haveria uma forma única e padronizada de uma “boa morte”, retirando o aspecto singular de cada experiência.
Diante da discussão do caso pela equipe médica de cuidados paliativos, juntamente com o médico de referência, houve o debate em torno da possibilidade de desospitalização do paciente e o recurso ao home care8. Salienta-se que, no trabalho psicanalítico, é imprescindível escutar o sujeito e o que ele tem a dizer a respeito de sua vida e, no contexto da hospitalização, o que pensa das condutas ofertadas para o seu tratamento. Ao perguntar ao paciente o que pensava a respeito dessa proposta, ficou evidente a ambivalência do sujeito. Heitor expressava, inicialmente, a disponibilidade para o retorno ao convívio familiar, ao mesmo tempo que manifestava como fundamental para seu cuidado a assistência realizada pelos profissionais na enfermaria. Essa ambivalência foi discutida com a equipe, destacando que a decisão deveria levar em conta a autonomia do paciente.
Como forma de debater o conceito de autonomia e trazer reflexões que ultrapassem uma concepção única, utiliza-se a noção de heteronomia sem servidão9, tal como apresentada por Safatle (2019). Essa concepção parte da premissa de que o sujeito tem liberdade à medida que tem a capacidade de lidar com algo que não tem controle por completo, mas que ele toma como seu. A liberdade, segundo Safatle (2019), estaria assim relacionada à compreensão de que há uma alteridade profunda que afeta o sujeito, que o transforma. Onocko-Campos e Campos (2006), por um viés distinto, problematizam o conceito de autonomia nas práticas em saúde, ao destacá-la não como uma prática de liberdade absoluta ou como uma oposição à dependência, mas associada à capacidade de o sujeito lidar e intervir considerando sua rede de dependências. Embora sigam vias distintas, ambas as problematizações permitem reconhecer os limites e a liberdade de cada ato de escolha.
No diálogo em equipe, foi possível apontar a singularidade do um a um, salientando que cada sujeito tem uma forma própria de lidar com seu adoecimento e com os limites diante da proximidade da morte. Ao sublinhar a ambivalência do sujeito, foi observado o embaraço da equipe ao defender a ideia da desospitalização, reafirmando que seria “o melhor” para o paciente. Esse embaraço decorre do fato de o sujeito ter verbalizado suas ambivalências aos profissionais, o que convocava a equipe a deparar-se com as diferenças discursivas, com a alteridade. Heitor não estava morrendo sedado, ele podia dizer sobre seu mal-estar, como um sujeito dividido, e a equipe lidou com isso a seu modo.
Em supervisão, e nas discussões em torno do caso, foi questionado: de que boa morte estava se falando? Qual ideal de laços familiares estava sendo debatido? Talvez, para os defensores desse ideal, Heitor não tenha experienciado uma “boa morte”, pela ausência de alguns rituais, como o cessar dos conflitos familiares existentes, a desospitalização e a não despedida presencial de sua esposa e neto. O paciente vivenciava raiva, mágoa e ressentimento ao falar da relação com os filhos do seu primeiro casamento e da ruptura de vínculo com um dos filhos. Apesar do adoecimento, não houve contato entre pai e filho durante a hospitalização de Heitor. Mantinham-se como vínculos afetivos significativos para o paciente sua esposa, neto e uma das filhas, que passou a lhe visitar com maior frequência durante o internamento. Para os defensores de um ideal de “boa morte”, Heitor não fechou um ciclo devido aos conflitos que não foram cessados, entendidos como situações inacabadas ao final de sua vida. No entanto, partindo da ética da psicanálise, o trabalho com o sujeito em fase final de vida não se ancora em defender uma ideia de boa morte, mas em acolher o sofrimento subjetivo associado à experiência do adoecimento, assim como identificar e manejar os limites que cada pessoa tem para lidar com o próprio processo de finitude.
Ressalto que respeitar a vontade do paciente é um dos aspectos característicos dos cuidados paliativos e não deve ser deixado de lado em função de protocolos e padronizações das condutas pelas equipes de saúde. Hipoteticamente, sua ida para casa, com a presença de seus familiares, funcionaria como um ponto de angústia, um encontro com o real, o impossível de sustentar psiquicamente naquele momento, acarretando mais sofrimento em seu final de vida. Desse modo, enquanto a ambivalência se mantinha, não se fazia possível, para Heitor, decidir pelo retorno à casa. Considera-se, nesse contexto, que Heitor vivenciou seu processo de morrer e trabalhou subjetivamente o que lhe foi possível elaborar dessa experiência.
Considerações Finais
A experiência de acompanhamento a pacientes em cuidados paliativos, durante o percurso de dois anos de residência, suscitou questões associadas à prática psicanalítica com sujeitos que se encontram próximos à morte. Nessa direção, a residência multiprofissional, enquanto um ambiente de formação de diferentes áreas de conhecimento, torna-se um potente espaço de debate relacionado aos manejos clínicos realizados nesse cuidado. Sob essa perspectiva, as reuniões em equipe, as sessões e as supervisões clínicas com a preceptoria e tutoria foram fundamentais para pensar as condutas que visavam a um cuidado integral, seguindo a lógica do acolhimento e protagonismo do paciente em seu processo de adoecimento. Desses encontros surgiram elaborações, algumas das quais se encontram refletidas no presente artigo.
A escolha pela construção do caso clínico como método da pesquisa se deu pela oportunidade de transmitir o saber psicanalítico na discussão e no trabalho em equipe e por favorecer a problematização da experiência do acontecimento morte, bem como as intervenções psicanalíticas possíveis neste espaço. Por meio da aposta na escuta analítica, foram empreendidas reflexões em torno da inserção da psicanálise na atuação multiprofissional em ambiente hospitalar. A residente, ocupando o lugar de praticante da psicanálise, permitiu fazer ecoar nas reuniões em equipe o discurso psicanalítico, enfatizando a posição subjetiva do sujeito hospitalizado.
O estudo permitiu traçar algumas considerações, para o campo da psicologia hospitalar e para o programa de residência multiprofissional, relacionadas às discussões sobre as práticas clínicas ofertadas ao paciente em terminalidade no hospital, como a atuação dos cuidados paliativos que operam e intervém a partir da concepção do sujeito biopsicossocioespiritual. A perspectiva psicanalítica, em sua especificidade e diferença, dá estatuto de existência ao sujeito do inconsciente ao escutar o paciente, propiciando a elaboração do sofrimento subjetivo. Também se mostrou possível debater o ideal da boa morte e refletir sobre as implicações desse modelo na assistência aos pacientes. O cuidado ao sujeito que está morrendo não deve partir de uma defesa da “boa morte”, com protocolos para se definir como morrer bem, mas deve viabilizar que cada paciente, com sua singularidade, contexto sociofamiliar e cultural próprio, possa construir recursos imaginários e simbólicos para suportar o caminhar nos seus últimos momentos de vida.
O cuidado dispensado fundamentou-se em acolher, por meio da escuta, a angústia do sujeito e viabilizar a elaboração psíquica desse momento. Desse modo, poder falar sobre essa experiência, na medida do (im)possível, assegurou a Heitor não apenas tratar da morte, mas também da vida – aquela que viveu e que estava vivendo –, para que assim fosse capaz de ressignificar essa última etapa de existência. Por fim, enfatizamos que a prática psicanalítica no hospital possibilita instaurar uma pausa, um tempo de compreender, diante da urgência que a morte pode suscitar, para que a subjetividade possa advir e, pela palavra, cada sujeito possa construir narrativas sobre si. Trata-se de um trabalho clínico que se dá a partir da escuta dos significantes enunciados na fala do sujeito, permitindo bordejar a angústia perante o real e acompanhar os deslocamentos singulares na travessia do adoecer e morrer.
Referências
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Recebido em: 21/06/2022
Última revisão: 19/09/2023
Aceite final: 17/12/2023
Sobre os autores:
Vanessa de Jesus Santos: Mestranda em Psicologia na Universidade Federal da Bahia (UFBA), Pós-graduação Lato Sensu em Psicologia da Saúde, na modalidade de residência multiprofissional em saúde do Hospital Universitário Professor Edgard Santos, e graduada em Psicologia pela UFBA. Psicóloga Clínica. E-mail: vanessapsicologa.psi@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000.0002-5970-87-62
Suely Aires: Doutora em Filosofia da Psicanálise, mestre e psicóloga pela Universidade Estadual de Campinas. Docente do Instituto de Psicologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Tutora na Residência Multiprofissional em Saúde do Hospital Universitário Professor Edgard Santos, da UFBA. E-mail: suely.aires7@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0802-9070
Rosana dos Santos Silva: Doutora em Ciências Sociais, mestre e psicóloga pela Universidade Federal da Bahia. E-mail: rosanassilva@hotmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000.0003-4830-6781
1 Endereço de contato: Rua Caetano Moura, 107, Federação, Salvador, BA, Brasil. CEP: 40210-340. Telefone: (71) 9 9703-7697.
2 Destacam-se como princípios dos cuidados paliativos: a promoção do alívio da dor e de outros sintomas desagradáveis; afirmação da vida e o entendimento da morte como um processo normal da vida; não acelerar nem adiar a morte; integração dos aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao paciente; oferta de um sistema de suporte que possibilite ao paciente viver tão ativamente quanto possível, até o momento da sua morte; assistência para acolher os familiares durante a doença do paciente e ao enfrentamento do luto; abordagem multiprofissional para focar nas necessidades dos pacientes e seus familiares incluindo o acompanhamento no luto; melhorar a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso da doença, iniciando o tratamento de forma precoce (Matsumoto, 2012).
3 Estas enfermarias fazem parte dos rodízios do primeiro ano do programa de residência integrada multiprofissional em saúde.
4 Nome fictício que significa "aquele que guarda", "aquele que retém o inimigo”. Tem origem no grego Héktor, a partir da raiz ekhein, que quer dizer “possuo, tenho em meu poder”. Fonte: https://www.dicionariodenomesproprios.com.br/nomes-masculinos/h/
5 O termo ‘acontecimento de corpo’ é utilizado por Soler (2019), que define o corpo como afetado pelo significante, produto transformado pelo discurso e não um dado da natureza. É, portanto, um corpo vivente, pulsional, regido pelo inconsciente e inserido no campo da linguagem.
6 O real é um dos três registros da realidade humana tal como nomeados por Lacan: o Simbólico, o Imaginário e o Real (1959-1960/2008). Na psicanálise lacaniana, o real pode ser definido como o não-sentido, aquilo que escapa a toda e qualquer perspectiva de representação, o impossível de ser simbolizado e assimilado pelo aparelho psíquico (Jorge, 2017).
7 O modelo da boa morte é apresentado nas obras “La mort intime. Ceux qui vont mourir nous apprennent à vivre”, de Marie de Hennezel e Dying well; “Peace and possibilities at the end of life”, de Ira Byock” (Menezes, 2004, p. 39). De acordo com a autora, as obras contêm relatos e observações de doentes que foram cuidados até a morte de acordo com os ditames desta modalidade recente de construção da última etapa da vida.
8 De acordo com o Ministério da Saúde (2013), o atendimento domiciliar (home care) é uma modalidade de atendimento em saúde que prevê a continuidade do tratamento no domicílio do paciente, através de uma equipe multidisciplinar com estrutura especializada e protocolos de segurança.
9 Safatle (2019) define primeiramente o que seria uma heteronomia com servidão, destacando que essas relações se expressam através da submissão da vontade do sujeito à vontade de um Outro, que, nesta situação, é contextualizada como uma forma de alienação. No entanto, de acordo com o autor, a heteronomia sem servidão está associada ao modo como o indivíduo se implica em uma posição, mesmo não sendo a sua e não se definindo a partir do exercício das suas potencialidades, mas que também não é da vontade de um Outro.
doi: http://dx.doi.org/10.20435/ pssa.v15i1.2085