O Enfrentamento dos Enfermeiros na Covid-19: Impactos em sua Saúde e no Cuidado ao Paciente

The Difficulties Faced by Nurses in the COVID-19: Impacts on Their Health and Patient Care

El Enfrentamiento de los Enfermeros en la COVID-19: Impactos en su Salud y Atención al Paciente

Leonardo Soares Trentin1

Alberto Manuel Quintana

Silvana Bastos Cogo

Universidade Federal de Santa Maria

Félix Miguel Nascimento Guazina

Universidade Franciscana

Adaiane Amélia Baccin

Universidade Federal de Santa Maria

Resumo

O presente estudo teve o objetivo de investigar o enfrentamento dos enfermeiros durante a pandemia da covid-19. Para tanto, realizou-se um estudo exploratório e descritivo de natureza qualitativa, tendo como embasamento o método clínico-qualitativo. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista semiestruturada com 6 enfermeiros que trabalharam em uma Unidade de Pronto Socorro, a qual foi transformada em UTI Covid durante a pandemia. Utilizou-se a análise de conteúdo temática como forma de análise dos dados. Como enfrentamentos, os entrevistados destacaram a readequação estrutural; disponibilidade e qualidade dos recursos materiais e humanos; constantes mudanças de protocolos e fluxos; e necessidade de treinamentos e capacitações. Somam-se, ainda, sobrecarga de trabalho, acúmulo de funções e esgotamento profissional, já que os enfermeiros tiveram de assumir o trabalho da equipe multiprofissional. Além disso, os limites dos conhecimentos tecnocientíficos sobre a evolução do vírus os colocaram diante de questões relativas à finitude da vida, trazendo sentimento de desamparo e impotência. Como considerações finais, evidenciou-se que as mudanças suscitadas pela pandemia da covid-19 impactaram o trabalho dos enfermeiros, o que acarretou consequências para sua saúde e para o cuidado ao paciente.

Palavras-chave: Covid-19, Saúde Holística, Enfermeiros, Cuidados de Enfermagem

Abstract

This study investigates the difficulties faced by nurses during the COVID-19 pandemic. An exploratory, descriptive, and qualitative study was accomplished based on the clinical-qualitative method. The data were collected through a semi structured interview with 6 nurses who worked at a First Aid Unit which was turned into a COVID ICU during the pandemic. The method used to analyze the data was the thematic content analysis. As difficulties, the interviewers highlighted structural readjustment; availability and quality of material and human resources; constant protocol and flow changes; and the need for training and qualification. Aside from that, there is work and role overload, as well as professional burnout, since the nurses had to take on the work from the multi professional team. Beyond that, the limits of the technoscientific knowledge on the virus evolution made them face the finitude of life, bringing forward feelings of despair and helplessness. As final considerations, it becomes evident that the changes brought on by the COVID-19 pandemic impacted the work of nurses, which entailed consequences on their health, as well as on patient care.

Keywords: COVID-19, Holistic Health, Nurses, Nursing Care

Resumen

El presente estudio tiene como objetivo investigar el enfrentamiento de los enfermeros durante la pandemia de la COVID-19. Por lo tanto, se realizó un estudio exploratorio y descriptivo de carácter cualitativo, basado en el método clínico-cualitativo. La recolección de datos se realizó a través de una entrevista semiestructurada con 6 enfermeros que trabajaban en una Sala de Emergencia, que se transformó en una UCI COVID durante la pandemia. Se utilizó el análisis de contenido temático como forma de análisis de datos. Como enfrentamientos, los entrevistados destacaron el reajuste estructural; disponibilidad y calidad de los recursos materiales y humanos; cambios constantes en protocolos y flujos; y la necesidad de formaciones y capacitaciones. Aparte de eso, sobrecarga de trabajo, acumulación de funciones y agotamiento profesional, ya que los enfermeros debían asumir el trabajo del equipo multiprofesional. Además, los límites del conocimiento tecnocientífico sobre la evolución del virus los ponen frente a interrogantes relacionados con la finitud de la vida, trayendo un sentimiento de desamparo e impotencia. Como consideraciones finales, se evidencia que los cambios provocados por la pandemia de COVID-19 impactaron el trabajo de los enfermeros, lo que tuvo consecuencias para su salud y para el cuidado de los pacientes.

Palabras clave: Covid-19, Salud Holística, Enfermero, Atención de Enfermería

Introdução

No final de dezembro de 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) foi alertada sobre a ocorrência de vários casos de pneumonia na cidade de Wuhan, situada na China, cuja cepa do vírus causador ainda não havia sido identificada em seres humanos. Menos de três meses após esse alerta, em 11 de março de 2020, casos semelhantes foram registrados em todos os continentes, com exceção da Antártida, o que levou a OMS a caracterizar a propagação do vírus, denominado de Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2 (SARS-CoV-2), cuja doença infecciosa recebeu o nome de Coronavirus Disease 2019 (covid-19), como uma pandemia mundial (Organização Pan-Americana de Saúde [OPAS] & Organização Mundial da Saúde [OMS], 2020).

Como se tratava de um vírus que ainda não havia sido registrado em seres humanos, a ausência de conhecimento e dados científicos sobre o novo coronavírus fomentou questionamentos sobre quais seriam as medidas adequadas a serem adotadas diante da sua alta velocidade de propagação e elevado índice de mortalidade, especialmente em populações vulneráveis (Werneck & Carvalho, 2020). Dessa forma, a pandemia demandou que a gestão dos serviços de saúde se articulasse, para aumentar a capacidade de assistência e suplantar os desafios que surgissem concomitantes à propagação da covid-19. Assim, exigiram-se mudanças estruturais, reorganização dos serviços – recursos materiais, financeiros e humanos –, além do preparo dos profissionais de saúde para o combate à doença (Rodrigues et al., 2020).

Nesse contexto, torna-se imprescindível salientar a atuação dos profissionais de Enfermagem no enfrentamento à covid-19, em seus mais diversos níveis de saúde, para a assistência de qualidade. Segundo o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem (CEPE) (2017), a respectiva profissão está comprometida com a produção e gestão do cuidado prestado nos diferentes contextos socioambientais e culturais em resposta às necessidades da coletividade. Além disso, a partir do planejamento, implementação, avaliação e registro dos cuidados prestados, os profissionais da área de Enfermagem têm como responsabilidade a promoção, a prevenção e a restauração da saúde, cujo propósito é fomentar assistência segura ao paciente e à sua rede de apoio. Para Miranda et al. (2020), a essência da Enfermagem é o processo de cuidar, em virtude de esses profissionais estarem na linha de frente da assistência prestada ao paciente, independentemente do tipo de atendimento ou da situação de saúde – pandêmica ou não.

No entanto, Vincent e Amalberti (2016) evidenciam que, devido a uma combinação de fatores – as vulnerabilidades do sistema, as atitudes pessoais, a dinâmica e a comunicação da equipe, pressões e restrições –, o cuidado dirigido aos pacientes, muitas vezes, não atinge o nível pretendido pelos profissionais. Soma-se a isso o dimensionamento inadequado do pessoal de Enfermagem e dos recursos materiais – insuficiência e baixa qualidade de materiais e insumos para a assistência ao paciente (Hernándes-Cruz et al., 2017; Ribeiro et al., 2018).

Dentro disso, deve ser salientado que muitos profissionais de Enfermagem têm atuado em situações desfavoráveis para o cumprimento integral do processo de cuidado, demandando esforços para o planejamento e a adoção de estratégias de prevenção da omissão do cuidado e para a melhoria da prática assistencial (Lima et al., 2020), como no contexto de pandemia da covid-19. Desse modo, alguns aspectos da atividade de Enfermagem foram afetados, o que, em consequência, pode ter prejudicado a assistência, a saúde física e mental desses profissionais, bem como o cuidado ao paciente hospitalizado (Jackson et al., 2020).

À vista disso, o presente estudo tem o objetivo de investigar o enfrentamento dos enfermeiros durante a pandemia da covid-19.

Método

O presente estudo fundamenta-se como um estudo exploratório e descritivo de natureza qualitativa, tendo como embasamento o método clínico-qualitativo. Delimitou-se pelo método clínico-qualitativo, uma vez que este visa dar interpretações e sentidos a significações atribuídas por indivíduos a fenômenos pertinentes aos contextos do binômio saúde-doença (Turato, 2013).

A pesquisa foi realizada, entre novembro e dezembro de 2021, com seis enfermeiros que trabalhavam em uma Unidade de Pronto-Socorro (PS) de um hospital de ensino do Rio Grande do Sul, onde foi instalada, provisoriamente, em abril de 2020, uma Unidade de Terapia Intensiva Covid (UTI Covid), a qual possuía 15 leitos para o atendimento de pacientes com covid-19. Todavia, deve ser destacado que, em fevereiro de 2021, a UTI Covid foi transferida para outras instalações, voltando o local a ser um PS.

A escolha pelos enfermeiros deu-se pelo fato de que eles são referência no cuidado direcionado aos pacientes em âmbito hospitalar. Foram incluídos enfermeiros em atuação na Unidade de Pronto-Socorro do hospital, antes de 2020, já que esses detêm as percepções acerca das mudanças ocorridas na unidade, bem como as influências da pandemia sobre o cuidado direcionado ao paciente e que permaneceram na unidade quando foi transformada em UTI Covid. Foram excluídos profissionais contratados ou realocados para a Unidade de Pronto-Socorro durante o período da pandemia; profissionais temporários e/ou que foram afastados por mais de 30 dias durante a pandemia; profissionais que estavam de licença ou em férias. Após a chefia responsável disponibilizar o contato telefônico dos enfermeiros, entrou-se em contato com os respectivos profissionais de forma aleatória via WhatsApp, sendo a amostra delimitada pelo critério de saturação.

Como instrumento para a coleta de dados, foi utilizada a entrevista semiestruturada individual com seis enfermeiros – cinco na modalidade remota e um na modalidade presencial. Como alguns participantes optaram por realizar a entrevista pela modalidade remota, marcou-se um encontro on-line individual com cada enfermeiro, pelo Google Meet, sendo gravado tanto em áudio quanto em vídeo, respeitando-se os aspectos éticos. Já a única entrevista presencial foi realizada nas dependências do hospital em uma sala reservada, sendo registrada somente por áudio. As entrevistas foram realizadas pelo pesquisador principal da investigação, com duração média de 45 minutos.

De acordo com Minayo (2014), a entrevista semiestruturada parte de eixos norteadores constituídos por questões abertas. Dessa forma, os principais eixos norteadores abordados nas entrevistas foram questões relativas à pandemia da covid-19, nos quais se contemplaram sobre: as mudanças na organização e na dinâmica hospitalar; disponibilidade de recursos humanos e materiais; oferecimento de treinamentos e capacitação; utilização de protocolos; comunicação entre os profissionais e com os pacientes; comunicação dos pacientes com seus familiares e o cuidado integral direcionado ao paciente.

Como forma de análise dos dados coletados, a presente investigação utilizou a análise de conteúdo temática. Para Bardin (2015), a análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações, cuja finalidade é obter indicadores, a partir de procedimentos sistemáticos e objetivos que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção das mensagens. Minayo (2014) salienta que, dentre os procedimentos metodológicos da análise de conteúdo, destacam-se a categorização, a inferência, a descrição e a interpretação – não necessariamente de forma sequencial. Dessa forma, após a transcrição das entrevistas, os dados coletados foram decompostos em partes de acordo com o grau de significação, repetição, carga emocional, congruência ou contradição das narrativas. Após isso, foi realizada uma descrição e inferência dos resultados, sendo interpretados com auxílio da fundamentação teórica adotada.

A pesquisa somente foi colocada em prática após todos os trâmites institucionais e éticos serem efetivados, como também após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UFSM, sob CAAE n. 52945921.3.0000.534. Assim, para manter o sigilo, os enfermeiros participantes da pesquisa foram identificados por códigos – E1; E2; E3 –, sendo a numeração estabelecida conforme a ordem da realização das entrevistas.

Resultados e Discussões

As análises e as discussões dos resultados desta investigação serão sintetizadas em três categorias. A primeira versa sobre a estruturação e organização da UTI Covid, e os impactos disso na saúde dos enfermeiros e no cuidado ao paciente. A segunda expõe as repercussões da morte e do morrer no contexto da pandemia da covid-19 para os enfermeiros. Já a última aborda o esgotamento profissional dos enfermeiros, destacando os possíveis impactos em sua saúde física e mental.

UTI Covid: da (Re)Organização aos Impactos na Saúde dos Enfermeiros e no Cuidado ao Paciente

Apesar da sobrecarga de trabalho fazer parte da rotina dos profissionais de Enfermagem nos hospitais, a demanda expressiva e a alta complexidade do paciente covid-19 extrapolaram suas capacidades de assistência a ele. Neste sentido, para dar suporte aos pacientes com quadros graves, fez-se imprescindível a criação de UTI, já que essa dispõe de uma tecnologia avançada e de equipamentos que monitoram constantemente os pacientes críticos (Marques et al., 2021). Todavia, os enfermeiros que prestaram cuidados na UTI Covid do hospital em que a pesquisa foi realizada eram do Pronto-Socorro, não possuindo, de início, habilidades para atuar em uma unidade de alta complexidade: “Era bem desgastante. Tu tinha uma demanda muito grande, porque eram cuidados de UTI, eram cuidados muito mais complexos do que os que a gente já tinha. Demandava bastante” (E2).

Além disso, ao ser um vírus inédito e desconhecido, os conhecimentos sobre sua forma de disseminação e evolução, sua forma de manejo e tratamentos adequados ainda estavam em análise, o que demandava adaptações constantes nos modos de prestar cuidado (Chamboredon et al., 2020). Diante desse cenário, os enfermeiros apresentaram desorientações, principalmente diante das constantes mudanças nos protocolos e nos fluxos, o que exigiu treinamento e capacitação desses profissionais:

Então, essa situação, acho que foi ainda mais estressante do que os pacientes. . . . Cada dia é um protocolo diferente, um fluxo diferente. Tu fazia de um jeito e não era daquele jeito. E era muito tenso (E2).

O que modificou foi essa novidade que era trabalhar com pacientes covid, . . . a gente precisava estudar coisas muito novas além da nossa realidade. Então a gente chegava em casa de noite e ainda tinha que permanecer estudando . . . Mas te digo que nem sempre era possível, porque às vezes, na rotina sobrecarregada, nem sempre dava (E4).

Ressalta-se que rotinas e protocolos bem estruturados no processo assistencial de uma equipe de Enfermagem contribuem para a segurança do paciente (Lima Gomes et al., 2019). No entanto, como os conhecimentos relativos à covid-19 eram incipientes e não estavam consolidados, a manutenção dos protocolos e, por conseguinte, do cuidado direcionado aos pacientes também sofreu impactos. Assim, os enfermeiros tiveram de estar em constante estudo, o que aumentou, conforme autorreferido pelos participantes da pesquisa, seu estresse e sua sobrecarga de trabalho, e, além do trabalho assistencial, eles tinham de estar se capacitando até mesmo fora do ambiente de trabalho. Dentro disso, salientam-se também algumas falhas no processo de capacitação e treinamento:

Treinamento ficou bem defasado . . . . Algumas coletas de PCR, fizeram uns vídeos in loco, não nos explicavam, sabe? (E2).

Tivemos vários treinamentos, até semanalmente ocorria uma live de capacitação . . ., mas isso demorou alguns meses para as coisas irem se organizando. . . . A cada semana era explorado um ponto específico, mas para gente que estava lá na prática as coisas aconteciam tudo junto . . . (E4).

Nota-se que, apesar de a gestão disponibilizar treinamentos e capacitações, essas apresentaram fragilidades, como a inexistência inicial de conhecimentos sobre a covid-19, ausência de instruções compreensíveis e impossibilidade de coincidir os treinamentos e capacitações com as demandas cotidianas de trabalho. Ainda, deve ser ressaltado que os enfermeiros que trabalhavam no PS estavam habituados a trabalhar com protocolos e fluxos referentes a tal unidade, e não com os de uma UTI Covid, o que demandou resiliência e adaptação de alguns profissionais. Por esse motivo, a construção da unidade e a qualificação profissional para a assistência ao paciente covid foram designadas pelos entrevistados como um dos principais desafios enfrentados durante a pandemia. Assim, até que houvesse contratações emergenciais, o dimensionamento de profissionais de Enfermagem não foi adequado, o que fomentou sobrecarga de trabalho e esgotamento dos profissionais: “Mas até chegar nesse dimensionamento adequado muitas vezes teve uma sobrecarga de atividade para conseguir dar conta. Esse ingresso dos outros profissionais foi bem gradual, não foi todos os profissionais vindo junto” (E4).

Entre os muitos desafios enfrentados pelos enfermeiros, destacam-se suas inadequações para a prática do cuidado aos pacientes, já que a qualidade da assistência depende diretamente dos envolvidos nesse processo (Lara et al., 2018). Dessa forma, o inadequado número de profissionais diante de situações de maior fluxo ou alta demanda pode sobrecarregá-los e, por conseguinte, suscitar omissões na assistência, medicações, na aferição de sinais vitais, entre outros procedimentos (Grison, 2020; Lima et al., 2020).

Soma-se a essa situação, o isolamento do Setor Covid, cujo intuito era evitar a propagação do vírus, mas também dificultava a saída dos profissionais de saúde, os quais não podiam, muitas vezes, suprir suas necessidades básicas:

A partir do momento que tu entrava no setor, tu não poderia sair para tomar uma água. E enfim, aquilo lá te causava uma apreensão muito grande . . . nem para ir ao banheiro . . . Pra ti poder sair da ala covid e para ir até a copa covid, tinha que se desparamentar todo, tirar toda aquela roupa, tirar as proprés, toca, tudo, tinha que trocar de máscara (E1).

Torna-se visível que, apesar de o isolamento e a paramentação serem estratégias de proteção para conter a transmissão e a propagação do vírus, tais táticas de controle também suscitavam desgastes para os enfermeiros, cujos impactos recaíram sobre sua própria saúde e também no cuidado direcionado ao paciente:

Para mim, o EPI, principalmente, no início, foi o pior assim. Era um trabalho muito desconfortável, cansativo, a gente ficava com calor e molhada de suor, com dificuldade de respirar. Eu que sou asmática, teve aquele período ali do inverno que era muito ruim tá ali com aquela máscara. Então, eu, fiquei com feridas pelo rosto, isso ali nos primeiros meses (E5).

A questão do calor que a roupa era muito quente, às vezes eu tinha que deixar algumas atividades de cuidado ir para uma outra área, por exemplo, tinha uma sala dentro da unidade covid que o ar-condicionado era muito bom (E4).

Destaca-se que, além da dificuldade de os enfermeiros saírem do setor durante o seu turno trabalhado, outros profissionais de saúde eram impedidos de adentrar na Unidade Covid, até certo período da pandemia. A situação parece ter desencadeado acúmulo de funções para os enfermeiros, como também perda da função e da identidade profissional:

Tanto que tinha que fazer, por diversas vezes fiz, assumi a assistência de técnico, eu era mais um técnico dentro do serviço, eu era o fisioterapeuta, eu era o nutricionista, eu era o psicólogo. . . . Então isso termina te sobrecarregando (E1).

Ao exercer múltiplas funções, os enfermeiros deixam de executar tarefas que são realmente específicas de sua profissão, ocasionando ações mecanicistas e desprovidas de perspectivas para o alcance da qualidade da assistência. Assim, a sobrecarga e os múltiplos vínculos empregatícios geram cansaço, falta de atenção, de empenho e insatisfação, cujos impactos recaem sobre o cuidado prestado ao paciente (Lara et al., 2018). Segundo estudo realizado por Alcântara et al. (2018), o desgaste psicoemocional, consistente na redução ou falta de energia relacionada ao sentimento de esgotamento emocional, vivenciado pelos profissionais de Enfermagem devido à intensidade da carga de trabalho, pode levar à rotinização da assistência manifestada pela frieza no cuidar.

Conforme as entrevistadas, uma das principais limitações do isolamento da unidade covid foi o acesso restrito de outros profissionais de saúde, uma vez que 5 categorias profissionais – Enfermagem, Medicina, Fisioterapia, pessoal da Higienização, Radiologia tinham acesso à unidade durante o auge da pandemia. Dessa forma, a equipe multiprofissional, responsável pelo cuidado integral direcionado aos pacientes, nem sempre esteve disponível para a assistência:

Eu acho que o cuidado integral pensando no cuidado biopsicossocial, que é o que a gente deve se preocupar junto aos pacientes, podem ter deixado passados, porque a minha visão enquanto enfermeira é diferente de outros colegas se poderiam ter acesso a esse paciente. . . . Mas naquele momento a clínica era mais mandatória e eu tinha uma responsabilidade bem grande perante isso. E aí eu acho que acabava ficando às vezes em segundo plano as questões mais psicológicas e sociais. Essas questões que permitiriam um cuidado integral do paciente (E4).

Em face do exposto, faz-se nítido que, em razão do isolamento da unidade covid, devido à alta transmissibilidade do vírus, a prioridade de assistência direcionada ao paciente tornou-se, em alguns momentos, restrita a suas esferas mais anátomo-fisiológicas, e, por consequência, fragmentou-se a possibilidade de outros âmbitos de cuidado ao paciente – psicológico, espiritual, social e familiar. A imprescindibilidade do cuidado integral se fundamenta em virtude de que, ao considerar o paciente enquanto sujeito ou pessoa na relação de cuidado, mantêm-se suas particularidades – histórias, saberes, singularidades, subjetividades, desejos, necessidades, contexto social e familiar (Gariglio, 2012).

Assim como o isolamento da unidade covid restringiu o acesso de várias categorias profissionais, esse limitou também a comunicação do paciente com sua família, com o intuito de minimizar o risco de propagação do vírus. Compreende-se que o processo de adoecimento é atravessado pelas particularidades, subjetividades e relações afetivas do paciente. Dessa forma, a presença de um acompanhante e a realização de visitas durante a internação, como de familiares, por exemplo, são fatores que favorecem o enfrentamento do paciente e de sua família perante a situação de hospitalização (Antonechen et al., 2020). Contudo, diante das limitações impostas pela pandemia, tornaram-se primordiais alternativas para manter o contato entre paciente e sua família:

Às vezes eles mandavam recadinhos e a gente entregava, mas os pacientes, eles pediam um papel e caneta para escrever. . . . Ver aquilo lá como se fosse uma despedida. Daí às vezes eu só mostrava para o acompanhante e ele não poderia nem tocar no papel, o papel estava todo contaminado (E1).

Tudo assim por videochamada. Do paciente com a família, do próprio médico com a família. Tinha um médico que centralizava mais os cuidados. Ele fazia sempre uma chamada com a família para informar sobre o estado do familiar (E5).

Alcântara et al. (2018) constatam a necessidade da troca de informações entre a equipe de saúde e o paciente, bem como com seus respectivos familiares. Conforme o autor e ­colaboradores, os profissionais de Enfermagem salientam a comunicação interpessoal como essencial para o cuidar, favorecendo o desenvolvimento de vínculo e confiança com o paciente e sua família, isto é, conhecer suas dificuldades, medos, anseios, expectativas e conhecimento sobre a patologia. Assim, a comunicação torna-se essencial no cuidado integral e humanizado, porque possibilita identificar e acolher, empaticamente, as necessidades dos pacientes e familiares.

A utilização de redes sociais digitais também foi utilizada para agilizar a comunicação entre os profissionais de saúde:

Bastante por WhatsApp. Também dentro da unidade tinha murais. Então quando precisar deixar recado, muitos recados ficavam nos murais . . . . As informações também que precisava, importantes ia passando de uma equipe para outra sempre nas passagens de plantão (E4).

Cabe enfatizar que a comunicação dos profissionais de Enfermagem entre si, bem como com os outros profissionais de saúde, é um fator que pode interferir na assistência ao paciente, uma vez que as discussões multidisciplinares enriquecem o plano de cuidados e o estabelecimento de metas para o tratamento (Dutra et al., 2019). Dentro disso, destacam-se os handover, isto é, passagem de plantão dos profissionais de Enfermagem – atividade clínica que envolve a transferência da informação, da responsabilidade e da competência pela tomada de decisões sobre a assistência ao paciente –, sendo, assim, um processo essencial para a condução das ações e para a continuidade da assistência ao paciente.

Contudo, no hospital em que a pesquisa foi realizada, os enfermeiros apontaram fatores que desencadearam ruídos e falhas na comunicação, impedindo que a mensagem chegasse ao receptor da maneira desejada pela fonte e afetando negativamente o cuidado realizado. Destacam-se: a impossibilidade de acompanhar mudanças de protocolos; a quantidade de informações; estresse e esgotamento profissional; conflitos entre a equipe e o distanciamento da equipe médica. Assim sendo, embora houvesse adaptações na comunicação entre os profissionais de saúde, essa continuou tendo brechas, o que pode ter interferido na qualidade da assistência ao paciente:

Só que o WhatsApp bomba de informações . . . Então muitas pessoas não viam. Não consigam acompanhar essas alterações. E isso acabava gerando então até um estresse (E4).

De conflitos, nós tivemos vários. Pela situação em que a sobrecarga levou a isso, o esgotamento. Acabava se estressando e às vezes projetando em teu colega (E1).

O que a gente teve foi um distanciamento ainda maior da equipe médica . . . porque eles raramente entravam na área covid. A comunicação era praticamente toda por telefone. Então, às vezes, a gente nem via a pessoa que tava no plantão (E5).

O Enfermeiro Diante da Morte: do Interdito ao Escancaramento

Outro desafio que se tornou notório neste estudo foi a questão acerca da morte e do morrer. Segundo os profissionais entrevistados, a evolução do paciente covid era súbita e instável, uma vez que, a partir de um quadro positivo, o paciente evoluía rapidamente para um prognóstico negativo. Dentro disso, ressalta-se que a instabilidade do paciente covid também desencadeava instabilidade dos próprios enfermeiros, que, perante a tal situação, no início da pandemia, não sabiam como manejar e assistir esse paciente:

A gravidade dos pacientes era uma gravidade bem maior do que qualquer outro paciente, porque a evolução era muito rápida . . . Pacientes que estavam bem e daqui a pouco passava alguns minutos e não estavam mais. Daí era uma correria (E2).

Desse modo, em virtude de a covid-19 ser uma doença até então com efeitos desconhecidos, o encontro com o imprevisível provocou, abruptamente, uma desordem subjetiva, que remeteu os profissionais de saúde à experiência de desamparo e impotência (Santos et al., 2020). Assim, os respectivos profissionais enfrentaram limites nos conhecimentos científicos e tecnológicos para assistir o paciente covid e, por conseguinte, estiveram diante da morte e do processo de morrer:

A morte para mim ainda se torna o maior desafio . . . Paciente saturando bem e de repente o paciente dá uma parada, morreu, tu não entende. Meu maior desafio é entender . . . tem coisas que eu não entendi da covid, que foi essa questão da morte (E1).

Conforme Kovács (2010), os profissionais de saúde escolheram sua área para lutar contra a morte, desde os que fazem isso criativamente, conhecendo seus limites, até os que sofrem ao se sentirem “derrotados” pela morte. Como consequência, quando ocorre a morte do paciente ou sua doença é incurável, o trabalho realizado pelo profissional de saúde torna-se sem sentido, o que acarreta sentimento de impotência diante da morte. A tomada de consciência da finitude do ser humano constitui-se em uma ferida aterrorizante, visto que, em relação à morte, nada se sabe. E, a partir do não saber, perde-se a capacidade de controle, ficando-se submisso ao desconhecido. Assim, para Santos et al. (2013), a morte e o morrer não são vivenciados pelos profissionais de saúde como um fenômeno natural, mas sim como um fracasso que é velado e silenciado.

Além do escancaramento da morte e do morrer, salienta-se que a morte também se apresentou de forma deslocada ao atingir pacientes jovens: “Já aconteceu de vários colegas se recusarem a atender, porque estavam chocados com aquela situação, estavam desanimados, porque eram pacientes jovens” (E6).

Embora a morte se apresente desde a infância até a idade mais senil, ela causa estranhamento quando acontece com pacientes jovens. Ao se tentar dominar e controlar a morte, a sociedade ocidental insiste em caráter acidental – acidentes, doenças, infecções, velhice etc. –, como se não fizesse parte da vida, o que faz com que a morte fique despojada do caráter de necessidade em termos do processo vital. Assim, quando ocorre com pacientes jovens, a morte é um traumatismo, uma vez que provoca a irrupção do seu real, sendo uma morte invertida (Kovács, 2010).

Ainda, ressalta-se que a internação na unidade covid de colegas de trabalho, como também a morte de familiares e de pessoas próximas, suscitou uma identificação dos enfermeiros com seus pacientes, trazendo, assim, a percepção da própria finitude:

. . . porque a gente estava ali eu sempre dizia assim “a gente estava numa guerra só que é uma guerra diferente, o tiro, ele existe, só que agora a arma era apontada pra nós”. Então as pessoas não aguentaram esse tipo de pressão. . . . E também da gente perceber que todo mundo é vulnerável. Não tem quem não seja. Vulnerável de nós ficarmos ­doente e da gente perder familiar (E3).

Dessa forma, fizeram-se notórios o desespero e o desamparo da equipe de enfermeiros perante a morte e o morrer, pois esses chegaram ao seu limite, tanto profissional – pela falta de conhecimentos científicos e tecnológicos – quanto humano – vulnerabilidade diante da morte. Segundo Castro et al. (2021), a rotina de plantões com pacientes acometidos com a covid-19 pode ser entendida como de uma guerra, situação semelhante à de Florence Nightingale – fundadora da Enfermagem Moderna que atuou na guerra da Criméia, em 1854
–, a diferença é que o inimigo dessa não pode ser visto nem tocado.

Para Freud (2020), em todas as guerras, instaura-se uma desilusão e uma modificação da perspectiva em relação à morte. Conforme o autor, a própria morte não é passível de representação, sendo que, inconscientemente, ninguém acredita em sua própria morte, isto é, há um convencimento do sujeito sobre sua imortalidade. Em consequência, vive-se como se essa não existisse, sendo ela morta com o seu silenciamento. No entanto, com o acúmulo de casos de morte – como em uma guerra ou uma pandemia –, torna-se insustentável a sua renegação, visto que o escancaramento da morte do outro acarreta, na perspectiva da própria finitude, o que desencadeia a sensação de angústia.

Ademais, o medo da infecção e da morte mostrou-se evidente em outros profissionais de saúde, os quais não trabalhavam na unidade, havendo até comportamentos de fuga: “Mas, por exemplo, nunca ninguém da administração, que eu saiba, entrou lá dentro. As pessoas não entravam lá dentro, as pessoas tinham pânico. . . . As pessoas que tocavam na campainha esperavam assim longe. Sabe, lá no fundo” (E3).

Em paralelo, compara-se tal situação com uma das noções freudianas de infamiliar, que seria algo do qual nada se sabe, algo que deveria permanecer em segredo e oculto, mas que veio à tona, trazendo consigo a angústia. Assim, o sujeito encontra-se em uma posição de desamparo, assumindo uma feição trágica, marcada pela finitude e pelo imprevisível, sem ter garantia absoluta alguma para se sustentar (Birman, 2020). À vista disso, a morte, que estava interdita pelos conhecimentos e tecnologias em saúde, foi escancarada na esfera social durante a pandemia da covid-19, evidenciando a vulnerabilidade do ser humano e a sua impotência diante dela, desencadeando medo e horror.

Trabalho na UTI Covid: Do Acúmulo de Funções ao Esgotamento Profissional

Diante dessa conjuntura – acúmulo de funções, insuficiência de profissionais e/ou de profissionais qualificados, isolamento da unidade, ausência de conhecimentos sobre a doença, mudanças constantes nos fluxos e protocolos, falhas na comunicação e escancaramento dos processos de morte e morrer – os enfermeiros referiram esgotamento profissional.

Porque nós só trabalhamos, trabalhamos muito por sinal, mais do que nós já trabalhamos. Mas, assim, realmente foi uma coisa que foi além do esperado. Extrapolou, extrapolou tudo. Tivemos muito a questão do estresse profissional, do esgotamento profissional e que ninguém foi ouvido . . . . Então te levava esgotamento tanto físico quanto mental” (E1).

Todo mundo teve um período da pandemia que chegou ao seu limite. Que já não aguentava mais. Era tanta demanda que ficava assustado ou com medo . . . Desgaste mental e psicológico intenso (E2).

Outros estudos apontaram para a presença de ansiedade, depressão e até síndrome de burnout entre os profissionais de Enfermagem que estavam na linha de frente do combate à covid-19 (Horta et al., 2021). Assim como dúvidas, apreensões, estresse, insegurança de como deveriam ser realizados os atendimentos, exaustão física e emocional, e medo de se infectar e transmitir a doença para pacientes, familiares e outros colegas de trabalho. Dessa maneira, houve profissionais que solicitaram afastamento por motivos psicológicos ou até mesmo pediram demissão da instituição onde trabalhavam (Reis et al., 2020).

Diante disso, faz-se nítido que a organização do trabalho durante a pandemia da covid-19 acarretou impactos na subjetividade dos profissionais de saúde que estavam na linha de frente no combate da doença. Para Mezan (2020), a subjetividade pode ser refletida a partir da condensação de várias determinações extraindividuais – processos biológicos, psíquicos, sociais, culturais etc. – que, combinados, engendram uma modalidade específica de organização subjetiva, ou seja, um molde para as experiências individuais. Ademais, de acordo com Mendes (2003), ao partir do pressuposto de que a identidade do trabalhador se constitui por meio da organização social e laboral, a conjuntura do trabalho soma-se a esses fatores, uma vez que essa se torna pertinente à manutenção da vida e significação de si. Assim, ao se observar as consequências do trabalho na vida e na saúde dos sujeitos, investiga-se também as suas condições do seu meio.

Na presente pesquisa, além de os profissionais relatarem estresse e esgotamento, alguns apresentaram sintomas semelhantes aos da síndrome de burnout. A síndrome de burnout pode ser considerada como uma resposta prolongada a estressores interpessoais crônicos no trabalho, caracterizando-se pela exaustão emocional, despersonalização e redução do sentimento de realização pessoal. Diante disso, demanda acompanhamento psicoterápico, farmacológico e intervenções tanto individuais – com os profissionais de saúde – quanto organizacionais – modificar o ambiente estressor –, no intuito de reduzir os níveis de estresse ocupacional (Perniciotti et al., 2020). Conforme eles, não houve atendimento psicológico disponibilizado para a equipe durante a pandemia: “A gente diretamente nenhum, nenhum atendimento assim direto relacionado à equipe ou disponibilizado para a equipe foi disponibilizado” (E4).

No entanto, após o término da coleta de dados, soube-se que o hospital disponibilizou atendimento psicológico on-line e presencial para seus trabalhadores. Possivelmente, os profissionais relataram que a gestão não disponibilizou atendimentos, pois não visualizaram os meios de divulgação, devido ao isolamento da Unidade Covid e pela própria sobrecarga de trabalho. À vista disso, é imprescindível que a gestão do serviço de saúde forneça e reforce o apoio psicológico para esses profissionais, no intuito de atenuar tais sentimentos de desgaste, melhorar a saúde dos profissionais e, por conseguinte, o cuidado prestado aos pacientes.

Considerações Finais

Ao ser um evento inesperado, a pandemia da covid-19 requereu mudanças na dinâmica e nos processos do ambiente hospitalar para poder dar conta da alta complexidade do paciente covid. Somam-se a isso, a sobrecarga de trabalho, acúmulo de funções e o esgotamento profissional, uma vez que os enfermeiros tiveram de assumir, em alguns momentos, o ­trabalho da equipe multiprofissional. Ainda, o isolamento da unidade também impediu o contato presencial do paciente com seus familiares, tendo de se realizar essa comunicação por meio da modalidade on-line. As falhas na comunicação entre as equipes de saúde também se mostraram como um dos desafios enfrentados pelos referentes profissionais. Enfatiza-se, também, que as limitações científicas e tecnológicas em relação à covid-19 se apresentaram como um desafio para os enfermeiros, pois, diante da evolução súbita do paciente, não sabiam como manejá-lo e assisti-lo, suscitando sentimentos de desamparo e impotência, principalmente, diante da morte do paciente.

À vista disso, torna-se evidente uma dicotomia na assistência e no cuidado de pacientes durante a pandemia da covid-19. Ao se isolar a Unidade Covid com o intuito de evitar a transmissão do vírus e garantir a segurança de outros pacientes e profissionais de saúde, impossibilitou-se o cuidado integral direcionado ao paciente, visto que foi impedida a entrada de outros profissionais também responsáveis pela assistência – como a equipe multidisciplinar – e da própria família do paciente. Dessa forma, a prioridade a um cuidado mais físico-biológico fez com que as outras instâncias do indivíduo – psicológica, espiritual, social e familiar – carecessem de atenção e cuidado.

Como limitações do estudo, realça-se a delimitação do grupo de participantes, somente enfermeiros, o que pode ter restringido as evidências dos desafios enfrentados no cuidado prestado a pacientes durante a pandemia da covid-19. Diante disso, torna-se imprescindível a realização de mais pesquisas com outros profissionais de Enfermagem – técnicos e auxiliares de Enfermagem – como também com outros profissionais da área da saúde que atuaram durante a pandemia da covid-19. Ainda, salientam-se limitações relativas ao cenário do estudo, visto que a maioria das entrevistas foi realizada na modalidade on-line e somente uma na modalidade presencial.

Por fim, compreende-se que a presente investigação proporcionou um espaço de escuta e acolhimento para os enfermeiros. Além disso, construiu subsídios para os profissionais de saúde e para a sociedade, por intermédio da compreensão e do entendimento de como uma pandemia, a exemplo da covid-19, pode impactar a assistência aos pacientes – a partir das limitações no trabalho dos profissionais de saúde e, por consequência, no cuidado direcionado ao paciente internado em um ambiente hospitalar. Em suma, este estudo promoveu reflexões que poderão servir para a construção de melhores condições para o trabalho da Enfermagem na busca por respostas às demandas de saúde da população e na promoção de um cuidado de qualidade.

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Recebido em: 30/09/2022

Última revisão:19/09/2023

Aceite final:13/10/2023

Sobre os autores:

Leonardo Soares Trentin: Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Graduado em Psicologia pela UFSM. Psicólogo. E-mail: leonardo_trentin@outlook.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0355-5864

Alberto Manuel Quintana: Doutor em Ciências Sociais, com área de concentração em Antropologia Clínica, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP). Professor Titular Aposentado do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Departamento de Psicologia, Santa Maria, RS. E-mail: albertom.quintana@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7356-6142

Silvana Bastos Cogo: Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Professora adjunta do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Departamento de Enfermagem, Santa Maria, RS. E-mail: silvana.cogo@ufsm.br, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1686-8459

Félix Miguel Nascimento Guazina: Doutor em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Docente da Universidade Franciscana (UFN) e coordenador da Residência Multiprofissional de Saúde Mental da UFN, Santa Maria, RS. E-mail: guazina@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1683-2317

Adaiane Amélia Baccin: Doutoranda em Psicologia na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Psicóloga Organizacional do Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM-EBSERH-UFSM), Santa Maria, RS. E-mail: adaiane.baccin@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5757-7957


1 Endereço de contato: Av. Roraima, 1000, Cidade Universitária, Bairro Camobi, Santa Maria, RS, Brasil. CEP: 97105-900. Telefone: (55) 3220-8000.

doi: http://dx.doi.org/10.20435/pssa.v15i1.2184