Avaliação da Eficácia de um Plantão Psicológico em um Serviço-Escola

Evaluation of the Efficacy of a Walk-In Counseling Service Provided in a University

Evaluación de la Eficacia de una Guardia Psicológica en un Servicio-Escuela

Amanda Muglia Wechsler1

Pontifícia Universidade Católica de Campinas

Resumo

O Plantão Psicológico é uma modalidade de atendimento psicológico emergencial que visa ao acolhimento da angústia e ao esclarecimento da demanda dos/as usuários/as, porém são poucas as publicações que se propõem a medir a eficácia deste formato. Portanto, o objetivo da presente pesquisa foi avaliar quantitativamente a eficácia de um Plantão Psicológico por meio do ponto de vista de seus/suas usuários/as, além de verificar a associação de variáveis sociodemográficas com variáveis indicativas de satisfação dos participantes. Participou deste estudo uma amostra por conveniência de cinquenta e sete indivíduos a partir de 14 anos de idade, que procurou espontaneamente o Plantão Psicológico em um Serviço-Escola no interior do estado de São Paulo, durante um ano letivo. Após o atendimento recebido, os participantes preencheram um questionário de satisfação ad hoc. Os resultados mostraram que a maioria dos/das usuários/as (98,25%) declarou-se satisfeita com o atendimento recebido, relatando sentir-se acolhida e compreendida/aliviada (média de notas de 9,7 e 9,4, respectivamente). No entanto, os que apresentavam queixas psicopatológicas tenderam a sentir-se menos satisfeitos com o atendimento. Conclui-se que o Plantão Psicológico, mesmo com um número reduzido de encontros, apresentou alta eficácia, podendo se constituir como uma importante estratégia de promoção de saúde.

Palavras-chave: Plantão Psicológico, Clínica Ampliada, Eficácia

Abstract

Walk-in Counseling Service is an emergency psychological care aimed at attentive and empathic listening to an individual’s distress and clarifying his/her demand. Nevertheless, there is a scarcity of publications that measure the efficacy of this format. Therefore, the aim of the present research was to evaluate quantitatively the efficacy a Walk-In Service through the point-of-view of its users. In addition, we verified associations of sociodemographic variables with variables that indicated participants’ satisfaction. A convenience sample of fifty-seven individuals from the age of 14 participated in this study, who spontaneously sought the Walk-In Service located in São Paulo state (Brazil), during a school year. They filled-in an ad hoc satisfaction questionnaire after receiving psychological care. The results showed that the majority of users (98.25%) declared themselves satisfied with the care received, reporting feeling welcomed and understood/relieved (mean grades of 9.7 and 9.4, respectively). However, those with psychopathological complaints tended to feel less satisfied with the care provided. Conclusions highlight the efficacy of this model, even with a reduced number of meetings, which may constitute an important health promotion strategy.

Keywords: Walk-In Clinic, Contextualized Clinic, Efficacy

Resumen

La Guardia Psicológica es una modalidad de atención psicológica para emergencias que tiene como objetivo acoger la angustia y aclarar la demanda del/de la usuario/a. Sin embargo, son escasas las publicaciones que se propongan a medir la eficacia de este formato. Por lo tanto, el objetivo de la presente investigación fue evaluar cuantitativamente la eficacia de una Guardia Psicológica a través del punto de vista de sus/suyas usuarios/as, además de averiguar la asociación de variables sociodemográficas con variables indicativas de satisfacción de los/las participantes. Ha participado de este estudio una muestra por conveniencia de cincuenta y siete individuos a partir de los 14 años de edad, que ha buscado espontáneamente la Guardia Psicológica de un Servicio-Escuela en el interior de la provincia de São Paulo, durante un año escolar. Después de la asistencia recibida, los/las participantes rellenaron un cuestionario de satisfacción ad hoc. Los resultados mostraron que la mayoría de los/las usuarios/as (98,25%) se ha declarado satisfecha con la atención recibida, reportando sentirse acogida y comprendida/aliviada (media de calificaciones de 9,7 y 9,4, respectivamente). No obstante, los/las que presentaban demandas psicopatológicas tendieron a sentirse menos satisfechos con la atención recibida. Se puede concluir sobre la alta eficacia de la Guardia Psicológica, aunque tenga un número reducido de encuentros, constituyéndose como una importante estrategia de promoción de salud.

Palabras clave: Guardia Psicológica, Clínica Amplia, Eficacia

Introdução

O Plantão Psicológico é uma modalidade de atendimento psicológico de urgência, que se estende por uma ou várias sessões, sem tempo determinado e nem agendamento prévio, cujo foco está na demanda imediata e espontânea do/a usuário/a (Mendes, & Naves, 2021; Moreira et al., 2022). Neste sentido, o Plantão visa ao acolhimento da angústia e ao esclarecimento da demanda do/da usuário/a e pode ser entendido como um espaço de escuta diferenciado, visto que não se adapta às formas tradicionais das práticas clínicas em instituições (Rocha, 2009).

O Plantão Psicológico está baseado em uma concepção de Clínica Ampliada, de acordo com as diretrizes da Política Nacional de Humanização do Sistema Único de Saúde (Ministério da Saúde, 2013). Sua proposta é de uma prática contextualizada e de um olhar holístico para a saúde, favorecendo uma postura de autonomia do/da usuário/a diante de sua demanda e atuando, principalmente, na prevenção e promoção de saúde (Conselho Federal de Psicologia, 2019; Moreira et al., 2022). Deste modo, a tarefa do psicólogo é auxiliar os indivíduos a se transformarem, fazendo com que, apesar de terem (ou não) algum transtorno, este não se torne limitante de uma boa qualidade de vida (Tassinari & Durange, 2011).

Assim, diante da noção de Clínica Ampliada e contemporânea, o Plantão Psicológico visa promover uma escuta qualificada e um acolhimento, compreendendo o sofrimento a partir de relações sociais contextualizadas, possibilitando ressignificações de experiências (Macêdo et al., 2021). Neste cenário, o psicólogo deve ter um posicionamento ético e político diante do sofrimento de outro, e não guiar sua atuação meramente em torno de uma técnica, escutando o/a usuário/a e acolhendo-o/a, compreendendo os significados que ele/ela atribui ao mundo por meio da consideração do seu contexto social (Rebouças & Dutra, 2010). Deste modo, este tipo de serviço tem como objetivo o acolhimento psicológico de demandas plurais e diversas, incluindo não somente a queixa em si, mas os significados atribuídos pelo usuário/a à sua problemática, os seus modos de enfrentamento e a sua rede social de apoio (Rocha, 2009).

Portanto, o Plantão Psicológico visa ao acolhimento do indivíduo em momentos angustiantes, de forma que ele elabore melhor a sua realidade e encontre estratégias de enfrentamento para a problemática que enfrenta (Mahfoud, 1999). Este modelo de atendimento visa amenizar entraves ao engajamento à psicoterapia, tais como aguardar numa longa fila de espera e/ou submeter-se às entrevistas de triagem (Tassinari & Durange, 2011).

No entanto, apesar do formato brasileiro de Plantão Psicológico ter se originado no Serviço de Aconselhamento Psicológico da Universidade de São Paulo (USP), ainda são poucas as faculdades e universidades brasileiras que oferecem este tipo de atendimento à população (Rebouças & Dutra, 2010). As publicações científicas sobre o tema são escassas e, predominantemente, têm o enfoque de abordagens humanistas, principalmente devido ao surgimento deste formato de atendimento ter se derivado da prática de aconselhamento criada por Rogers (Moreira et al., 2022; Ortolan & Sei, 2019; Silva et al., 2020). Por outro lado, entende-se que uma atitude acolhedora e empática não deveria estar circunscrita a uma determinada corrente teórica. Considera-se tal atitude, inclusive, como fundamental para a formação de uma boa relação terapêutica e, consequentemente, para atingir alto grau de eficácia de intervenções psicoterapêuticas em diferentes abordagens teóricas, de acordo com o preconizado pela Divisão 29 da Associação Americana de Psicologia (APA) (Norcross & Hill, 2004). Assim, faz-se também importante compreender como outras propostas teóricas têm utilizado o modelo de Plantão Psicológico e os resultados obtidos.

Portanto, sabe-se muito pouco sobre os formatos utilizados, demandas mais presentes e possíveis articulações com a rede pública de saúde e de assistência social. Também se observa a escassez de publicações brasileiras que visem medir a eficácia desta proposta de forma quantitativa, assim como de estudos que tentem compreender o perfil de usuário/a que melhor se beneficie deste formato.

Entre as poucas publicações brasileiras disponíveis, dois estudos se propuseram a avaliar qualitativamente o serviço ofertado por Clínicas-Escola e observaram processos positivos de ressignificação das queixas e de satisfação com o atendimento recebido (Ortolan & Sei, 2019; Pan et al., 2015). Já pesquisas internacionais e revisões de literatura mostraram resultados quantitativos, tais como uma redução significativa da quantidade e severidade de sintomas psiquiátricos e uma maior satisfação com o serviço de Plantão Psicológico, ganhos estes mantidos no follow-up (Harper-Jacques & Foucalt, 2014; Hymmen et al., 2013) e superiores, inclusive, quando comparados aos de usuários/as de psicoterapia tradicional (Barwick et al., 2013; Riemer et al., 2018).

Assim, uma avaliação quantitativa no contexto brasileiro é necessária, de modo a ampliar o conhecimento sobre o cumprimento de objetivos do serviço de Plantão Psicológico, visando aumentar a sua eficácia e adequabilidade às demandas reais da população atendida (Ortolan & Sei, 2019). Como avaliação de eficácia, entende-se a mensuração do grau de sucesso de um determinado programa para atingir seus resultados (APA, 2023a). Deste modo, um tratamento psicológico altamente eficaz deveria melhorar os sintomas e aumentar a capacidade funcional do indivíduo, ser um programa de baixo risco de dano à saúde, fazer uso razoável de recursos e ser eficaz também fora de ambientes controlados de pesquisa, de acordo com a divisão 12 da Associação Americana de Psicologia (APA, 2023b).

Particularmente em relação ao Plantão Psicológico, seus resultados deveriam, para alguns autores, incluir a diminuição da ansiedade e da angústia do/da usuário/a, possibilitar que ele/ela se sinta compreendido, promover estratégias de enfrentamento, aumentar a esperança e/ou possibilitar que ele/ela vislumbre novas perspectivas sobre a sua problemática, apresentando uma maior compreensão acerca de si e de sua situação (Breschigliari & Jafelice, 2015; Slive & Bobele, 2012). Neste sentido, os desdobramentos do Plantão, como o fato de o/a usuário/a buscar psicoterapia ou retornar para outros atendimentos de Plantão, não são condições para a eficácia deste modelo, diferentemente do que ocorre com formatos de psicoterapias breves (Monteiro & Bezerra, 2020).

Além disso, evidências apontam para um efeito desse tipo de atendimento na saúde geral do indivíduo, em todo o seu curso de desenvolvimento e, consequentemente, na rede de saúde. Indivíduos que recebem atenção psicológica fazem menos uso de medicação, apresentam menos problemas incapacitantes, têm menos morbidade e mortalidade e fazem menos uso de serviços de saúde (APA, 2020). Ademais, este modelo tem se mostrado mais eficaz para aliviar o estresse atual do que modelos tradicionais que envolvem listas de espera (Riemer et al., 2018). Neste sentido, o formato desse tipo de atendimento parece estar em consonância com a concepção contemporânea de tratamentos transdiagnósticos, que não se orientam a psicopatologias específicas e podem ser aplicados a indivíduos com comorbidades ou àqueles cujos sintomas não se enquadram em nenhuma categoria dos manuais classificatórios, almejando mais os mecanismos centrais que produzem sofrimento psicológico do que os sintomas em si (Carlucci et al., 2021). Assim, apesar de possuir uma pequena quantidade de encontros, ou um único encontro, o Plantão seria, muitas vezes, suficiente para que a pessoa possa iniciar um processo de organização interna e prosseguir sem ajuda psicológica (Souza & Souza, 2011).

Portanto, o objetivo do presente artigo foi avaliar quantitativamente a eficácia do Plantão Psicológico para a população atendida, utilizando como critérios de eficácia o atingimento dos objetivos deste formato (diminuição da ansiedade, sentimento de ser compreendido, promoção de estratégias de enfrentamento, aumento de esperança e/ou maior compreensão acerca de si e de sua situação) por meio do ponto de vista de seus/suas usuários/as. Pesquisas de satisfação dos/das usuários/as sobre propostas psicoterapêuticas são comuns na área e costumam ser um método escolhido devido à captação da experiência dos/das participantes (Nathan et al., 2000; Souza & Souza, 2011). Além disto, para aprofundar a avaliação sobre a eficácia deste formato, o presente estudo visou verificar a associação de variáveis sociodemográficas com variáveis indicativas de satisfação dos/das participantes, de modo a compreender que tipos de usuários/as mais se beneficiam deste tipo de atendimento, assim como proposto por Riemer et al. (2018).

Método

Participantes

Foram convidadas a participar do estudo setenta e cinco pessoas que foram atendidas no período de um ano no Serviço-Escola de um Centro Universitário do interior do estado de São Paulo. No entanto, dezoito não participaram deste estudo, seja porque o questionário não lhes foi oferecido pelo/a estagiário/a, seja porque o/a usuário/a não quis preenchê-lo. Portanto, a presente pesquisa está composta de uma amostra por conveniência de cinquenta e sete indivíduos a partir de 14 anos de idade, que participaram do Plantão Psicológico no período citado e que aceitaram preencher o instrumento de avaliação proposto. Destes, nove frequentaram o Plantão em mais de uma ocasião.

Instrumento

Por entender que a avaliação da eficácia do Plantão Psicológico depende da avaliação subjetiva dos/das usuários/as e de como eles/elas se sentiram acolhidos em suas necessidades, e não pela resolubilidade do problema (Souza & Souza, 2011), foi elaborado pela autora desta pesquisa um questionário de satisfação que contemplava os principais objetivos a serem atendidos pelo Plantão e as medidas de eficácia propostas na literatura (Breschigliari & Jafelice, 2015; Nathan et al., 2000). Assim, apesar dos dados coletados serem não-objetivos, foi possível medi-los quantitativamente por meio de um questionário, visto que medidas ­objetivas conseguem capturar experiências subjetivas com razoável precisão, como defendido e demonstrado por diversos autores (McFall & Townsend, 1998; Oswald & Wu, 2009).

O questionário compôs-se de 10 itens. Quatro deles eram dicotômicos, em que o usuário respondia sim ou não em relação às seguintes questões: “Você ficou satisfeito/a com o atendimento recebido?”; “Você considera que o Plantão foi útil para o que buscava?”; “Você retornaria para uma nova sessão de Plantão?”; “Você recomendaria o Plantão a um/uma conhecido/a?”.

Os outros seis itens do questionário estavam dispostos numa escala likert, em que se solicitava que o/a usuário/a desse uma nota de 0 a 10 para as seguintes características do Plantão, de forma a medir o cumprimento de seus objetivos: acesso fácil; ter terapeutas à disposição; possibilidade de resolução de seus problemas; sentir que alguém lhe entende; sentir-se mais aliviado; e pensar sobre os seus problemas de uma forma diferente. Também houve coleta de dados sociodemográficos dos/das usuários/as neste questionário (sexo, idade, escolaridade e estado civil), da queixa apresentada na primeira sessão e do encaminhamento dado ao caso (preenchidos pelo/a estagiário/a responsável pelo caso em outro formulário).

Procedimento

Após aprovação do Comitê de Ética para Pesquisa (CAAE 49994321.6.0000.0123 na Plataforma Brasil), estruturou-se o formato do Plantão Psicológico. Este serviço foi oferecido em cinco dias da semana, durante 1 ano letivo, com duração máxima de cada sessão de 2 horas e limite de 4 atendimentos por usuário/a, sendo permitidos/as usuários/as acima de 14 anos de idade. O Plantão foi divulgado nos principais meios de comunicação da cidade (jornal, rádio e mídias sociais), além de ter uma divulgação dentro do próprio Serviço-Escola.

Os atendimentos decorreram, então, de procura espontânea e sem agendamento prévio. Os/As estagiários/as do último ano de Psicologia se revezaram em turno inverso ao de aula, de forma que todos/as os/as alunos/as pudessem ter a experiência de ter passado por um Plantão. Cada aluno/a poderia atender em uma das principais abordagens teóricas da Instituição (Psicanálise, Análise do Comportamento ou Gestalt-Terapia), de acordo com a sua preferência. No entanto, apesar da diversidade de referenciais teóricos adotados, em todos os atendimentos a conduta central dos estagiários se pautou em favorecer uma escuta clínica e acolhedora, visto ser este o principal objetivo do Plantão Psicológico (Rebouças & Dutra, 2010; Rocha, 2009). Assim, não houve a utilização de técnicas específicas das abordagens psicológicas, priorizando-se muito mais uma postura ética e acolhedora, dado que estas atitudes constituem o principal fator para obter alto grau de eficácia em intervenções psicoterapêuticas, segundo a Divisão 29 da APA (Norcross & Hill, 2004). Ademais, a ausência de um protocolo psicoterapêutico padronizado é justamente o que permite abarcar múltiplas demandas, dado o olhar contextualizado deste formato (Braga et al., 2019).

Após cada atendimento, o/a estagiário/a acompanhava o/a usuário/a até a recepção e lhe explicava sobre o questionário de satisfação. Os/As usuários/as que aceitassem respondê-lo ficavam, então, sós na sala de espera, a fim de preencher o instrumento de modo mais fidedigno aos seus sentimentos em relação ao atendimento recebido. Ao final do preenchimento, deixavam o questionário em uma caixa que se localizava na recepção, aberta somente pelos pesquisadores. Os/As usuários/as também assinavam um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, no qual autorizavam a divulgação dos resultados do instrumento preenchido em futuras publicações científicas. Com os/as usuários/as menores de idade, houve a assinatura dos pais ou responsáveis do Termo de Consentimento. Logo após a saída do/da usuário/a, o/a estagiário/a preenchia em uma ficha separada a queixa principal manifestada durante a sessão e o encaminhamento dado (ou não) ao caso.

Em situações mais graves e/ou urgentes (psicopatológicas e/ou que representassem risco de vida à/ao usuário/a ou a outras pessoas), os/as alunos/as recebiam supervisão imediata do responsável técnico pelo Serviço-Escola. Nos demais casos, o atendimento era supervisionado posteriormente pelos professores responsáveis pela disciplina eletiva “Plantão Psicológico”, oferecida ao 9º semestre do curso de Psicologia. Tal forma de estruturação do serviço ocorreu em função de outras experiências relatadas na literatura (Breschigliari & Jafelice, 2015; Mendes & Naves, 2021).

Análise dos Dados

Os dados foram analisados quantitativamente. Primeiramente, utilizou-se uma análise descritiva por meio de tabelas de frequência. Testou-se a normalidade dos dados através do teste de Shapiro-Wilk. Para avaliar a relação entre as variáveis de satisfação com o Plantão Psicológico e as variáveis demográficas, foram realizadas correlações de Pearson (com transformação binária para as variáveis categóricas). Todas as análises foram elaboradas com o software SPSS versão 21, utilizando como critério de significância α=0,05.

Resultados

A maioria dos/das participantes era do sexo feminino (68,9%), não possuía companheiro/a (solteiros/as, divorciados/as ou viúvos/as) (73,2%) e tinha escolaridade de nível fundamental ou médio (76,4%). A idade média da amostra foi de 31,34 anos (DP=15,07). As queixas mais frequentes (41,66%) estavam relacionadas a sentimentos de ansiedade (de modo geral, ansiedade no contexto acadêmico), seguidas de queixas de problemas familiares e conjugais (25%), sendo estas últimas principalmente relacionadas à presença de conflitos verbais e à falta de acolhimento e aceitação de familiares e/ou cônjuges.

Uma outra queixa frequente (16,67% dos casos atendidos) se referiu à depressão, tristeza e/ou ao luto (lutos tanto por morte quanto por término de relacionamentos). Outras queixas diversas apareceram (16,67%), como o uso de substâncias pelo/a usuário/a ou por familiares, transtornos alimentares (compulsão alimentar e bulimia), sofrimentos relacionados a impactos de deficiências físicas e delírios e alucinações.

A maioria dos/das participantes (52,2%) não necessitou de encaminhamento para acompanhamento psicológico e/ou médico após frequentar o Plantão Psicológico. Já 34,8% foram encaminhados para o próprio serviço da Clínica-Escola; 10,1% foram encaminhados para psiquiatras ou Centros de Atenção Psicossocial (CAPS); e 2,9% foram encaminhados para fisioterapeutas e/ou nutricionistas.

Observou-se alto grau de satisfação dos/das usuários/as do Plantão Psicológico: 98,25% dos/das participantes declararam sentir-se satisfeitos/as com o atendimento recebido e 96,49% consideraram que o Plantão foi útil ao que estavam buscando e que voltariam para uma nova sessão futuramente. Dos que comentaram o motivo do retorno, a principal razão alegada foi que o serviço de Plantão Psicológico lhes ajudou a sentirem-se melhor e/ou a sentirem-se ajudados (41,9%); 19,3% disseram que voltariam porque tiveram uma nova perspectiva sobre seus problemas; 12,9% manifestaram desejo de voltar porque desabafaram; 9,7% comentaram que voltariam porque foram bem atendidos/as; 6,4% disseram que voltariam porque precisavam de ajuda; e 9,7% justificaram um possível retorno porque não precisariam de agendamento, uma vez que precisavam ser mais bem avaliados/as ou porque gostariam de ter novas orientações.

Ainda, 100% dos/das participantes disseram que recomendariam o Plantão Psicológico a um/uma conhecido/a. Os principais motivos para tal recomendação foram: para que eles/elas obtivessem alívio ou ajuda para seus problemas (31,4%) e porque o serviço oferecido pela instituição era de qualidade (22,8%).

Foi solicitado aos/às participantes que dessem uma nota de zero a dez ao cumprimento dos objetivos ao que o Plantão Psicológico se propunha. Os/As participantes deram uma nota média de 9,9 para a acessibilidade, 9,9 para a disponibilidade de psicoterapeutas, 9,4 para a possibilidade de resolução de problemas, 9,7 para sentir-se compreendido e 9,4 para sentir-se aliviado/a e para ressignificação dos problemas.

Para compreender os tipos de usuários/as que mais se beneficiaram do Plantão Psicológico, correlacionaram-se as variáveis sociodemográficas, as demandas dos/das usuários/as e o encaminhamento dado aos casos com as respostas relacionadas ao cumprimento dos objetivos do Plantão Psicológico, como pode ser visto na Tabela 1. Observa-se uma relação estatisticamente significativa entre a escolaridade dos/das usuários/as e a queixa, de tal forma que quanto menor a escolaridade, maior a gravidade da queixa – considerando-se como “grave” demandas psicopatológicas (ex.: ideação suicida, sintomatologia psicótica, transtornos alimentares, depressão etc.). Também se pode verificar que os/as usuários/as que não possuíam companheiros/as (solteiros/as, divorciados/as ou viúvos/as) tenderam a ser aqueles que receberam algum tipo de encaminhamento após a(s) sessão(ões) de Plantão.

Foi constatado, ainda, que os/as usuários/as que não receberam nenhum encaminhamento após o Plantão tenderam a avaliar melhor o serviço (dar notas mais altas) no que se refere à possibilidade de resolução de problemas e de sentir-se compreendido/a. Por outro lado, não se observam correlações estatisticamente significativas entre diagnósticos mais graves e notas sobre o atingimento dos objetivos do Plantão.

Tabela 1

Correlações entre Variáveis Sociodemográficas, Queixas dos/das Usuários/as e Encaminhamentos de Dados aos Casos com as Notas Dadas pelos/as Usuários/as relativas ao Cumprimento dos Objetivos do Plantão Psicológico

Variáveis

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

11

12

1. Sexo

---

2. Idade

,14

---

3. Est. civ.

-,09

,23

---

4. Escol.

-,11

,58**

-,01

---

5. Queixa

,22

,11

-,15

-,41**

---

6. Encam.

,14

-,07

-,37**

,21

,19

---

7. Acesso

-,17

,03

,18

,06

-,13

-,24

---

8. Dispos.

-,17

,12

,11

-,10

,09

-,08

,78**

---

9. Resol.

-,15

,17

,05

,17

-,13

-,33*

,16

,17

10. Ented.

-,20

,13

,11

-,10

-,07

-,35*

,29*

,27*

,83**

---

11. Alívio

-,09

,20

,21

,04

-,09

-,23

,49**

,49**

,57**

,61**

---

12. Pens.

,16

,16

,14

,13

-,09

-,14

-,03

-,07

,56**

,55**

,78**

---

Nota: Est. civ.= estado civil (com companheiro vs. sem companheiro); Escol.= escolaridade. (nível fundamental/médio vs. nível superior); Queixa = queixa trazida pelo/a usuário/a na primeira sessão (com maior gravidade vs. com menor gravidade); Encam.= encaminhamento realizado após a sessão de Plantão Psicológico (sim/não); Acesso = nota dada para o acesso fácil ao Plantão; Dispos. = nota dada para o fato de ter terapeutas à disposição; Resol. = nota dada para ter a possibilidade de resolver os problemas; Entend. = nota dada para o sentimento de ter alguém que lhe entende; Alívio = nota dada para o sentir-se mais aliviado; Pens. = nota dada para ter pensado sobre os problemas de uma forma diferente.

* p<0,05; **p<0,001

A Tabela 2 mostra as correlações entre as variáveis sociodemográficas, as demandas dos/das usuários/as e o encaminhamento dado aos casos com as respostas referentes à satisfação e utilidade do Plantão Psicológico. Pode-se verificar uma relação estatisticamente significativa entre o sexo e a manifestação de que retornaria ao plantão novamente, havendo maior tendência de mulheres retornarem ao Plantão Psicológico. Usuários/as que apresentavam queixas mais graves tenderam a mostrar-se menos satisfeitos/as com o atendimento recebido no Plantão. Aqueles/as que consideraram o Plantão útil tendiam a ser os/as que estavam mais satisfeitos/as e os/as que manifestaram desejo de retornar para uma nova sessão.

Tabela 2

Correlações entre Variáveis Sociodemográficas, Queixas Apresentadas e Encaminhamentos Dados aos Casos com Questões Respondidas pelos/as Usuários/as Relativas à Satisfação, Percepção de Utilidade do Atendimento Recebido e Possibilidade de um Futuro Retorno ao Plantão

Variáveis

1

2

3

4

5

6

7

8

9

1. Sexo

---

2. Idade

,14

---

3. Estado civil

-,09

,23

---

4. Escolaridade

-,11

,58**

-,01

---

5. Queixa

,22

,11

-,15

-,41**

---

6. Encaminhamento

,14

-,07

-,37**

,21

,19

---

7. Satisfação

,08

-,02

,08

,23

-,31*

---

8. Utilidade

-,10

,03

,12

,10

-,17

-,21

,70*

---

9. Retorno

-,32*

-,06

,11

-,11

,09

-,21

-,02

,48**

---

Nota: Estado civil = com companheiro vs. sem companheiro; Escolaridade = nível fundamental/médio vs. nível superior; Queixa = queixa trazida pelo/a usuário/a na primeira sessão (com maior gravidade vs. com menor gravidade); Encam. = encaminhamento realizado após a sessão de Plantão Psicológico (sim/não); Satisfação = usuário/a ficou satisfeito com o atendimento recebido; Utilidade = usuário/a considera que o Plantão foi útil para o que estava buscando; Retorno = usuário/a considera que voltaria para uma nova sessão de Plantão Psicológico.

* p<0,05; **p<0,001

Discussão

O presente artigo teve como objetivo avaliar a eficácia de um modelo de Plantão Psicológico ofertado em um Serviço-Escola a partir da consideração de seus/suas usuários/as. Este estudo é inovador no Brasil, ao propor a avaliação quantitativa da eficácia de um formato de Plantão Psicológico. Dada como critério de eficácia a mensuração de resultados, obtidos por meio do relato dos/das usuários/as, observaram-se mudanças positivas nos sintomas descritos pelos participantes e/ou em seu autoconhecimento, de acordo com as medidas de eficácia propostas pela APA (2023b) e por Nathan et al. (2000).

Neste sentido, observou-se que o Plantão ofertado atingiu seus objetivos, visto que a maioria dos/das usuários/as relatou sentir-se acolhida, compreendida e aliviada, em consonância com o desfecho previsto por Breschigliari e Jafelice (2015), Mahfoud (1999) e Rocha (2009). Ademais, os dados mostraram alto grau de satisfação dos/das participantes com o serviço recebido, assim como relatado pela literatura (Harper-Jacques & Foucalt, 2014; Ortolan & Sei, 2019; Pan et al., 2015; Read et al., 2016). Deste modo, pode-se concluir que o serviço ofertado foi eficaz para seus/suas usuários/as, visto que eles/elas declararam que conseguiram resolver e/ou ressignificar seus problemas.

No entanto, esta satisfação declarada pelos/as participantes, tanto com o serviço recebido quanto com o formato oferecido, pode ter sido enviesada devido à forma de coleta de dados (imediatamente após o atendimento, o questionário respondido dentro do serviço e entregue por quem atendeu o/a usuário/a) ou à ordem das perguntas contidas no questionário. É possível que haja um efeito de viés de resposta, em que os/as participantes tenham respondido aquilo que acreditam que o serviço espera, uma limitação comum no uso de questionários (Filippo et al., 2011). Além disso, Oliveira (2017) aponta que é comum a tendência de usuários/as do Sistema Único de Saúde apresentarem gratidão pelos atendimentos recebidos e tenderem a avaliá-los positivamente, o que também pode ter acontecido no caso da presente pesquisa. Contudo, tais limitações não invalidam os resultados encontrados, que devem ser confirmados por pesquisas posteriores.

Em contrapartida, observou-se que usuários/as que apresentavam queixas mais graves (psicopatológicas) tenderam a sentir-se menos satisfeitos/as com o atendimento recebido. Este não é um problema exclusivo do Plantão Psicológico, visto que outros estudos mostram que pacientes com problemas mais severos respondem pior tanto a intervenções de curto quanto de longo prazo (McAleavey et al., 2019). Ainda, é importante salientar que a severidade da condição do/a usuário/a (cronicidade, complexidade e intensidade), somada a fatores contextuais e do/da psicoterapeuta, tende a influenciar mais os resultados da intervenção psicológica do que o diagnóstico em si (APA, 2020; Nathan et al., 2000).

Por outro lado, os/as usuários/as que possuíam demandas psicopatológicas não avaliaram pior o atendimento recebido em relação ao cumprimento dos seus objetivos. Mesmo que tenha havido um viés de resposta, no sentido de esses/as pacientes terem avaliado o Plantão de forma positiva por ser um serviço gratuito ou pela relação estabelecida com o/a terapeuta, o mesmo viés também se aplicaria aos/às pacientes com queixas menos graves. Ademais, pelo fato de o Plantão ser uma prática não patologizante, valorizando mais a experiência do que os sintomas, a satisfação relatada pelos/as usuários/as e a sua avaliação sobre os benefícios percebidos neste formato parecem ser medidas mais úteis aos objetivos do formato de Plantão Psicológico do que a sintomatologia isoladamente (Moreira et al., 2022).

Contudo, os/as usuários/as com menor escolaridade tendiam a ser os que possuíam queixas mais graves, e os que não tinham companheiros/as receberam mais encaminhamentos. Devido ao fato de a baixa escolaridade e o estado civil sem parceiro serem determinantes de pior saúde física e mental (Buckman et al., 2021; Lund et al., 2018), e de que a escolaridade está altamente relacionada à renda (Barros, 2017), entende-se que a população em maior vulnerabilidade social era a que apresentava pior saúde mental e, portanto, mereceria intervenções mais específicas, prolongadas e interdisciplinares, de modo a abranger todo o seu contexto socioeconômico e cultural, tais como psicoterapias de médio e longo prazo, ou ainda por serviços especializados, como os CAPS.

Os resultados também demonstraram uma maior tendência de mulheres retornarem ao Plantão Psicológico. Entretanto, a amostra do estudo está majoritariamente constituída pelo sexo feminino, o que torna tal associação enviesada. Observa-se panorama parecido no sistema de saúde brasileiro de modo geral, em que mulheres são as que mais procuram os serviços de saúde e os atendimentos psicológicos (Cobo et al., 2021). Neste sentido, as mulheres apresentam quase o dobro de probabilidade de terem transtornos mentais do que os homens, e, ainda, há questões culturais e de gênero que fazem com que os homens só busquem atendimento médico e/ou psicológico em casos graves (Gomes et al., 2007; Levorato et al., 2014).

Os dados também mostraram que aqueles/as participantes que relataram maior satisfação com o atendimento recebido e que percebiam a utilidade do Plantão eram os/as que manifestaram desejo de retornar para uma futura sessão. Tais medidas (satisfação e benefícios percebidos) são comumente utilizadas na literatura como indicadores de adesão a serviços de saúde (Kim et al., 2014), porém o retorno a outras sessões de Plantão não costuma ser considerado como medidor de eficácia no formato de Plantão Psicológico (Monteiro & Bezerra, 2020). Deste modo, tais resultados podem significar que os participantes mais satisfeitos poderiam ser aqueles mais envolvidos com o cuidado com a sua saúde mental. Tal hipótese, entretanto, precisaria ser averiguada em estudos longitudinais futuros. Não obstante, observa-se a importância de mensurar a satisfação dos/das usuários/as com o atendimento recebido, de forma a garantir que estejam recebendo o apoio adequado para a sua demanda.

Também se faz importante destacar que itens objetivos, como acessibilidade e disponibilidade dos psicoterapeutas, foram mais bem avaliados do que os referentes a estados subjetivos, como sensação de alívio e ressignificação de problemas (apesar de esses também terem pontuado com notas médias superiores a nove). Neste sentido, pode-se hipotetizar que, devido a uma concepção de saúde ainda predominantemente médica/biológica, talvez a população atendida espere posturas mais diretivas e uma resolução imediata de suas queixas, o que não se configura como objetivo do Plantão Psicológico (Monteiro & Bezerra, 2020; Souza & Souza, 2011; Tassinari & Durange, 2011). Além disto, pouco autoconhecimento dos/das usuários/as sobre seus próprios estados emocionais, dificuldades de relacionamento interpessoal (e, consequentemente, de vinculação com o/a psicoterapeuta) e expectativas irreais sobre os resultados de um atendimento psicológico podem ter contribuído com este resultado. No entanto, tais questões não foram avaliadas no presente estudo e merecem atenção em futuras pesquisas.

Considerações Finais

O presente estudo demonstra a eficácia do Plantão Psicológico para demandas urgentes e momentâneas, assim como já sinalizado na literatura, em comparação com tratamentos mais tradicionais (Barwick et al., 2013; Riemer et al., 2018). Entende-se, portanto, que o Plantão cumpre seus objetivos, ajudando a reduzir filas de espera em instituições, promovendo encaminhamentos mais bem direcionados, oferecendo um serviço de qualidade e indo ao encontro da concepção de Clínica Ampliada (Rebouças & Dutra, 2010; Tssinari & Durange, 2011).

Também é possível supor que os efeitos do Plantão Psicológico se estendam além de um alívio momentâneo dos sintomas, visto que a única sessão recebida (ou poucas sessões recebidas) parece contribuir com o início de um processo de mudança. Ademais, o fato de a maioria dos/das participantes não necessitar de encaminhamento após a sessão de Plantão e de que os/as usuários/as que não foram encaminhados/as foram os/as que estavam mais satisfeitos/as (com relação à resolução de seus problemas e a sentir-se compreendidos/as) mostra que este formato é útil e eficaz para grande parte da população que procura ajuda psicológica.

Tal eficácia se mantém mesmo entre os/as usuários/as que possuíam demandas psicopatológicas, visto que estes também avaliaram positivamente o atendimento recebido em relação ao cumprimento dos seus objetivos. Ou seja, parece que o serviço de Plantão Psicológico cumpre a sua finalidade independentemente da problemática apresentada pelo indivíduo, uma vez que a ausência de um protocolo psicoterapêutico padronizado é justamente o que permite abarcar múltiplas demandas, dado o olhar contextualizado próprio deste formato (Braga et al., 2019). Assim, apesar de possuir uma pequena quantidade de encontros, o Plantão parece ter uma compreensão transdiagnóstica e uma função terapêutica suficiente para que a pessoa inicie um processo de organização interna e prossiga sem ajuda psicológica (Carlucci et al., 2021; Souza & Souza, 2011).

Ademais, independentemente do fato de serem atendidos por profissionais em formação, parece que a escuta empática e atenta, a ética, o interesse do/da plantonista em ajudar e a vinculação podem ter sido fundamentais nos resultados alcançados. Tais atitudes parecem se sobrepor à técnica em si, à abordagem teórica ou à experiência dos/das terapeutas, a fim de que os indivíduos experimentem um espaço de segurança para se compreenderem e iniciarem um processo de mudança (Slive & Bobele, 2012; Miller et al., 2018; Norcross & Hill, 2004).

Por outro lado, os resultados obtidos sugerem que os/as usuários/as em situação de vulnerabilidade psicossocial e/ou com demandas psicopatológicas devem ter um olhar diferenciado no momento de se implementar e ofertar o formato de Plantão Psicológico em instituições. Hampson et al. (1999) sugerem que os Plantões, assim como as psicoterapias breves, sejam dirigidos a usuários/as com melhor funcionamento psicossocial e menos transtornos mentais. Assim, identificar quais usuários/as necessitam de formatos únicos, especializados ou adaptados é fundamental para garantir a efetividade do atendimento psicológico ­ofertado (APA, 2020). Aqueles com queixas mais graves deveriam ser acompanhados em um formato mais tradicional, tal como psicoterapias de médio e longo prazo, ou ainda por serviços especializados, como os CAPS.

Pode-se concluir, portanto, que o Plantão Psicológico pode ser uma estratégia de promoção de saúde, sendo possível que suas consequências positivas se estendam à saúde geral do indivíduo, o que poderia ser avaliado em futuros estudos (APA, 2020; Silva et al., 2020). Ademais, visto que algumas pesquisas mostram que este formato pode ser utilizado como “porta de entrada” para intervenções mais estruturadas, sugere-se que este modelo possa ser implementado de forma ampla e consistente na rede de atenção básica de saúde brasileira (Reimer et al., 2018). Neste sentido, este formato poderia prevenir o aparecimento de transtornos mentais, assim como facilitar a identificação e o encaminhamento precoce de casos que necessitem de tratamento contínuo e/ou prolongado, como preconizado na proposta de Clínica Ampliada do Conselho Federal de Psicologia (2019). Assim, o Plantão Psicológico se configura como um espaço de expressão e acolhimento da angústia, levando os serviços psicológicos a uma população que talvez nunca tivesse acesso, auxiliando-a no exercício de conscientização, reorganização do self e autonomia emocional (Rebouças & Dutra, 2010; Tassinari & Durange, 2011).

Por fim, cabe ressaltar algumas limitações deste estudo, tais como o tamanho amostral, o uso exclusivo de um instrumento não padronizado e a falta de acompanhamento (follow-up) dos/das usuários/as. A multiplicidade de diagnósticos dos/das participantes, a utilização de diversos/as psicoterapeutas e a falta de um protocolo psicoterapêutico específico também são limitações desta pesquisa.

Apesar de estas limitações irem ao encontro do objetivo de capturar a avaliação subjetiva dos/das usuários/as e de este modelo ser o que mais se aproxima do cotidiano dos Serviços-Escola, futuras pesquisas poderiam se beneficiar também de outros métodos, como o quase-experimental (comparando com um grupo em lista de espera ou com grupos em psicoterapia tradicional), de amostras maiores, da mensuração de resultados mais tangíveis e da avaliação da manutenção dos efeitos do Plantão Psicológico em curto e médio prazo.

Referências

Associação Americana de Psicologia. (2023a). APA Dictionary of Psychology. https://dictionary.apa.org

Associação Americana de Psicologia. (2023b). Psychological Treatments. https://div12.org/psychological-treatments/

Associação Americana de Psicologia. (2020). Recognition of psychotherapy effectiveness. https://www.apa.org/about/policy/resolution-psychotherapy

Barros, D. S. (2017). Escolaridade e distribuição de renda entre os empregados na economia brasileira: Uma análise comparativa dos setores público e privado dos anos 2001 e 2013. Revista de Economia Contemporânea, 21(3), 1–26. https://doi.org/10.1590/198055272135

Barwick, M., Urajnik, D., Sumner, L., Cohen, S., Reid, G., Engel, K., & Moore, J. E. (2013). Profiles and service utilization for children accessing a mental health walk-in clinic versus usual care. Journal of Evidence-Based Social Work, 10(4), 338–352. https://doi.org/10.1080/15433714.2012.663676

Braga, T. B. M., Farinha, M. G., Souza Filho, C., & Oliveira, K. (2019). Experiências de estagiários em plantão psicológico em hospitais: Formação e ação clínica. Revista da SPAGESP, 20(1), 99–112. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-29702019000100008&lng=pt&tlng=pt

Breschigliari, J. O., & Jafelice, G. T. (2015). Plantão psicológico: Ficções e reflexões. Psicologia Ciência e Profissão, 35(1), 225–237. https://doi.org/10.1590/1982-3703000112014

Buckman, J., Saunders, R., Stott, J., Arundell, L., O'Driscoll, C., Davies, M., Eley, T. C., Hollon, S. D., Kendrick, T., Ambler, G., Cohen, Z. D., Watkins, E., Gilbody, S., Wiles, N., Kessler, D., Richards, D., Brabyn, S., Littlewood, E., DeRubeis, R. J., Lewis, G., & Pilling, S. (2021). Role of age, gender and marital status in prognosis for adults with depression: An individual patient data meta-analysis. Epidemiology and Psychiatric Sciences, 30, e42. https://doi.org/10.1017/S2045796021000342

Carlucci, L., Saggino, A., & Balsamo, M. (2021). On the efficacy of the unified protocol for transdiagnostic treatment of emotional disorders: A systematic review and meta-analysis. Clinical Psychology Review, 87, 101999. https://doi.org/10.1016/j.cpr.2021.101999

Cobo, B., Cruz, C., & Dick, P. C. (2021). Desigualdades de gênero e raciais no acesso e uso dos serviços de atenção primária à saúde no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 26 (09), 4021–4032. https://doi.org/10.1590/1413-81232021269.05732021

Conselho Federal de Psicologia. (2019). Referências técnicas para a atuação de psicólogas(os) na atenção básica à saúde (2ª ed.). https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2019/11/CFP_atencaoBasica-2.pdf

Filippo, D., Pimentel, M., & Wainer, J. (2011). Metodologia de pesquisa científica em sistemas colaborativos. In M. Pimentel, &, H. Fuks (Org.). Sistemas colaborativos. Elsevier.

Gomes, R., Nascimento, E. F., & Araújo, F. C. (2007). Por que os homens buscam menos os serviços de saúde do que as mulheres? As explicações de homens com baixa escolaridade e homens com ensino superior. Cadernos de Saúde Pública, 23(3), 565–574. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2007000300015

Hampson, R., O’Hanlon, J., Franklin, A., Pentony, M., Fridgant, L., & Heins, T. (1999). The place of single session family consultations: Five years’ experience in Canberra. Australian and New Zealand Journal of Family Therapy, 20(4), 195–200. https://doi.org/10.1111/j.0814-723X.1999.00129.x

Harper-Jacques, S. & Foucault, D. (2014). Walk-In single-session therapy: Client satisfaction and clinical outcomes. Journal of Systemic Therapies, 33(3), 29–49. https://doi.org/10.1521/jsyt.2014.33.3.29

Hymmen, P., Stalker, C. A., & Cait, C. (2013). The case for single-session therapy: Does the empirical evidence support the increased prevalence of this service delivery model? Journal of Mental Health, 22(1), 60–71. https://doi.org/10.3109/09638237.2012.670880

Kim, G., Parton, J. M., Ford, K., Bryant, A. N., Shim, R. S., & Parmelee, P. (2014). Geographic and racial-ethnic differences in satisfaction with and perceived benefits of mental health services. Psychiatric Services, 65(12), 1474–1482. https://doi.org/10.1176/appi.ps.201300440

Levorato, C. D., Mello, L. M., Silva, A. S., & Nunes, A. A. (2014). Fatores associados à procura por serviços de saúde numa perspectiva relacional de gênero. Ciência & Saúde Coletiva, 19(4), 1263–1274. https://doi.org/10.1590/1413-81232014194.01242013

Lund, C., Brooke-Sumner, C., Baingana, F., Baron, E. C., Breuer, E., Chandra, P., Haushofer, J., Herrman, H., Jordans, M., Kieling, C., Medina-Mora, M. E., Morgan, E., Omigbodun, O., Tol, W., Patel, V., & Saxena, S. (2018). Social determinants of mental disorders and the Sustainable Development Goals: A systematic review of reviews. The Lancet Psychiatry, 5(4), 357–369. https://doi.org/10.1016/S2215-0366(18)30060-9

Macêdo, S., Nunes, A. L. P., & Duarte, M. V. G. (2021). Escuta clínica, triagem e plantão psicológico em um serviço-escola pernambucano. Psicologia: Ciência e Profissão, 41, e219706. https://doi.org/10.1590/1982-3703003219706

Mahfoud, M. (1999). Plantão Psicológico: Novos horizontes. Companhia Ilimitada.

McAleavey, A. A., Youn, S. J., Xiao, H., Castonguay, L. G., Hayes, J. A., & Locke, B. D. (2019). Effectiveness of routine psychotherapy: Method matters. Psychotherapy research, 29(2), 139-156. https://doi.org/10.1080/10503307.2017.1395921

McFall, R. M., & Townsend, J. t. (1998). Foundations of psychological assessment: Implications for cognitive assessment in clinical science. Psychological Assessment, 10(4), 316–330. https://doi.org/10.1037/1040-3590.10.4.316

Mendes, J. A. A., & Naves, A. R. C. X. (2021). Implementação do plantão psicológico no serviço-escola de Psicologia: Relato de experiência. Diaphora, 10(1), 76–82. http://sprgs.org.br/diaphora/ojs/index.php/diaphora/article/view/244/242

Miller, S. D., Hubble, M. & Chow, D. (2018). The question of expertise in psychotherapy. Journal of Expertise, 1(2), 1-9. https://www.journalofexpertise.org/articles/volume1_issue2/JoE_2018_1_2_Miller_Hubble_Chow.pdf

Ministério da Saúde (2013). Política Nacional de Humanização (1ª ed.). https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_humanizacao_pnh_folheto.pdf

Monteiro, C. A. S., & Bezerra, E. N. (2020). Implantação e implementação de um serviço de Plantão Psicológico centrado na pessoa. Revista Saúde & Ciência Online, 9(1), 58-77. https://doi.org/10.35572/rsc.v9i1.380

Moreira, G., Dantas, J. B., & Dutra, A. B. (2022). Ausência como urgência: o Plantão Psicológico em situações de perdas e luto. Revista do NUFEN: Phenomenology and Interdisciplinarity, 14(2). https://doi.org/10.26823/nufen.v14i2.21878

Nathan, P. E., Stuart, S. P., & Dolan, S. L. (2000). Research on psychoteraphy efficacy and effectiveness: Between Scylla and Charybdis? Psychological Bulletin, 126(6), 964–981. https://doi.org/10.1037//0033-2909.126.6.964

Norcross, J. C., & Hill, C. E. (2004). Empirically supported therapy relationships. The Clinical Psychologist, 57(3), 19–24. https://psycnet.apa.org/doi/10.1037/e533282009-008

Oliveira, A. E. G. (2017). A experiência de pacientes de um serviço de atenção domiciliar. [Tese de Doutorado, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campinas, São Paulo, Brasil].

Ortolan, M. L. M., & Sei. M. B. (2019). Avaliação do plantão psicológico de um serviço-escola de Psicologia. Interação em Psicologia, 23(2), 104–113. https://doi.org/10.5380/psi.v23i02.56248

Oswald, A. J., & Wu, S. (2009). Objective confirmation of subjective measures of human well-being: Evidence from the USA. Science, 327(5965), 576–579. https://doi.org/10.1126/science.1180606

Pan, M., Zonta, G. A., & Tovar, A. (2015). Plantão Institucional: Relato de experiência de uma intervenção psicológica na UFPR. Psicologia em Estudo, 20(4), 555–562. http://doi.org/10.4025/psicolestud.v20i4.27594

Rebouças, M. S. S., & Dutra, E. (2010). Plantão psicológico: Uma prática clínica da contemporaneidade. Revista da Abordagem Gestáltica: Phenomenological Studies, 16(1), 19–28. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672010000100004&lng=pt&tlng=pt

Read, A., Mazzucchelli, T. G., & Kane, R. T. (2016). A preliminary evaluation of a single-session behavioural activation intervention to improve well-being and prevent depression in carers. Clinical Psychologist, 20(1), 36–45. https://doi.org/10.1111/cp.12084

Reimer, M., Stalker, C. A., Dittmer, L., Cait, C., Horton, S., Kermani, N., & Booton, J. (2018). The walk-in counseling model of service delivery: Who benefits the most? Canadian Journal of Community Mental Health, 37(2), 29–47. https://doi.org/10.7870/cjcmh-2018-019

Rocha, M. C. (2009). Plantão psicológico: Desafios e potencialidades. In J. O. Breschigliari, & M. C. Rocha. Serviço de aconselhamento psicológico: 40 anos de história (pp. 103–120). Instituto de Psicologia.

Silva, C., F., Silva, S. O. M., Tomaz, R. S. R., Daccache, M. H., Moreira, T. V. E., Araújo, J. B., & Santos, L. R. (2020). Um encontro com o inesperado no Plantão Psicológico: Uma revisão sistemática. Revista em Saúde, 1(1), 1–17. http://anais.unievangelica.edu.br/index.php/saudefaceg/article/view/6925/3573

Souza, B. N., & Souza, A. M. (2011). Plantão psicológico no Brasil (1997-2009): saberes e práticas compartilhados. Estudos de Psicologia (Campinas), 28(2), 241–249. https://doi.org/10.1590/S0103-166X2011000200011

Slive, A., & Bobele, M. (2012). Walk-in counselling services: Making the most of one hour. Australian and New Zealand Journal of Family Therapy, 33(1), 27–38. https://doi.org/10.1017/aft.2012.4

Tassinari, M. A., & Durange, W. (2011). Plantão psicológico e sua inserção na contemporaneidade. Revista do NUFEN, 3(1), 41–64. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912011000100004&lng=pt&tlng=pt

Recebido em: 25/04/2023

Última revisão: 26/07/2023

Aceite final: 1º/08/2023

Sobre a autora:

Amanda Muglia Wechsler: Doutora em Psicologia da Saúde/Clínica pela Universidade Complutense de Madri. Mestre e psicóloga pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC Campinas). Atualmente, é docente da PUC Campinas. E-mail: amanda.wechsler@gmail.com, Orcid: https://orcid.org/0000-0001-5916-1667


1 Endereço de contato: Av. John Boyd Dunlop, s/n, Jardim Ipaussurama, Campinas, SP. CEP: 13034-685. Telefone: (19) 3343-6800

doi: http://dx.doi.org/10.20435/pssa.v15i1.2339