Necessidades Parentais no Contexto da Internação Neonatal

Parental Needs in the Context of Neonatal Hospitalization

Necesidades de los Padres en Contexto de la Hospitalización Neonatal

Karina Scapin Teixeira

Gabriela Sarturi Rigão

Bruna Fragoso Cousseau

Rayssa Reck Brum

Caroline Rubim Rossato Pereira

Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)

Resumo

Introdução: sabe-se da importância da relação pais-bebês para o desenvolvimento do bebê e para o exercício da parentalidade, sendo fundamental considerar a família no processo de cuidado. Nesse sentido, o presente estudo objetivou compreender as necessidades parentais no contexto da internação neonatal. Método: trata-se de uma pesquisa qualitativa, de caráter descritivo e exploratório, em que participaram três pais e sete mães de bebês que foram internados em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) logo após seu nascimento prematuro. A coleta de dados ocorreu por meio de questionário sociodemográfico, entrevista semiestruturada e questionário de necessidades parentais no contexto da internação neonatal. Os resultados dos questionários, analisados de forma descritiva, foram integrados à análise de conteúdo das entrevistas. Resultados: os pais destacaram necessidades físicas e estruturais; emocionais e de suporte; de orientação e informação; e necessidades relacionadas à participação no dia a dia na UTIN. Identificou-se certa discrepância entre as necessidades apresentadas pelos pais e o apoio oferecido pelos hospitais e por sua rede pessoal. Discussões e conclusões: é preciso difundir as práticas de humanização no ambiente hospitalar, de modo a contribuírem para a integração da família no processo de cuidado, favorecendo a relação pais-bebês.

Palavras-chave: prematuridade, internação neonatal, parentalidade, necessidades parentais

Abstract

Introduction: the importance of the parent-baby relationship for the baby’s development and for the exercise of parenting is well known, and it is essential to consider the family in the care process. In this sense, this study aimed to understand parental needs in the context of neonatal hospitalization. Method: this is a qualitative, descriptive and exploratory study in which three fathers and seven mothers of babies who were admitted to the Neonatal Intensive Care Unit (NICU) shortly after their premature birth took part. Data was collected using a sociodemographic questionnaire, a semi-structured interview and a questionnaire on parental needs in the context of neonatal hospitalization. The results of the questionnaires, analyzed descriptively, were integrated with the content analysis of the interviews. Results: parents highlighted physical and structural needs; emotional and support needs; guidance and information needs; and needs related to day-to-day participation in the NICU. A certain discrepancy was identified between the needs presented by the parents and the support offered by the hospitals and their personal network. Discussions and conclusions: humanization practices need to be disseminated in the hospital environment in order to contribute to the integration of the family in the care process, favouring the parent-baby relationship.

Keywords: prematurity, neonatal hospitalization, parenthood, parents’ needs

Resumen

Introducción: es conocida la importancia de la relación padres-bebé para el desarrollo del bebé y para el ejercicio de la paternidad, siendo fundamental considerar a la familia en el proceso de atención. En este sentido, este estudio tuvo como objetivo comprender las necesidades parentales en el contexto de la hospitalización neonatal. Método: se trata de un estudio cualitativo, descriptivo y exploratorio en el que participaron tres padres y siete madres de bebés ingresados en la UCIN poco después de su nacimiento prematuro. Los datos se recogieron mediante un cuestionario sociodemográfico, una entrevista semiestructurada y un cuestionario sobre las necesidades de los padres en el contexto de la hospitalización neonatal. Los resultados de los cuestionarios, analizados descriptivamente, se integraron con el análisis de contenido de las entrevistas. Resultados: los padres destacaron necesidades físicas y estructurales; necesidades emocionales y de apoyo; necesidades de orientación e información; y necesidades relacionadas con la participación en la vida cotidiana en la UCIN. Se identificó cierta discrepancia entre las necesidades presentadas por los padres y el apoyo ofrecido por los hospitales y su red personal. Discusiones y conclusiones: es necesario difundir prácticas de humanización en el medio hospitalario para ayudar a integrar a la familia en el proceso asistencial, favoreciendo la relación padres-bebé.

Palabras clave: prematuridad, hospitalización neonatal, parentalidad, necesidades de los padres

Introdução

A prematuridade, caracterizada como o nascimento até 37 semanas gestacionais, apresenta-se como uma questão de saúde pública devido à sua alta prevalência. No mundo, a média de nascimentos prematuros é de 10% em relação ao número total de nascimentos. No Brasil, de acordo com levantamento realizado pela Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz), esta média é de 11,5% dos nascimentos (Rede Nacional Primeira Infância, 2019).

Atentando à família nesse contexto, entende-se que, associada à prematuridade, a internação do bebê após o nascimento apresenta-se como um momento de crise que coloca mães e pais em uma situação de difícil manejo. Tal contexto exige que a família desenvolva uma série de ajustamentos de ordem individual, conjugal, familiar e profissional, em um clima de estresse e preocupações (Araújo et al., 2021). Esse período é considerado complicado para os pais, uma vez que necessitam reconciliar a imagem mental idealizada do seu bebê (imaginário) com outro bebê (real), magro, pálido, com aparência enfraquecida, às vezes, entubado e cercado por aparelhos. Ainda, os aspectos emocionais da dupla parental e/ou das díades mãe-bebê e pai-bebê podem ser afetados de forma significativa, comumente gerando nos pais sentimentos de tristeza, frustração, insegurança, medo e culpa, envolvidos no processo de luto pelo filho e pela experiência ideal não vivenciada (Cartaxo et al., 2014).

Ao considerar a relação afetiva pais-filhos para a constituição psíquica do novo sujeito, nos casos em que há necessidade de internação do recém-nascido, ressalta-se a importância da presença e do envolvimento parental durante esta internação e da qualidade da relação inicial. Tais fatores podem amenizar os impactos negativos do parto prematuro, contribuindo para uma mais rápida recuperação (Segers et al., 2019). Nesse sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) tornou possível a presença de um responsável pela criança ou adolescente durante a hospitalização desta (Lei nº 8.069, 1990). Entretanto, foi apenas com a Lei n. 13.257, de 2016, que os estabelecimentos de saúde passaram a ter de disponibilizar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsáveis pela criança, seja na unidade neonatal, de cuidado intensivo ou intermediário (Lei nº 13.257, 2016).

Com a inserção da família na internação hospitalar infantil, tem-se uma alteração na dinâmica institucional. Tendo em vista as peculiaridades do ambiente da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), as equipes de saúde são parte do contexto no qual se processa a construção do vínculo e cuidados dos pais com o filho. Ono e Asano (2023), a partir de estudo desenvolvido com enfermeiras em UTIN no Japão, atentam para o fato de que as equipes de saúde podem atuar de modo a favorecer ou dificultar a construção de laços emocionais e afetivos, a interação pais-bebê e as práticas de cuidados parentais.

Nesse cenário, faz-se imprescindível que as equipes de UTINs incluam, em suas rotinas diárias, o atendimento às necessidades apresentadas pelos pais. Para tanto, é importante que se possa ampliar o conhecimento acerca das demandas e necessidades das famílias que vivenciam uma internação na UTIN. Magnago (2019), ao revisar a literatura científica acerca das necessidades de pais de crianças e adolescentes hospitalizadas, identificou três categorias para caracterizar as necessidades parentais: 1) necessidades dos próprios pais, 2) necessidades relacionadas às ações das equipes de saúde, e 3) necessidades relacionadas à estrutura e aos recursos organizacionais. A pesquisa sinalizou a importância de estudos acerca do tema em âmbito nacional, tendo em vista a lacuna de produções sobre a temática.

No que se refere às experiências dos pais a partir da internação neonatal, Diaz et al. (2014), em estudo com 20 mães e pais de bebês internados em UTIN em um hospital de Portugal, constataram que os pais apresentavam necessidades financeiras associadas ao período de estadia no hospital, e, no caso dos pais (homens), a necessidade de afastamento prolongada no trabalho, tendo em vista que, diferentemente das mães, não contavam com licença do trabalho por tempo suficiente. Pais (homens) participantes do estudo estadunidense de Hearn et al. (2020) evidenciaram alterações no cotidiano relacionadas às dificuldades de assistência aos filhos que permanecem em casa, a necessidade de conciliar diferentes papéis e responsabilidades, enquanto buscam tempo e possuem desejo de estarem com o bebê doente. Quanto às condições de permanência no hospital, identificaram-se dificuldades para descansar devido aos ruídos das enfermarias e de permanecer integralmente com o filho, considerando as dificuldades estruturais das UTIN para atender a tais demandas (Diaz et al., 2014).

A partir do exposto, estudar as necessidades das famílias diante da internação neonatal, na realidade brasileira, constitui-se como importante aliado na construção de um cuidado humanizado aos bebês e suas famílias. As teorias do desenvolvimento humano e abordagem psicanalítica fornecem a base na compreensão da complexidade deste fenômeno para a família e sua relevância para o desenvolvimento do bebê. Assim, este estudo objetivou compreender as necessidades parentais no contexto da internação neonatal.

Método

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de caráter descritivo e exploratório. A abordagem qualitativa se adapta à busca da essência de fenômenos, experiências vividas por um grupo de pessoas e processos integrativos. Seu caráter descritivo enfatiza o relato das experiências conscientes cotidianas (Gil, 2021). Ainda, de forma exploratória, permitiu-se ampliar os conhecimentos, propiciando uma visão contextualizada à problemática.

Participaram deste estudo sete mães e três pais de crianças de até cinco anos de idade que nasceram prematuras e vivenciaram a internação em UTIN. A participação se deu após a alta hospitalar de seus filhos, em período que variou de 6 meses a 4 anos e 10 meses. Destaca-se que todos os bebês dos pais participantes receberam alta com vida da UTIN. Ainda, todos os participantes experienciaram a vivência em UTIN na primeira gestação, ou seja, de seus primeiros filhos, não havendo outras gestações até o momento da pesquisa. Dentre os participantes, havia três casais (Hibisco e Hortência; Cravo e Rosa; e Antúrio e Jasmim) que participaram de forma individual, contemplando a sua percepção. A Tabela 1 apresenta a caracterização dos participantes do estudo e de suas famílias. A fim de garantir a privacidade dos participantes, foram atribuídos nomes fictícios aos pais e bebês.

Tabela 1

Características Sociodemográficas dos Participantes

Nome

Idade

Escolaridade

Reside com

Renda (salários mínimos) –ano-base de 2020

Cidade/UF

Idade gestacional em semanas

Tempo de alta hospitalar até a data da pesquisa

Cravo

50

Ensino Superior

Filho (5a); esposa

6

Rio de Janeiro/RJ

30

4 anos e 11 meses

Antúrio

29

Ensino Superior

Filho (1a5m); esposa

6

Campinas/SP

34

1 ano e 4 meses

Rosa

38

Ensino Superior

Filho (5a); esposo

2

Rio de Janeiro/RJ

29

4 anos e 11 meses

Hibisco

33

Ensino Médio

Filho (5a); esposa

4

Santa Maria/RS

30

4 anos e 10 meses

Margarida

37

Ensino Superior

Filho (3a); esposo; sogra; sogro; cunhado

2

Brasília/

DF

27

2 anos e 8 meses

Hortência

31

Ensino Superior

Filho (5a); esposo

6

Santa Maria/RS

29

4 anos e 10 meses

Violeta

27

Ensino Médio

Filho (7m); esposo

0

Campinas/SP

31

6 meses

Begônia

27

Ensino Superior

Filho (1a5m); esposo

2

Campinas/SP

34

1 ano e 4 meses

Jasmim

38

Ensino Superior

Filho (1a6m); esposo; mãe

2

São Paulo/SP

28

1 ano e 5 meses

Camélia

35

Ensino Superior

Filhas gêmeas

(3 anos); esposo

6

Passo Fundo/RS

29

2 anos e 10 meses

A constituição da amostra se deu por meio da divulgação da pesquisa nas páginas das redes sociais Facebook e Instagram do grupo de pesquisa, além do envio de convite à participação na pesquisa a grupos de pais que vivenciaram a UTIN no Facebook. Após o contato explicando a pesquisa e tendo o aceite dos participantes, foram agendadas as entrevistas de forma on-line e síncrona (via Google Meet), tendo em vista que a coleta de dados ocorreu entre os meses de junho e setembro de 2020, durante a pandemia da covid-19. Diante das explicações sobre os objetivos e procedimentos, os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) por meio da ferramenta Google Forms.

Foi solicitado aos participantes que respondessem a um Questionário de Dados Sociodemográficos, com o objetivo de obter sua caracterização. Em seguida, responderam à Entrevista sobre a Parentalidade e a Experiência na UTIN, entrevista semiestruturada envolvendo a experiência dos pais e suas necessidades nos momentos da gestação, do nascimento do(a) filho(a), no período de internação neonatal e no pós-alta do(a) filho(a). Por fim, os participantes responderam ao Questionário de Necessidades Parentais no Contexto de Nascimento Pré-Termo e Internação do Recém-Nascido em UTI Neonatal. Tal questionário foi elaborado pelas autoras para o presente estudo com base no instrumento Needs of Parents Questionnaire, de Andrade (2016), que avalia a percepção dos pais sobre suas necessidades, a importância delas e sua satisfação durante o período de hospitalização de seus filhos.

O questionário é composto por três eixos: a importância de determinada necessidade na experiência do(a) participante, a frequência em que foi respondida e a atribuição da responsabilidade do hospital sobre a resposta a tal necessidade. Para o primeiro e segundo eixo, foi composto uma escala do tipo Likert de cinco pontos. Para a importância das necessidades, os participantes precisavam optar entre: “muito importante”, “importante”, “não muito importante”, “sem importância” e “não se aplica a sua situação”. Para a frequência a que tinham tal necessidade respondida, os cinco pontos variam de “nunca” a “sempre”. Quanto à atribuição ou não da responsabilidade ao hospital, as opções eram “sim” ou “não”.

Os dados coletados a partir do Questionário de Dados Sociodemográficos e do primeiro e segundo eixo do Questionário de Necessidades foram analisados de forma descritiva. As entrevistas foram realizadas de forma individual, com duração média de uma hora e trinta minutos, gravadas em áudio e posteriormente transcritas na íntegra para a análise. Os dados advindos das entrevistas semiestruturadas passaram pela Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2006), que possibilita compreensões comuns aos documentos selecionados. As categorias de análise foram definidas a priori, a partir dos conhecimentos teóricos sobre a temática (Creswell, 2014), compreendendo os dados provenientes das entrevistas e do Questionário de Necessidades Parentais. Ainda que houvesse abertura para a reformulação das categorias, não foi necessário e mantiveram-se as propostas.

A partir da identificação dos núcleos de sentido existentes e com base na literatura acerca das necessidades parentais, foram definidas as categorias temáticas: 1) necessidades físicas e estruturais; 2) necessidades emocionais e de suporte; 3) necessidades de orientação e informação; e 4) necessidades relacionadas à participação no dia a dia na UTIN. A apresentação dos resultados foi feita de forma conjunta, buscando integrar a síntese dos resultados do questionário e os sentidos expressos pelos participantes acerca da temática.

O estudo seguiu as diretrizes das Resoluções n. 466 (Resolução nº 466, 2012) e n. 510 do Conselho Nacional de Saúde, que guiam a ética nas pesquisas com seres humanos em Ciências Humanas e Sociais (Resolução nº 510, 2016). A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da universidade de vínculo das autoras, sob o número CAAE (32815820.3.0000.5346).

Resultados e Discussões

Necessidades Físicas e Estruturais

Esta categoria inclui o grupo de necessidades parentais referentes às questões estruturais do hospital, envolvendo recursos físicos e gestão hospitalar. Tais necessidades estão relacionadas aos cuidados com os recém-nascidos, atendimento às demandas básicas dos pais e à garantia de condições para estarem com seus filhos.

Em relação à estrutura física do hospital, como espaço reservado para as refeições, descanso e banheiros para os pais, oito dos dez participantes referiram como um aspecto muito importante ou importante. Entretanto, ao responderem sobre a disponibilidade deste recurso em suas experiências, nove dos dez pais referiram que nunca ou raramente contaram com estes espaços. A literatura aponta que a falta de estrutura física nos hospitais dificulta a permanência dos pais em tempo integral junto ao filho (Diaz et al., 2014), o que também foi referido pelos participantes do presente estudo:

Acho bem complicado, mas acho que é intencional, porque não tem uma cadeira. Então, por exemplo, se você quiser ficar do lado do seu filho, você vai ficar em pé, e eu ficava em pé das 11h até às 19h (Jasmim).

O referido por Jasmim evidencia que, embora haja um discurso explícito acerca da importância da permanência dos pais na UTIN, quando não são oferecidas condições mínimas para tal, observa-se que está implícito que esses não deveriam permanecer todo o tempo com seu bebê. Tais condições podem ser vistas como barreiras para a permanência e o desenvolvimento dos laços afetivos dos pais com os filhos e para a relação entre as famílias e as equipes de saúde. Chama atenção o entendimento da participante de que tal carência física seria intencional, de modo que se pode depreender que a mãe compreendia não haver apoio ou interesse da equipe profissional de que ela estivesse presente neste contexto.

Quando questionados quanto à adaptação da equipe da UTIN às suas necessidades, oito dos participantes consideraram esse fator como muito importante ou importante, ao passo que apenas um indicou que sempre, e outro indicou que quase sempre foram contemplados por tal adaptação. Ainda, dois pais referiram que isto nunca aconteceu no hospital em que o seu filho estava internado. Da mesma forma, a flexibilização de rotinas do hospital, a fim de adequar-se às necessidades dos pais, foi considerada por oito dos participantes do estudo como muito importante ou importante. Apenas um referiu ter experienciado sempre e outro quase sempre a flexibilização de rotinas, sendo que três nunca tiveram essa necessidade atendida. Hortência exemplificou a dificuldade relacionada à flexibilização das rotinas hospitalares, aos horários de procedimentos e à relevância da estrutura física para garantir sua permanência na UTIN:

Eram os horários das mamadas, . . . eu tinha que ir de manhã, de tarde e de noite, toda uma função pra eu caminhar toda cortada [em função da cesariana], e eu não podia. Se eu tivesse ficado internada lá com ele, seria tudo mais prático, mas como mandam a gente embora com os pontos, eu mal consegui.

De fato, pais de bebês internados em UTIN têm significativas dificuldades advindas da necessidade de locomoção diária até o hospital, que se torna bastante cansativa (Diaz et al., 2014). Restrições, normas e rotinas hospitalares podem não ser compatíveis com as realidades de cada família. Costa et al. (2010), ao estudar os sentimentos de mães de bebês internados em UTIN em um hospital público no interior de São Paulo, destacaram que, assim como para os participantes deste estudo, havia a percepção de que as necessidades das mães, por vezes, não eram consideradas. As autoras apontaram que a atenção por parte dos profissionais era restrita ao tratamento dos aspectos físicos dos bebês, não contemplando as necessidades da família, o que se contribuiu para o sofrimento materno. No presente estudo, essa percepção também foi exposta pelos participantes. Oito pais destacaram como muito importante ou importante que houvesse profissionais de saúde disponíveis para o cuidado dos pais, mas apenas três participantes referiram ter recebido tal atenção, às vezes.

No que tange à possibilidade de permanecer 24h com o seu filho se desejasse, nove participantes referiram esta como uma necessidade muito importante ou importante. Entretanto, os resultados indicam que apenas dois participantes sempre tiveram a ­oportunidade de ­permanecer 24h com o seu filho, um “às vezes” e outros sete “nunca” ou “raramente” tiveram acesso irrestrito ao filho na UTIN. Essa experiência dos pais expõe um desacordo com a legislação vigente (Lei 13.257, 2016). Diante da impossibilidade de permanecer junto ao filho, Begônia aponta dificuldades na amamentação, perpassadas pela falta de estrutura para garantir a permanência das mães na UTIN:

Eu acho muito complicado que não tem um lugar pra mãe dormir, que não tenha um quarto. Primeiro, a questão da amamentação, tipo, eu não consegui amamentar meu filho de madrugada, o risco de desmame é enorme, porque você não tá estimulando nem nada, e, segundo, que é muito difícil de você ficar longe do bebê.

Entende-se a importância da relação e constituição do vínculo na tríade pai-mãe-bebê, e pelas díades mãe-bebê e pai-bebê durante os primeiros meses de vida. Garantir a permanência (24h) e qualidade desta aos pais de bebês hospitalizados em UTIN apresenta-se como importante redutor de estresse e sobrecarga associado a idas e vindas ao hospital, na separação dos pais de seus filhos (Kegler et al., 2019). Para o bebê, a presença dos pais contribui com o alívio da dor e em sua recuperação e desenvolvimento físico (Lotto & Linhares, 2018). Pensar os benefícios da presença e interação com os pais para o desenvolvimento do bebê evidencia a relevância de proporcionar aos pais estarem junto ao filho pelo tempo que desejarem.

Necessidades Emocionais e de Suporte

Nesta categoria, são apresentadas e discutidas as necessidades dos pais decorrentes das repercussões emocionais associadas à prematuridade e subsequente internação do bebê na UTIN. Nesse âmbito, inclui-se a possibilidade/potência de momentos de conversa e troca de experiências, do apoio prestado por profissionais da psicologia no hospital e de atenção ao aspecto emocional dos pais no período de internação de seus filhos.

No que se refere à possibilidade de terem seus sentimentos reconhecidos e compreendidos pela equipe de saúde, nove participantes consideraram como muito importante ou importante, embora apenas um participante tenha relatado sempre ter contado com essa assistência. A fala de Hortência sinaliza para a falta de atenção às mães como pessoas, para além da sua importância para o bebê: “A gente foi escanteada. Nós éramos meras vacas leiteiras produzindo leite. Era a nossa função ali dentro. Não tinha outra função, nós não tínhamos outro cuidado, nós não tínhamos outro apoio”. Destaca-se que proporcionar aos pais um ambiente acolhedor, seguro e de suporte, capaz de atendê-los em suas singularidades, integra o preconizado pela Política Nacional de Humanização (PNH), no que tange à inclusão das famílias no processo de hospitalização do recém-nascido.

Para nove dos participantes, era muito importante ou importante poder contar com algum profissional que os ajudasse a identificar e entender suas necessidades físicas e emocionais, como alimentação, sono e ansiedade, por exemplo. Porém, para cinco pais, nunca ou raramente tal auxílio foi prestado. Da mesma forma, no que se refere ao apoio prestado por um(a) profissional psicólogo(a) durante o período de internação de seus filhos, nove participantes consideraram como muito importante ou importante. Contudo, três dos participantes nunca tiveram qualquer tipo de atendimento psicológico. Pode-se compreender tal necessidade tendo em vista os diferentes atravessamentos desse contexto, no que diz respeito tanto à experiência da maternidade/paternidade quanto aos aspectos relativos à hospitalização, separação de pais e filhos, bem como sentimentos e emoções ambivalentes diante do nascimento do filho, internação na UTIN e sua saúde. A participante Begônia, que teve acesso a acompanhamento psicológico durante o período de internação do filho, destacou as competências do(a) psicólogo(a) como diferenciais no serviço prestado: “Foi uma ajuda maravilhosa, porque eu acho que o psicólogo consegue ouvir a gente sem julgar, sem falar como você deve se sentir, e eu acho que isso ajuda muito” (Begônia).

Destaca-se que a presença do(a) psicólogo(a) nas equipes de UTIN é garantida por lei desde 1999 (Portaria nº 1091, 1999). Compreendem-se as peculiaridades da atuação do psicólogo hospitalar neste contexto, tendo em vista que a internação diz respeito às necessidades físicas do bebê, mas as intervenções são realizadas junto ao bebê e seus pais, pois leva-se em conta as necessidades psíquicas das díades, bem como do grupo familiar.

A possibilidade de trocas de experiências entre pais com filhos internados em UTIN também foi um aspecto considerado muito importante ou importante na percepção de nove participantes. Esses momentos podem contribuir para a construção de uma rede de apoio embasada na identificação entre os pais que estão experienciando a internação de seus bebês:

A gente conseguiu encontrar outros pais na UTI . . . e começou a dividir experiências com eles e foi muito melhor. Apesar de eu ser super [reservado], eu não falo da minha vida pra ninguém, eu acho que só o sentimento de você se identificar com o outro já traz um conforto de: “eu não estou sozinho” (Antúrio).

Cinco pais referiram ter tido quase sempre essa experiência. Na ausência de incentivo do hospital para esses encontros, alguns pais buscaram por si mesmos constituir-se como rede de apoio: “A gente fez um grupo mesmo de ajuda, a gente tem o grupo até hoje que a gente compartilha as coisas, se manteve” (Begônia).

A partir disso, pode-se pensar no potencial dos encontros entre pais durante a hospitalização de seus bebês, bem como no período pós-alta hospitalar. Nessa direção, o estudo de Marciano et al. (2019), realizado em Goiás com mães de bebês em UTIN, indicou que grupos de mães, além de funcionarem como espaços terapêuticos, constituem-se como importantes redes de apoio às vivências maternas.

Sobre a possibilidade de assistência religiosa para pais e seus bebês, cinco pais consideraram como muito importante ou importante. A participante Violeta mencionou que, após intercorrências no estado clínico do seu bebê, solicitou e teve a possibilidade de batizar o filho durante a internação, ressaltando sua satisfação ao perceber que ele teve melhoras significativas após o batismo. Quando investigada a frequência em que a assistência religiosa se fez presente na experiência dos pais, sete pais evidenciaram que nunca lhes foi ofertada.

A necessidade de suporte religioso foi a menos consensual entre os pais do presente estudo, tanto no que tange à frequência com que tinham acesso a tal suporte quanto no que se refere à importância percebida. Lima et al. (2021), ao entrevistar 90 mães de bebês prematuros que passaram por internação em UTI Neonatal no estado de Natal, destacaram que uma palavra muito evocada pelas mães durante a internação foi “Deus”, reconhecendo a importância da religião e a espiritualidade ao se constituírem como um fator protetor em períodos mais críticos. Vale destacar que a legislação brasileira assegura o direito do recebimento de assistência religiosa ao internado em entidades hospitalares públicas e privadas, desde que de acordo com o desejo do paciente ou de seus familiares (Lei nº 9982, 2000).

Necessidades de Orientação e Informação

A presente categoria discorre sobre as necessidades dos pais de receberem informação e orientação diante do nascimento prematuro de seu filho e internação na UTIN. Discute-se o recebimento de informações sobre evolução do quadro clínico e procedimentos, a confiança dos pais nos cuidados dos bebês e a postura da equipe referente à comunicação.

O recebimento de informações sobre os procedimentos que eram realizados com seus filhos e seu quadro clínico foi uma necessidade relevante a todos os pais. Porém, verificou-se uma variabilidade quanto à frequência com que recebiam tais informações durante a internação, sendo que quatro pais sempre tiveram acesso a informações, dois quase sempre e quatro pais evidenciaram apenas às vezes terem tido acesso.

Na vivência dos participantes, a ausência de informações foi relatada como um estressor durante a internação do filho, conforme Violeta:

Você não tem notícia nenhuma, e você só vai saber quando o médico vier fazer o boletim, e as únicas coisas que eles falam: ‘Ele tá estável’ . . . Eu sempre chorava, porque eu não sabia o que tava acontecendo.

Nesse sentido, Begônia destaca a fragilidade em que os pais se encontram no contexto da prematuridade e internação dos bebês, relatando sua percepção de que a forma como as informações eram transmitidas por alguns profissionais desconsiderava tais aspectos: “Eles esquecem que a gente acaba acompanhando tudo aquilo e a gente acaba ficando mais frágil. Então, eu acho que tem uns que pecam um pouquinho na forma de falar”.

Outro aspecto investigado no presente estudo diz respeito ao incentivo das equipes para que os pais fizessem perguntas sobre os filhos aos profissionais responsáveis por eles. Nesse tocante, nove pais consideraram essa uma questão muito importante ou importante. Contudo, apenas quatro sempre ou quase sempre contaram com esse incentivo, outros três participantes às vezes, ao passo que três pais nunca ou raramente o tiveram. Com relação a isso, relata-se uma situação em que um pai percebeu que sua busca por informações quanto ao desenvolvimento do filho não foi bem aceita pela profissional da equipe:

Naquele dia eu tomei um esporro [bronca], porque eu tava perguntando demais. Eu tava fazendo o acompanhamento da evolução do peso dele e quanto que ele tava tomando de mamadeira por dia, eu acho que ela se emputeceu [enraiveceu] comigo, ela foi meio grosseira, mas foi a única vez (Cravo).

A esse respeito, Soares et al. (2019), em estudo de intervenção realizado com pais e mães de recém-nascidos internados em UTIN em hospital do Paraná, identificou que, entre os participantes, a falta de informações claras a respeito do estado de saúde do filho, bem como de orientações por parte da equipe, agravou sentimentos de angústia, desespero e desamparo das famílias. Diante do exposto, torna-se necessário refletir não apenas sobre a disponibilidade de informações, mas também sobre a forma como se dá. As experiências relatadas por alguns participantes salientam descompassos na comunicação dos profissionais com as famílias em relação ao momento de fragilidade e desamparo que os pais se encontravam. Dadalto et al. (2019) evidenciaram a importância da sensibilização dos profissionais quanto às repercussões da sua assistência, visto que, dos 16 neonatologistas da UTIN de uma Maternidade-Escola carioca participantes de seu estudo, apenas três demonstraram compreender que a forma como se comunicavam com as mães produzia interferências na construção do vínculo parental.

No que se refere à confiança dos pais de que, mesmo nos momentos em que não estivessem presentes na unidade, seus filhos receberiam o cuidado adequado, todos os pais evidenciam este como um aspecto muito importante. Quatro participantes referiram que sentiam confiança sempre e três quase sempre que os filhos recebiam o cuidado adequado em sua ausência, e três participantes consideraram que algumas vezes podiam confiar. Nesse sentido, os pais relataram preocupação especial no período da noite, quando não estavam na UTI: “Eu tinha essa preocupação com a madrugada: ‘Será que ele passou essa madrugada bem? Será que se ele chorou acolheram ele?’” (Begônia).

Ainda no que se refere à confiança em relação ao cuidado adequado prestado ao filho, uma das mães evidenciou preocupação associada a dificuldades no pagamento à instituição hospitalar. Nesse caso, a mãe relatou ter sofrido cobranças pelo pagamento da internação e procedimentos. “Era o que me deixava mais preocupada. Eu pensava: ‘Meu Deus, eles não vão dar os remédios pro Lírio. Se chegar outra criança que tenha plano de saúde, vão tirar o Lírio’. Eu tinha muito medo” (Hortência).

Entende-se que a PNH se torna importante aliada na construção do vínculo entre famílias e equipes ao propor práticas que estimulem a comunicação entre gestores, trabalhadores e usuários, em atitudes humanizadoras. Ainda, busca-se que sejam implementadas nos serviços de saúde práticas que proporcionem a autonomia dos sujeitos e o senso de corresponsabilidade (Ministério da Saúde, 2013). Esses últimos fatores entram em contraponto com os resultados do presente estudo a respeito das condições dos pais de explicarem sobre a internação de seu bebê para familiares e amigos. Ainda que oito participantes consideraram este fator muito importante ou importante, apenas um referiu se sentir sempre em condições de transmitir as informações para familiares e amigos, dois quase sempre, cinco às vezes e dois nunca se sentiam preparados para essas comunicações.

Além de fornecer informações, a equipe de saúde responsável pelo cuidado do bebê também é referência em orientação aos pais. Isso se evidencia com o resultado de que oito participantes referiram ter a possibilidade de entrar em contato com a equipe após a alta do bebê como muito importante ou importante. Quanto à frequência em suas experiências, dois participantes sempre contaram com esta possibilidade, dois quase sempre, quatro participantes às vezes e dois raramente. Nesse sentido, Medeiros et al. (2020) destacaram o sentimento de insegurança e medo após a alta hospitalar dos prematuros, sendo relatos de sete pais de prematuros em acompanhamento ambulatorial em um hospital do Distrito Federal.

Necessidades Relacionadas à Participação no Dia a Dia na UTIN

Nesta categoria, discutem-se questões relativas à participação dos pais na rotina hospitalar, a partir do nascimento e transcorrer da internação do bebê. Serão abordados temas acerca da importância da participação dos pais para os filhos, tanto no que diz respeito aos cuidados de higiene e cuidados de enfermagem, como no que se refere ao incentivo da equipe na permanência dos pais no ambiente hospitalar, contribuindo para o desenvolvimento do bebê.

Todos os participantes, em relação a “Sentir que a equipe de saúde considerava a participação dos pais/mães importante para o seu filho(a)”, atribuíram grau de muito importante ou importante. Em suas experiências, cinco participantes sempre ou quase sempre sentiram o reconhecimento da importância de sua participação. Outros quatro participantes referiram que às vezes, e um que raramente sentia que a equipe considerava sua participação como importante para o seu bebê. A fala de Begônia evidencia o desejo de poder participar mais da rotina do filho durante a internação: “Por mais que tentem humanizar, eu acho que ainda a mãe deveria participar mais do que a gente participa, no sentido dos cuidados”. Hortência demonstrou o sentimento de não experienciar a maternidade de forma plena durante a internação: “Nós éramos meras coadjuvantes daquilo ali, sendo que, na verdade, era o nosso momento de mãe”.

O sentimento de privação do desempenho da maternidade evidenciado por Hortência ressalta a necessidade de se proporcionar a estes pais a confiança de que sua presença, cuidados e sentimentos destinados a seus filhos são essenciais ao desenvolvimento desses. A importância desse aspecto foi observada no estudo de Heck et al. (2016), com nove mães que experienciaram o Método Canguru (MC) em um hospital-escola no sul do Brasil. Foi evidenciado que, quando as equipes de saúde conseguem transmitir às mães sua importância na recuperação do filho desde a primeira visita à UTIN, elas tendem a se sentir mais competentes e confiantes, o que facilita a manutenção da autonomia diante da alta hospitalar.

Todos os participantes consideraram muito importante ou importante o incentivo da equipe para que ficassem juntos aos seus filhos. Quatro pais referiram que sempre contavam com tal incentivo, ao passo que um quase sempre, quatro às vezes e um raramente. Camélia sinaliza a presença desse incentivo durante a internação de sua filha: “Eles [equipe de enfermagem] orientam o máximo possível você a ter contato com a criança, é fundamental
. . . Então, eles estimularam muito essa questão do contato dos pais com os bebês”.

Conforme Lebovici (1987), devido aos médicos e enfermeiras serem responsáveis pelo cuidado do recém-nascido durante a internação na UTIN, estes podem despertar nos pais o sentimento de incapacidade de cuidar, tocar e nutrir o bebê. Nesse sentido, os pais tendem a não se sentirem autorizados a cuidar de seu filho, sentindo-se perigosos e punidos pela separação. É na perspectiva de contribuir para o sentimento de conhecimento de seu bebê que se faz importante que os pais sejam sempre estimulados a estar junto e a participar das ações de cuidado de seus filhos.

A participação dos pais nos cuidados de higiene do filho durante a internação foi outro aspecto investigado, sendo que nove pais consideraram como muito importante ou importante. Contudo, apenas três referiram que sempre ou quase sempre participaram desses cuidados, outros quatro às vezes e três que raramente puderam participar das rotinas de higiene dos filhos. O participante Cravo evidenciou a limitação nas ações com o seu filho: “Lá, até a gente não podia fazer quase nada, a não ser pegar pra momentos de colo, amamentação. Banho não, era tudo com ele”. Outro pai, ao ser questionado sobre os cuidados de higiene do bebê, evidenciou que o retorno ao trabalho reduziu suas oportunidades de participação: “Não muito, porque quando houve essa possibilidade eu já tava trabalhando” (Antúrio).

No que se refere às possibilidades de participação dos pais (homens), embora haja o desejo em participar dos cuidados com o filho, a volta ao trabalho devido ao fim da licença-paternidade constitui-se como importante atravessamento para tal (Diaz et al. 2014). Destaca-se que, no Brasil, a licença-paternidade é de cinco dias, podendo, em determinados casos, ser ampliada para quinze dias (Lei nº 13.257, 2016). Conciliar horários de trabalho com as rotinas hospitalares torna-se difícil em função das últimas, muitas vezes, não serem flexíveis, como apontado no presente estudo. Nesse sentido, verifica-se que, com frequência, a atenção e o suporte tendem a ser direcionados para as mães, de modo que, entre os profissionais de saúde, parece existir pouca preocupação com o pai neste processo (Mancini, 2023).

Quanto à participação dos pais nos cuidados de enfermagem do seu filho, tal como a verificação da temperatura, observou-se que sete pais consideraram tal tarefa como muito importante ou importante. Em suas experiências, três pais sempre tiveram oportunidade de participar, três às vezes e quatro nunca puderam participar desses cuidados. Nesse contexto, é importante que ocorra o reconhecimento e a diferenciação entre os cuidados desempenhados pela equipe e aqueles oferecidos pelos pais e mães. Acredita-se que, havendo um consenso sobre as tarefas que exigem o conhecimento técnico dos profissionais, e aquelas que, costumeiramente, são tarefas parentais, tanto a equipe quanto a família se sentiriam mais confortáveis em sua relação e promoveriam confiança na parentalidade. Nesse sentido, estudo de Fróes et al. (2020) realizado com mães de recém-nascidos pré-termo em uma UTIN, em Porto Alegre, identificou que a alteração do papel parental no período de internação representava a principal fonte de estresse experimentada pelas mães, o que reforça a importância da participação da dupla parental na assunção de tarefas referentes ao cuidado de seu bebê.

No que se refere à possibilidade de receber ajuda para reconhecer as necessidades de seus bebês, a totalidade dos pais considerou muito importante ou importante. Quanto à frequência com que recebiam este tipo de auxílio, dois deles evidenciaram que sempre foram ajudados pela equipe, ao passo que três quase sempre e outros cinco participantes afirmam que algumas vezes recebiam tal suporte. Nesse sentido, sabe-se que fortalecer os pais para identificarem as necessidades e demandas do bebê favorece seus vínculos e a confiança parental em sua própria capacidade de cuidar (Ono & Asano, 2023).

Considerações Finais

Verificou-se que os pais apresentam diversas necessidades, dentre as quais algumas não são atendidas pelas instituições hospitalares. Dentre essas, destaca-se a limitação de tempo para visitação aos filhos e interação pais-bebê, a limitação de estrutura e número insuficiente de profissionais, além da ausência de preparo para dar conta das necessidades dos pais. Conhecer tais necessidades e investir esforços em atendê-las representa o entendimento da centralidade dos pais no processo de internação de seus filhos e a importância dos vínculos familiares no desenvolvimento infantil.

Salienta-se que investir em capacitações para profissionais de saúde pode ser uma forma de proporcionar mais recursos na construção das relações com as famílias, bem como nas relações de trabalho, visto que é na relação entre a equipe de saúde e a família que se efetiva a possibilidade de participação dos pais no processo de internação de seus filhos. A esse respeito, os resultados indicaram que ainda se faz necessário que eles se sintam parte do processo de internação de seus filhos. Torna-se relevante legitimar, fortalecer e estimular a presença e participação destes pais durante a internação do bebê.

Este estudo contou com a participação de mães e pais, partindo do entendimento de que, gradativamente, o pai vem sendo cada vez mais solicitado a exercer a paternidade de modo afetivo e participativo. Então, é importante que se permitam e proporcionem espaços de ­escuta, acolhimento, integração e reconhecimento das necessidades dos pais (homens) tanto no âmbito das pesquisas acadêmicas quanto na internação de seus filhos.

No que tange ao método empregado no estudo, a necessidade de realizá-lo de forma on-line apresentou-se inicialmente como um desafio para as pesquisadoras. Porém, a experiência mostrou que a relação com os participantes pôde ser estabelecida de forma cuidadosa, empática e acolhedora, possibilitando aos pais a expressão de suas vivências. A esse respeito, ressalta-se que foi necessário que os participantes possuíssem celular ou computador com acesso à internet para participação no estudo, o que pode ter contribuído para que a amostra contasse com a participação de pessoas com boas condições socioeconômicas. Desse modo, ressalta-se que as experiências relatadas neste estudo podem não contemplar outros contextos de vida e tampouco se propõe a generalizações.

Destaca-se, como limitações do estudo, que não foram analisadas possíveis diferenças entre as necessidades de pais provenientes de diferentes contextos socioculturais, econômicos, e nas diferentes regiões do Brasil. Ainda, não foram investigadas possíveis diferenças de gênero. Sugere-se que esses aspectos sejam atentados em investigações futuras, ressaltando-se a importância de que as práticas em saúde sejam cada vez mais voltadas às especificidades do contexto de cada família.

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Recebido em: 03/07/2023

Última revisão: 15/03/2024

Aceite final: 04/04/2024

Sobre as autoras:

Karina Scapin Teixeira: [Autora para contato]. Psicóloga pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). E-mail: kaka.s.t@hotmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0751-777X

Gabriela Sarturi Rigão: Doutoranda em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Mestre em Psicologia pela UFSM. Pós-Graduada em Psicologia Hospitalar pela Faculdade Don Alberto. Psicóloga no Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM-UFSM). E-mail: gabrielasarturi4@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8107-3639

Bruna Fragoso Cousseau: Especialização em Desenvolvimento Infantil pelo Child Behavior Institute of Miami. Psicóloga pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Formação em Orientação e Treinamento de Pais pela Instituto de Neuropsicologia e Psicologia Infantil (INPI). Atualmente, realiza atendimentos psicológicos para crianças e adolescentes e orientação parental em consultório particular. E-mail: brunafragosocousseau@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1666-3496

Rayssa Reck Brum: Doutoranda e mestra em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Especialização em andamento em Terapia de Família e Casal Sistêmica. Psicóloga clínica em consultório particular e professora de graduação em Psicologia na Faculdade Integrada de Santa Maria (FISMA). E-mail: rayssarbrum@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9420-0553

Caroline Rubin Rossato Pereira: Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Especialista em Psicologia Clínica com ênfase em Terapia Familiar e de Casal pelo Instituto da Família de Porto Alegre (INFAPA). Docente do Departamento de Psicologia e Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). E-mail: carolinerrp@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9861-8391

doi: http://dx.doi.org/10.20435/pssa.v16i1.2470

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